O genial Stevie Wonder disse que votar em Donald Trump era como pedirem-lhe a ele, cego, para conduzir. A verdade, que custa aceitar, é que a democracia americana, escolheu Trump para conduzir a nação numa estrada sinuosa, que inclui uma América confusa de valores e raivosa com o sistema, uma Europa perdida e em desagregação, uma “Putinlândia” com tiques soviéticos e uma Primavera árabe que se tornou num infindável Inverno.
Perante este cenário global, o candidato sem vergonha em se apresentar com um discurso intolerante, xenófobo, impreparado ou mesmo “bronco” é aquele que terá os códigos das armas nucleares americanas. Tudo isto é, no mínimo, assustador e perturbante. Mas não totalmente imprevisível face aos sinais que se vão manifestando no mundo ocidental. Sinais que nos remetem mais para a sociologia e psicologia do que para a política. O medo, a raiva, a intolerância são sentimentos que começam a manifestar-se nas conversas de amigos – até os mais intelectuais –, nas redes sociais, caixas de comentários, programas políticos e, em consequência, no voto.
Infelizmente, estou convencido de que Trump é só um capítulo (muito importante) de outros que vão surgir, nomeadamente na Europa. Ele ganhou num país com pleno emprego e um crescimento económico robusto. Imaginem o que poderá suceder nesta Europa sem rumo, com uma crise de refugiados, terrorismo e economicamente estagnada?
O vitorioso é só um: Donald Trump. Mas há vários derrotados.
Hillary Clinton: a derrotada óbvia e que terminou desta forma desastrosa a sua carreira política;
Barack Obama: político, pelos vistos, mais inspirador para nós europeus do que para o americano comum. A grande maioria dos americanos não quer, nem nunca quis, nada que se pareça com o modelo social europeu ou uma “excessiva” tolerância em matéria de costumes;
O politicamente correto e os políticos: a generalidade das pessoas (não só americanos) está, pura e simplesmente, farta dos discursos de sempre. Ou melhor, está farta de políticos.
O jornalismo instituído: tal como no Brexit, foi totalmente contraproducente esta massacrante campanha global anti-Trump. Ninguém aprecia que lhes passem atestados de menoridade, que jornalistas e intelectuais lhes tentem, agressivamente, ensinar a pensar e a votar. O jornalismo deveria retirar daqui uma lição: imparcialidade, objetividade e isenção são o seu maior contributo para a democracia;
A globalização: recordo-me do tempo em que muitos criticavam a economia global por ser uma forma dos países ricos explorarem os países pobres. Hoje constatamos que, em muitas situações, foi o contrário. A globalização tirou milhões da pobreza extrema nas economias emergentes, mas, particularmente em alguns estados dos EUA, a perceção que há é que lhes tirou empregos e orgulho.
Mais do que positivo ou negativo, o futuro do mundo é profundamente incerto e inseguro. Vamos ver se os “checks and balances” da democracia americana ajudarão Trump a ser um Presidente melhor do que o candidato.