Não me refiro aos milhares de desempregados fictícios que ainda pululam por esse país fora, promovidos por um Estado cego, ineficiente e injusto que alimenta os canalizadores, biscateiros e outros prestadores de serviços que se recusam a passar um recibo, simplesmente porque pretendem continuar a ocultar a acumulação dum simpático subsídio de desemprego pago por aquele grupo, cada vez mais pequeno, de contribuintes que, tal gauleses cercados pelos romanos, ainda resistem. Para melhor compreensão a que me refiro, merece a pena recordar que em Portugal 28% do IRS é pago por 1% dos contribuintes, 58% pago por 5% e 70% pago por apenas dos 9% dos contribuintes, afinal onde está a justiça social nesta desigualdade?
Durante toda minha vida profissional na banca, ao apoiar o financiamento de investimentos, sempre estimei que de alguma forma estava a contribuir para o crescimento da economia e, nesse sentido, para a melhoria das condições de vida da comunidade em que me inseria. Mas, hoje vejo com enorme clareza, que nunca tinha compreendido o verdadeiro valor de ter um posto de trabalho. Foi há uns tempos atrás, ao participar na inauguração de uma fábrica de processamento de camarão em Guayaquil, a capital económica do Equador, que pude compreender plenamente a afirmação do Papa Francisco quando diz que “o trabalho é sagrado e dá dignidade para a família”. Esta nova fábrica financiada pelo IFC gerou a criação de 300 novos postos de trabalho directos, sendo 80% deles ocupados por mulheres que nunca tiveram um trabalho formal. São postos de trabalho duros, jornadas a seleccionar as peças, descascá-las e prepará-las, para depois terminar embalando-as para serem exportadas para os principais supermercados da Europa. Porém, todo este esforço é executado em total cumprimento pelas leis laborais do país, com os devidos descontos para a segurança social e respeito pelos critérios de sustentabilidade social promovidos pelo nosso banco.
De repente, nesse fim de tarde observava um grupo dessas mulheres operárias lavadas em lágrimas de alegria dizendo “Bendito trabajo, bendito trabajo…” e não pude deixar de sentir que por fim tinha compreendido o valor intrínseco de ter um trabalho, a fonte de toda a dignidade humana!
E já agora, permitam-me retomar a minha constante defesa em prol dos benefícios da globalização económica do mundo, graças ao recente tratado de livre comércio assinado entre a UE e o Equador, sempre que estiverem confortavelmente a saborear uma deliciosa espetada de camarão comprada num supermercado qualquer em Viseu ou Portimão, lembrem-se que estão a contribuir para que centenas de pessoas noutro continente tenham acesso a um trabalho digno.