Mais interessante do que se tentar perceber o algoritmo que procede à distribuição dos processos, é aferir da reacção junto de parte dos magistrados que tal questão levantou. Sempre que se procura discutir algo remotamente relacionado com a Justiça, há uma classe profissional que se coloca sempre num patamar inatingível e que tem muita dificuldade em aceitar qualquer crítica.
A democracia não pode ficar à porta dos tribunais e, por mais que queiram, os senhores juízes não estão acima da lei e da legitimidade democrática. Quer gostem, quer não gostem. Mesmo quando aparecem na televisão, disfarçados de cordeiros, numa lógica de vitimização barata e querendo reproduzir um modelo de super-juiz que já deu maus resultados noutros países.
O PS de Costa tem a particularidade de conseguir transformar o que seriam verdadeiros escândalos em acções de marketing. Sobreviveu à cena surreal de Tancos, afastando os ministros mais débeis e pondo outros a executar o orçamento negociado pelos primeiros. No fundo, Costa e, vá, Centeno são o Governo. O resto? Caras que se mostram para não se assumir que este país é dirigido por duas almas com o beneplácito de um terceiro.
Muito foi dito sobre o Orçamento do Estado, na maior parte dos casos por pessoas com muitos mais conhecimentos do que a aqui escriba. Contas feitas, o que o contribuinte comum, como é o meu caso, quer saber é se paga menos impostos.
A resposta, mesmo para os leigos, parece óbvia: pagamos o mesmo nível de impostos mas mascarados de coisas diferentes. Se andarmos sempre a pé, mesmo quando os transportes públicos são o que se conhece, se não consumirmos bebidas com açúcar, se não fumarmos, se não comprarmos nada, se não tivermos de recorrer à Justiça, se não tivermos urgência numa consulta de especialidade, aparentemente este orçamento trará alguma folga.
No mesmo transe, tal folga será, pelos vistos, não apenas um instrumento de campanha política, agora que as eleições se aproximam. É, também, uma forma de, como bem descreveu Visconti, algo mudar para que tudo permaneça na mesma.
No fundo, continuamos a pagar ajustes directos para grandes sociedades de advogados, contratos ruinosos de parcerias público-privadas, helicópteros que nunca apagam o fogo certo, sendo que o que nos dão em troca é a conta certa para uma imperial (que isto de bebidas com açúcar passou a ser um luxo, por vezes asiático). Enquanto olhamos para a direcção que nos mandam, ordem disfarçada de espectáculo de ilusionismo, não vemos o que está, de facto, a acontecer.
Definitivamente, este é o espectáculo de Costa e a sua maior virtude: a de nos fazer acreditar numa realidade que não existe.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.