O Tribunal Judicial da Comarca de Xistói declarou ilegal a prática recentemente instituída no Snack Bar “O Zé dos Melros” de cobrar 20 cêntimos adicionais aos clientes que peçam um “cheirinho” no seu café. Esta decisão vem na sequência de uma queixa do Sr. Manuel Rola que alegou que sempre pediu um cheirinho no café pós-prandial e nunca teve de pagar a mais por isso, como, aliás, continua a acontecer no Café Central e noutros estabelecimentos da localidade. O Tribunal aceitou os argumentos apresentados pelo Sr. Rola, considerando que se estava perante uma violação dos direitos do consumidor que lesava gravemente os seus interesses.

Não sendo jurista, não sou capaz de avaliar os méritos legais da decisão. Está com certeza corretíssima. Mas não custa perceber que se está perante um disparate económico. No imediato, o fornecimento do cheirinho tem um custo para o “Zé dos Melros”. Se o Zé tiver de estar pronto para disponibilizar bagaço no café “gratuitamente” a todos os que o solicitem, terá de arranjar forma de cobrir os custos daí decorrentes. Não podendo cobrar autonomamente pelo cheirinho, a solução será aumentar o preço do café a todos os clientes, queiram ou não esse aditivo, o suficiente para cobrir o custo decorrente de o disponibilizar aos que o solicitam. Os clientes que dispensam o bagaço no café acabarão a pagar por algo que não querem, assim subsidiando os que o desejam, que por ele pagarão menos do que o seu custo real.

A prazo, as coisas são mais sérias. A possibilidade de as empresas ajustarem a sua oferta àquelas que, em cada momento, lhes parecem ser as preferências e as necessidades dos consumidores é um elemento chave do funcionamento de uma economia de mercado. Ninguém sabe quais são essas preferências e necessidades. O mercado funciona por tentativa e erro. As empresas apresentam propostas de valor. Os consumidores aceitam umas e rejeitam outras. Muitas vezes de forma imprevisível. Umas empresas crescem, outras estagnam ou desaparecem. Não é um processo perfeito nem indolor. Mas a história do século XX mostra que é muito melhor do que as alternativas que têm sido propostas. Com todas as suas misérias e insuficiências, deu-nos economias e sociedades que sustentam mais pessoas, a viver melhor, do que em qualquer outro período da história da humanidade.

Ao impedir o “Zé dos Melros” de fazer a sua “proposta de valor” o Tribunal de Xistói está a pôr um grãozinho nesta engrenagem. Um pequeno grão. Daí não virá certamente o apocalipse. Mas os Xistoienses, pelo menos os que não querem cheirinhos, ficarão um pouco mais pobres. E muitos grãos podem criar uma montanha.

Ah, é verdade! Vem isto a propósito de uma recente decisão do Tribunal de Braga que, segundo a imprensa, terá decidido que a Ryanair não pode cobrar taxas adicionais por bagagem de cabine que exceda certas dimensões. Desde que a existência dessas taxas seja transparente, porque não?