O pacote de subida de impostos proposto pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chega ao Congresso sob fortes críticas de parlamentares e do setor empresarial e com partidos da base aliada abertamente contrários —posição externada antes mesmo da medida provisória ser editada. O texto foi publicado no Diário Oficial na semana passada.
A tensão escalou após o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmar num evento com empresários na semana passada que as medidas apresentadas pelo governo devem ter “reação muito ruim” por parte do Congresso. Também afirmou não servir a projeto político de ninguém.
A expectativa do governo é procurar apoio e fomentar emendas parlamentares até a data da votação, enquanto negoceia com o Congresso. A medida provisória entra em vigor imediatamente, mas grande parte dos seus efeitos passam a valer em 2026, e o texto precisa ser referendado pelos parlamentares.
A medida provisória contemplou medidas de contenção de despesa, como a inclusão do Pé-de-Meia no piso da educação, novas regras de acesso ao seguro-defeso e mudanças no AtestMed.
As declarações de Motta surpreenderam o governo, por terem ocorrido depois de o parlamentar classificar como histórica a reunião em que a proposta foi apresentada à cúpula do Congresso.
O PP e União Brasil também declararam que “fecharão questão” contra o aumento de impostos caso a medida não viesse acompanhada de iniciativas para cortar gastos. No jargão político, fechar questão significa punir os parlamentares que contrariarem a posição do partido.
As duas siglas juntas possuem 109 deputados e 14 senadores. PP e União Brasil comandam quatro ministérios e a Caixa Económica Federal, mas realizaram um ato no salão verde da Câmara para se posicionarem abertamente contra o pacote.
“Taxar, taxar, taxar, não pode e não será nunca a saída”, disse o presidente do União Brasil, Antonio Rueda, que comanda o partido do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (AP), aliado do governo federal.
Junto com PL e Novo, que são abertamente de oposição, essas duas siglas representam pouco mais de um terço do Congresso, e o posicionamento contra a MP dificulta muito a aprovação da proposta. A expectativa, entre os seus dirigentes, é que a declaração pública de voto contra a MP leve outros partidos da base aliada a se manifestarem contra a medida.
O líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), fez discurso duro na tribuna da Câmara, afirmando que o partido também deve fechar questão contra as propostas. “Tenho certeza que, daqui a pouco, o PSD, o Republicanos, todos os demais partidos que amam o Brasil de verdade, vão ser contra o aumento de impostos”, disse Cavalcante.
Pelo menos até a noite do passado dia 11, outros partidos não haviam anunciado esse posicionamento contrário. Nas demais siglas de centro-direita, o discurso era de aguardar o conteúdo completo da MP e analisá-lo, antes de adotar uma posição oficial. A taxação maior das apostas, por exemplo, é uma das propostas incluídas no pacote que teria apoio da maioria dos parlamentares.
Os pontos com maior resistência são o aumento da tributação das fintechs e de investimentos hoje isentos, como LCA (Letra de Crédito do Agronegócio) e LCI (Letra de Crédito Imobiliário), que passariam a ser tributados em 5%. Esses mecanismos são usados por empresários para captar empréstimos a juros mais baixos.
Os partidos de esquerda querem mobilizar a opinião pública a favor dessas iniciativas, ao mostrar que esses benefícios desequilibram os próprios setores que estão inseridos e atingiriam “o andar de cima”. Essa tese foi reforçada nos últimos dias por ministros e parlamentares governistas.
Iniciativas para corte de gastos, cobradas do governo por políticos de direita e empresários, chegaram a ser discutidas na reunião entre Haddad e os parlamentares no domingo à noite (8), mas não houve consenso.
No cardápio de medidas estavam cortes dos supersalários de funcionários públicos e a reforma do sistema de previdência dos militares —que estão travados no Congresso—, mudanças no BPC (Benefício de Prestação Continuada) e congelamento dos repasses da União para o Fundeb (Fundo de Valorização da Educação Básica).
A estratégia do governo, por enquanto, é utilizar o prazo de tramitação (quatro meses) da MP para melhorar o ambiente com o Congresso e conseguir aprovar pelo menos parte das propostas.
A interlocutores, Haddad disse que interessa ao governo debater as medidas no Congresso como foram apresentadas no domingo à noite.
Uma prévia já aconteceu nesta quarta, quando Haddad travou um bate-boca com parlamentares da oposição. O Ministério da Economia avalia que as negociações estão só a começar e que há hipótese de aprovação, se não tudo, de uma parte das medidas. O que mais interessa à equipa económica é a proposta de corte de 10% dos benefícios fiscais.
Um aliado de Lula diz que há uma avaliação de que as críticas do Parlamento são desproporcionais num momento em que o governo se predispôs a negociar em conjunto com deputados e senadores. O recuo de Motta é atribuído ao 1º calor da pressão de quem acabou de sentar na cadeira da presidência da Câmara.
Um integrante do Palácio do Planalto diz que há uma avaliação de que as medidas deverão sofrer mudanças pelo Parlamento, mas recusa a possibilidade de uma rejeição do pacote, já que não perceciona nenhum movimento de rompimento desses partidos com o governo federal.
Um ministro diz verificar que há muito “jogo de cena” dos parlamentares neste momento e que ao final todos vão sentar-se à mesa para negociar.
Uma prova disso é que a proposta de aumento da fração do JCP (Juros sobre Capital Próprio) foi sugerida por parlamentares na reunião no domingo e, agora, era alvo de críticas do Congresso.
Membros do Governo reconhecem que há um clima de animosidade entre os deputados e senadores, mas creditam isso, principalmente, à baixa liberação das emendas parlamentares. Além disso, a cúpula da Câmara queixou-se de despacho do ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), nesta terça (10), no âmbito da ação que trata desses recursos —provocando reação dos parlamentares, que ameaçam não discutir projetos de interesse do Executivo em plenário.
Nesta quarta, a ministra Gleisi Hoffmann (Secretaria de Relações Institucionais) tentou amenizar a situação, sinalizando ao Parlamento ao negar problemas na execução das emendas e afirmar que tudo seria esclarecido a Dino. A ministra também disse que os recursos começarão a ser liberados no fim desta semana.
Ao longo do dia, houve um vaivém de informações sobre quando a medida seria editada pelo governo federal. Pela manhã, integrantes do Palácio do Planalto falavam que a MP seria divulgada em poucas horas —o que não se concretizou. O texto foi publicado já à noite.
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