A semana passada o país adormeceu sobressaltado por uma auto-designada peça jornalística onde dois menores viram a sua vida devassada, sob a aparência de se procurar discutir o estatuto de vítima das crianças envolvidas em processos de violência doméstica. A exibição da dita reportagem não contribuiu para esclarecer fosse quem fosse, transformando a televisão de cada um de nós numa enorme caixa negra.

Para que nos entendamos, o que aquele trabalho fez foi o oposto do que afirmou ser a sua preocupação: visando apenas captar audiências, sacrificou-os à hora do jantar, tratando de “servir” dois menores como lixo televisivo, apimentado pela circunstância de ambos os pais serem conhecidos. Há limites para tudo e, seguramente, para o jornalismo. O que se passou foi muito grave e não pode tornar a acontecer. Mesmo quando não gostamos dos alegados prevaricadores. Se calhar, principalmente nesses casos.

Foi, também, tornada pública a lista dos principais devedores dessa outra caixa negra, a Caixa Geral de Depósitos, avultando os negócios ruinosos, feitos entre amigos e sem a prestação das inúmeras garantias que um comum mortal tem de apresentar para um qualquer contrato de mútuo.

A listagem dos referidos devedores é curiosa, abrangendo até um “eminente” gestor que foi pedir dinheiro emprestado para comprar acções de outro banco e um empreendimento turístico no Sul do país que se tem tornado célebre por via de um mediático processo. Por outro lado, entre 2000 e 2015, embora não pela sua experiência bancária, muitos foram os nomes conhecidos, que tiveram funções de relevo na Administração da Caixa Geral de Depósitos, pagos a peso de ouro com a incumbência de a gerirem bem.

Porque, durante décadas, a Caixa funcionou como reservatório de políticos sem (outro) cargo pago, um dos nomes a reter é o de Faria Oliveira, o qual, seguramente esquecido da sua passagem por esta instituição, agora na qualidade de Presidente da Associação Portuguesa de Bancos se apressou a manifestar-se contra a divulgação dos principais devedores, imposta por recente legislação.

Justificou tal inusitada posição, agora expressa na representação dessas entidades tão credíveis quanto se têm revelado os bancos, pelo prejuízo que aquela trará aos clientes dos bancos, percebendo-se agora que o que estará em causa é a publicidade que poderá ser dada a “negócios entre amigos”.

Nada haveria a dizer se, no final, não fôssemos todos chamados a pagar. Estranho país este que, apenas quando a altura é de prejuízo, torna os cidadãos banqueiros mas, pelo contrário, quando a época é de lucro, os atira para o papel de meros espectadores. Justamente aquele não deveríamos ter tido quanto às filmagens dos filhos de Bárbara Guimarães e Manuel Maria Carrilho.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.