O cartoonista angolano Sérgio Piçarra caricaturou recentemente o presidente João Lourenço. Nessa representação, o presidente carrega na mão direita folhas escritas com promessas e enverga um par de calças, com a bandeira do MPLA numa das pernas e a bandeira da República de Angola na outra.

À figura do presidente opõe-se a de uma mulher, suportando o irmão às costas com a ajuda de um pano onde está escrito “esperança” e “futuro”. Da boca da “mulher” saem as seguintes palavras: “E não penses que vais ficar só aí a fazer banga com as calças novas! Eu e o meu irmãozinho estamos de olho em ti!”

Neste cartoon (e na realidade) o presidente João Lourenço acumula a posição de presidente do MPLA, à semelhança do seu predecessor, encontrando-se munido das ferramentas políticas necessárias para executar as promessas anunciadas. Sendo, assim, expectável que o presidente passe a ser alvo, agora, de um escrutínio mais apertado por parte do povo angolano, com eventuais consequências nos próximos actos eleitorais (por exemplo, nas eleições autárquicas previstas para 2020).

Neste sentido, convém ao presidente realizar as promessas anunciadas e isto passa, forçosamente, pela transformação dos seus discursos em actos concretos do Executivo. Assim, seria, de facto, conveniente empreender uma remodelação do Executivo, principalmente depois da (forte) alteração da composição dos membros do Bureau Político do MPLA.

Ou seja, tornar-se-á indispensável afastar algumas figuras que fizeram parte do anterior governo, cujos nomes poderão estar associados a alegados escândalos de corrupção, e introduzir novos nomes credíveis junto da sociedade civil. O que implicaria, em última instância, a adopção de uma estratégia de incremento da base de recrutamento para fora do MPLA.

Assim, o desafio imediato do presidente passa pelo aumento da credibilidade do seu Executivo, considerando que a governação implicará a adopção de medidas económicas e políticas difíceis que terão um impacto directo na qualidade de vida das pessoas, com maior incidência para as mais desfavorecidas que prontamente demonstrarão o seu grau de descontentamento e de rejeição do Executivo.

Hoje, o angolano associa o presidente João Lourenço à figura do “Exonerador Implacável”.  No entanto, estes actos de exoneração não se inserem no âmbito de uma estratégia política, representando apenas um gesto de retirada de confiança política. Neste momento, torna-se necessário empreender uma reformulação do Executivo de forma a reforçar a sua legitimidade política e a ampliar a sua margem de manobra para a implementação das reformas necessárias à mudança do paradigma político e económico em Angola.

No Executivo actual subsistem alguns rostos associados a más práticas políticas do passado, que ainda ensombram o dia-a-dia dos angolanos, provocando por isso sentimentos de incerteza no que diz respeito às promessas de mudança. Ora, uma nova narrativa política não pode construir-se com recurso aos alicerces (desgastados) do passado.

A eficácia política do presidente está claramente associada à sua capacidade de assumir o combate à corrupção como uma prioridade política e da sua governação, desde o início do seu mandato. No entanto, torna-se, igualmente, bastante arriscado preservar no seio do seu Executivo, e sob a sua tutela, alguns ministros que poderão ser implicados em futuras investigações sobre corrupção.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.