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Canto do cisne nas centrais a carvão em Portugal em 2020 com queda de 58% antes de fecho definitivo este ano

Depois de 36 anos a produzirem, as duas centrais a carvão do país preparam-se para fechar portas este ano. Com o fim do carvão, e com muitas centrais de energia solar ainda por construir, o gás natural vai ter um papel decisivo no sistema elétrico para manter as luzes acesas nos lares e empresas nos próximos anos.
  • EDP
5 Janeiro 2021, 18h12

O consumo de eletricidade a partir de carvão em 2020 em Portugal sofreu um recuo de 58% face a 2019 para 2.133 gigawatts hora (GWh).

O ano passado foi o canto do cisne de uma longa relação do país com o carvão, isto é, as centrais ainda produziram mas estes foram os últimos passos antes do fim anunciado da produção a carvão para este ano.

As duas centrais a carvão que operam no país há 36 anos, desde 1985, têm o encerramento previsto até ao final deste ano. O consumo a partir de eletricidade produzida em Sines caiu assim 54,5% em 2020, em relação ao Pego caiu 71,7%, segundo os dados da REN.

A EDP prepara-se para encerrar a central de Sines (na foto) durante este mês de janeiro, conforme anunciou a empresa em julho de 2020.

A elétrica já obteve a respetiva autorização por parte da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) e vai cumprir o encerramento previsto para este mês, avançou a EDP à agência Lusa a 30 de dezembro.

“A decisão – enquadrada na estratégia de descarbonização do grupo EDP – foi tomada num contexto em que a produção de energia depende cada vez mais de fontes renováveis. Além disso, com o crescente aumento do custo da produção a carvão e do preço das licenças de emissões de CO2, aliado a um agravamento da carga fiscal, e com a maior competitividade do gás natural, as perspetivas de viabilidade das centrais a carvão diminuíram drasticamente”, disse a EDP em julho sobre a decisão de encerrar Sines mais cedo.

Já a central a carvão do Pego tem o encerramento previsto até ao final de 2021. Esta central é detida pela Tejo Energia um consórcio formado pela italo-espanhola Endesa (44%) e pela Trustenergy (56%), que é, por sua vez, um consórcio formado pelos japoneses da Marubeni e pelos franceses da Engie.

A central de Sines conta com uma potência total de 1.180 megawatts de potência, enquanto a central do Pego conta com 330 megawatts.

Mas com o fim do carvão o sistema elétrico do país vai conseguir manter as luzes acesas quando as renováveis não estiverem a funcionar? Para um especialista em energia contactado pelo Jornal Económico, o gás natural vai ter um papel crucial no sistema a partir deste ano.

“No imediato, temos potência suficiente no gás natural para substituir o carvão”, disse António Sá da Costa ao Jornal Económico. “Aos poucos, vamos tendo mais renováveis, e o gás natural vai diminuindo. Daqui a três, quatro anos vão haver mais renováveis que vão absorver o fim do carvão”.

O antigo presidente da Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN) não tem dúvidas que o gás natural vai ser o tipo de energia que vai impedir apagões em Portugal, quando as renováveis falharem, sem a necessidade de recorrer à eletricidade espanhola.

“Por melhores que sejamos a prevenir os fogos florestais, nunca poderemos prescindir dos bombeiros para o combate. É assim no gás natural, é o bombeiro do sistema elétrico”, destaca Sá da Costa.

Apesar de aplaudir o fim do carvão e de ser um defensor das renováveis, o antigo professor do Instituto Superior Técnico em Lisboa não veria com maus olhos o alargamento do tempo de vida das centrais a carvão. “Fico contente que possam ser desligadas mais cedo, mas também aceitava que pudessem ser desligadas mais tarde”.

Sobre o gás natural, o especialista aponta que tem uma eficiência média de 55% na produção de energia contra os 30% no caso do carvão. No caso das emissões poluentes, destaca que as centrais a gás natural emitem um terço face às emissões das centrais a carvão.

Um dos fatores penalizadores sobre a produção de eletricidade é a taxa carvão, em vigor desde 2018, com subidas graduais, e que vai aumentar para 75% em 2021, conforme previsto no Orçamento do Estado. Em 2022, a taxa carvão vai aumentar para 100%.

Só no primeiro semestre de 2020, a produção a partir de carvão caiu 95%, tendo o país registado o maior tombo a nível europeu, num período em que Portugal e os países europeus sofreram fortes restrições devido à pandemia da Covid-19.

Energias renováveis voltaram a dominar Portugal em 2020. Consumo de eletricidade em mínimos de 2005

A REN divulgou esta terça-feira os dados relativos ao consumo de eletricidade em 2020. As energias renováveis voltaram a dominar o consumo de eletricidade em Portugal no ano de 2020, abastecendo 59% do consumo de eletricidade das famílias e empresas no total do ano, mais oito pontos percentuais face a 2019.

Apesar das renováveis terem voltado a dominar no mix de consumo energético, a produção em regime especial de energia renovável caiu 3,9% face a 2019.

Em 2020, a hidroelétrica e eólica pesaram 25% cada no consumo total de eletricidade, com a biomassa a pesar 7% e a solar fotovoltaica com 2,6%.

Por sua vez, a produção não renovável abasteceu 38% do consumo, com o gás natural a pesar 32% e o carvão a valer 4%.

O consumo de gás natural recuou 1,6% face a 2019 para um total de 66.900 gigawatts hora, com o segmento de consumo a cair 4,5%, enquanto o segmento de produção de energia subiu 3,8%.

Os restantes 3% do consumo total devem-se à compra de eletricidade a Espanha.

O ano de 2020 ficou também marcado por uma produção mais baixa na eólica e hidroelétrica face à média histórica: o índice de produtibilidade hidroelétrica situou-se em 0,97 (média histórica igual a 1) e o de produtibilidade eólica em 0,94 (média histórica igual a 1), segundo a REN.

Em ano de pandemia da Covid-19, marcado por períodos de confinamento generalizado, teletrabalho e crise económica, o consumo de eletricidade recuou para mínimos de 2005: 48.800 gigawatts hora, menos 3,1% face a 2019.

Fecho das centrais a carvão de Sines e do Pego: Portugal vai receber 204 milhões de fundos europeus

Nos próximos anos, Portugal vai receber 204 milhões de euros de fundos europeus para descarbonizar a sua economia no âmbito do Fundo para uma Transição Justa, cujos valores foram aprovados em dezembro pelos países da União Europeia e cujo documento final vai ser finalizado durante a presidência portuguesa da União Europeia no primeiro semestre de 2021.

Um dos principais objetivos deste fundo é reconverter a indústria de produção de energia, para eliminar definitivamente a produção de eletricidade a carvão. O dinheiro vai chegar a Portugal num momento em que o país prepara-se para desligar as centrais a carvão de Sines (da EDP) e do Pego (da Tejo Energia) até ao final de 2021.

Este fundo destina-se em particular a regiões que precisam de desmantelar a produção e uso de carvão, lignite e petróleo de xisto, ou para transformar as suas indústrias carbono-intensivas.

Numa análise publicada em fevereiro, a Comissão Europeia aponta que o “encerramento das duas centrais elétricas a carvão em Sines e Pego, que são os maiores emissores de gases emissores de estufa (GEE) em Portugal, se se considerarem todos os setores, deverá afetar cerca de 650 postos de trabalho diretos e alterar a estrutura das respetivas economias regionais”.

Bruxelas também destacou “outros territórios com indústrias altamente poluentes, como Sines e Matosinhos, onde são fabricados produtos petrolíferos refinados e plásticos, deverão também sofrer importantes impactos económicos e sociais negativos em resultado da transição”.

A Comissão Europeia sublinhou que o Fundo para um Transição Justa foi criado precisamente para “permitir a estas regiões e às respetivas populações desenvolver novas atividades económicas, essencialmente nos setores identificados nas suas estratégias de especialização inteligente, e tornar assim as suas economias mais modernas e competitivas com base em investimentos sustentáveis, atenuando simultaneamente os custos sociais da transição ao assegurar a empregabilidade e a adaptabilidade dos trabalhadores afetados pelo encerramento das centrais.”

Em fevereiro, Bruxelas explicava que as “estimativas sugerem que o encerramento das centrais afetaria cerca de 650 postos de trabalho: 350 em Sines, 200 no Pego e 100 no porto de Sines onde o carvão é recebido. Para os dois municípios (Sines e Abrantes), os postos de trabalho em causa correspondem a quase 8 % e 3 % do número total de pessoas empregadas. Com base nesta avaliação preliminar, afigura-se justificado que o Fundo para uma Transição Justa concentre a sua intervenção nestas regiões”.

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