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Carlos Costa: “A estabilidade financeira não tem como objetivo evitar falências de bancos”

A estabilidade financeira é “salvaguardar a confiança dos depositantes e proteger o financiamento à economia“, e o “ambiente de baixa taxa de juros dos últimos anos pode exigir uma postura mais ativa das autoridades macroprudenciais, pois contribuiu para o aumento de vulnerabilidades e riscos” foram as mensagens do Governador do Banco de Portugal e membro do conselho de governadores do BCE.
Cristina Bernardo
8 Outubro 2019, 11h33

Carlos Costa abriu a Conferência 2019 do Banco de Portugal sobre Estabilidade Financeira, com um discurso sobre os riscos que podem provocar instabilidade, de onde se destaca os baixos juros do Banco Central Europeu (BCE), e a necessidade de apetrechar os bancos centrais com ferramentas para uma eficaz supervisão macroprudencial.

“Precisamos ter em mente que a salvaguarda da estabilidade financeira não visa impedir a falência bancária”, explicou o Governador que tantas vezes foi chamado a comissões parlamentares de inquérito por causa das resoluções do BES e do Banif.

O Governador reforçou no seu discurso que “a estabilidade financeira não tem como objetivo evitar falências bancárias, mas sim salvaguardar a confiança dos depositantes e preservar o financiamento regular da economia. Estruturas adequadas de resolução e liquidação, incluindo acesso a fundos públicos, são, portanto, uma parte indispensável do kit de ferramentas de gestão de crises”.

“Para conduzir a supervisão macroprudencial e ter sucesso em seu mandato, os bancos centrais precisam de instrumentos adequados”, salientou.

Conforme reconhecido pelo Mecanismo Único de Supervisão, “os bancos podem e devem sair do mercado se forem administrados de maneira arriscada e doentia ou se forem estruturalmente incapazes de manter sua competitividade com base em um modelo de negócios sólido”, disse o Governador.

Salientando a importância da supervisão macroprudencial para a estabilidade financeira, Carlos Costa referiu que “nesses casos, a autoridade encarregada de garantir a estabilidade financeira deve estar equipada com os instrumentos necessários para salvaguardar a confiança e garantir que o financiamento da economia não seja interrompido”.

Após a crise financeira global, isso foi alcançado através do estabelecimento de estruturas de resolução pelas quais o uso de fundos públicos é minimizado, lembrou.

“Novos poderes e ferramentas foram criados e confiados – em muitos casos aos bancos centrais – para garantir que operações essenciais dos bancos possam continuar e o valor seja preservado, enquanto as perdas são absorvidas principalmente por acionistas e credores com o objetivo de preservar a estabilidade financeira”, referiu.

Carlos Costa salientou que “novas instituições também foram criadas” e citou a criação do Conselho Europeu de Risco Sistémico (ESRB), há nove anos, como um marco nesse sentido.

No seu discurso o Governador defendeu que a estabilidade financeira é inerente ao mandato dos bancos centrais; que a supervisão microprudencial (supervisão das instituições) é essencial, mas não suficiente, para garantir a estabilidade financeira; e que a supervisão macroprudencial também é necessária e deve ser confiada às entidades mais bem posicionadas para avaliar os riscos sistémicos, isto é, os bancos centrais.

Para o Governador as autoridades macroprudenciais devem aumentar a sua capacidade de vigilância com vista a garantir a estabilidade financeira que pode ser ameaçada pelo atual contexto de juros baixos do BCE.

“Deve-se notar também que o ambiente de baixa taxa de juros dos últimos anos pode exigir uma postura mais ativa das autoridades macroprudenciais, pois contribuiu para o aumento de vulnerabilidades e riscos à estabilidade financeira”, alertou Carlos Costa, que para além de Governador do BdP é membro do conselho de governadores do BCE.

Desde a sua criação, a política macroprudencial foi gradualmente implementada na Europa num contexto financeiro e económico único, estabelecendo-se como uma área de política económica autónoma e interagindo com outros domínios de política.  Na conferência de hoje será abordada a interação entre políticas macroprudenciais e microprudenciais.

No discurso de abertura, Carlos Costa traçou assim aquelas que considera serem as premissas críticas para o mandato de um banco central em estabilidade financeira.

“A crise financeira global evidenciou a necessidade de conter riscos ao sistema financeiro como um todo por meio de políticas financeiras adequadas”, destacou.

Nesse contexto, disse, “muitos bancos centrais que também têm mandato para promover a estabilidade financeira aprimoraram suas funções de estabilidade financeira, inclusive estabelecendo estruturas de políticas macroprudenciais. Mas, para funcionar efetivamente, as políticas macroprudenciais precisam de uma base institucional sólida”.

“Os bancos centrais desempenham um papel crucial para garantir a estabilidade económica e financeira. Conduzem a política monetária para alcançar uma inflação baixa e estável e, como reconhecido pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), estão bem posicionados para conduzir a política macroprudencial porque têm capacidade para analisar o risco sistémico”, referiu o Governador.

“Enquanto o foco principal da supervisão microprudencial é salvaguardar as instituições financeiras individuais contra riscos idiossincráticos e impedi-las de assumir demasiados riscos, a supervisão macroprudencial leva em consideração as interações entre instituições financeiras individuais, bem como os ciclos de feedback do setor financeiro com a economia real”, refere no seu discurso.

Citando o presidente do BCE, Mario Draghi, Carlos Costa sublinhou que “[somente] após a crise houve um amplo reconhecimento da importância da dimensão macro da estabilidade financeira”.

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