Começou a contagem decrescente para a entrega à Assembleia da República da proposta de Orçamento de Estado (OE) para 2025.
O facto de o Governo não ter na Assembleia uma maioria que lhe garanta a passagem da sua proposta, obriga-o a uma de duas hipóteses: ou apresenta um documento não discutido com a oposição, reafirmando o argumento “interessante” que defende que a oposição deverá aceitar que o Orçamento deve respeitar o programa sufragado pelos eleitores, ou aceita sentar-se para discutir um documento que tenha condições de ser aprovado (na generalidade e na especialidade), tendo de decidir se prefere assegurar a abstenção do PS ou o voto favorável do Chega.
A primeira hipótese parece-me anunciar uma preferência por uma estratégia de vitimização, que se entende mais facilmente num quadro de preparação para novas eleições. De facto, só muito dificilmente as oposições estarão disponíveis para viabilizar um OE que não responda a pelo menos uma parte das suas prioridades – também apresentaram as suas propostas ao eleitorado, podem legitimamente dizer que se sentem vinculadas por elas, sobretudo num cenário de governo minoritário.
É claro que existe a hipótese de as oposições deixarem a proposta de OE baixar à discussão na especialidade, onde poderão ponto a ponto tentar introduzir-lhe alterações. Seria um jogo arriscado, porque abriria a porta à acusação de existência de uma coligação negativa que aprovaria um Orçamento que o Governo poderia não estar disponível para executar. O Governo veria aberto o caminho para apresentar a sua demissão.
O Presidente teria então de decidir ou pela recondução do actual Governo, que deveria apresentar uma nova proposta de OE, ou pela convocação de eleições, arriscando a repetição do resultado de Março e o cenário de governação por duodécimos até à aprovação do novo OE. Marcelo em anos anteriores anunciou o que faria – em 2021 afirmou que se o OE não fosse aprovado dissolveria a Assembleia e convocaria eleições, e foi o que fez. E em 2022 afirmou que actualmente a eleição assenta mais na figura do candidato a primeiro-ministro do que na dos deputados, e que se o primeiro-ministro se demitisse, também convocaria eleições (reconhece-se aqui, contudo, uma diferença fundamental, dado que não está em causa a substituição de Luis Montenegro).
Mas, ultimamente, Marcelo tem referido que a sua interpretação do sentimento dos Portugueses é de que não querem uma nova crise, o que traduzindo para linguagem comum parece querer dizer que não irá optar por novas eleições a menos que seja obrigado pelas circunstâncias. Será? Quem sabe? É um risco!
A segunda hipótese obriga a negociações. Parece ser o cenário preferido por todos. Mas negociar implica estar disponível para conseguir um resultado diferente do que inicialmente pretendemos. Se o objectivo é construir um OE que tenha condições de ser aprovado, é importante que Governo e oposições saibam identificar e reduzir os temas que são verdadeiros pontos de princípio, porque em matérias de princípio não se cede. Em tudo o resto, é possível (mais a uns do que a outros, e essa avaliação poderá determinar a escolha do parceiro de conversa) abandonar o dogmatismo e fazer cedências, maiores ou menores.
Essa também deve ser a postura a seguir na preparação das reformas de que o País tanto precisa, e cuja discussão tarda. As reformas devem traduzir o consenso ou, preferencialmente, o compromisso. O dogmatismo resultará em mais uma oportunidade perdida.