Os recentes acontecimentos na Rússia somam à incerteza que domina a economia mundial. Independentemente do que levou Yevgeny Prigozhin à loucura de marchar sobre Moscovo – se foi o decreto que determina a obrigação às milícias privadas de contratar com o Estado, a prazo a subordinação do Grupo Wagner, em que melhorou a situação? – a verdade é que Putin já não passa aos olhos de ninguém como incontestado.
A Rússia está mais isolada e mais vulnerável na cena internacional, e os seus “parceiros” em África e Ásia estarão a perguntar-se se estar com Putin é ainda estar com a Rússia. Quem ganha é a China, mais evidente que nunca a única alternativa à hegemonia americana.
Para Putin é um desastre: é o fracasso completo da estratégia política que o levou a invadir a Ucrânia, mau para ideia que ele tinha de si próprio e para a que queria que os outros tivessem dele. E deverá estar ainda mais desconfiado que antes: se mantém Shoigu e Gerasimov é porque ter consigo gente competente é assumir o risco de ser deposto. Ou seja, fica reduzido a Medvedev e pouco mais.
E, corolário do Teorema de Prigozhin, afinal o tempo não joga a seu favor. A curto prazo, Putin não fica internamente mais fraco, mas fica mais imprevisível. Contra o tempo e para não dar parte de fraco, a sua estratégia na Ucrânia só pode ser mais brutal, o que também torna a guerra mais cara – vai vender mais recursos em saldo que outros, como a Índia, revendem com bom lucro.
Para a Europa, este é um momento complexo, de redesenho de estratégias, em que os desafios políticos, particularmente a resposta aos populismos, se juntam aos económicos, como dívidas públicas elevadas e taxas de juro altas, e isto quando o seu motor – a Alemanha – vê subir a extrema-direita nacionalista e está numa situação económica estranha: em recessão sem desemprego.
Após dois trimestres com crescimento negativo, o desemprego na Alemanha está em 3,2%, abaixo do americano, já extraordinário, de 3,7%. Explicá-lo pelos estímulos económicos quando da pandemia do Covid começa a soar a exagero, e não basta dizer que o mercado do trabalho tem provado ser resiliente – a palavra mais usada do último par de anos, a mesma usada para inflação que teima, particularmente a subjacente, em não desaparecer, é como a pasta dos dentes, fácil de pôr fora, mas difícil de voltar a meter no tubo.
Pois, estamos como dizia Alice no Through the Looking Glass: “it’s a great huge game of chess that’s being played—all over the world—if this is the world at all, you know.”