Nos EUA, a pressão para Trump recuar nas tarifas estava muito intensa: os mercados accionistas estavam em queda profunda, afectando 62% dos norte-americanos, os que têm exposição directa ou indirecta à bolsa; os indicadores económicos sinalizavam a iminência de uma recessão, com provável subida do desemprego; a elevada incerteza estava a paralisar muitas decisões, sobretudo de investimento; a confiança dos consumidores estava em queda livre, com receios de subida de preços devido às tarifas; muitos políticos republicanos temiam um “banho de sangue” nas eleições de Novembro de 2026, devido às consequências das medidas anunciadas.
Nada o estava a demover, até que, parece, foi o mercado obrigacionista que o convenceu. As taxas de juro da dívida dos EUA estava a subir demasiado, mas, mais grave do que isso, as taxas de juro dos empréstimos às empresas estava numa escalada preocupante, devido ao aumento do risco. A sua experiência de empresário, com recurso maciço a endividamento, nem sempre bem-sucedido, tê-lo-á levado a perceber a gravidade do que se aproximava.
Assim, a 9 de Abril, foi anunciada uma suspensão de 90 dias de todas as tarifas, excepto o mínimo de 10% para todos os países, enquanto a China viu os impostos sobre as importações subir para 125%.
Esta concessão é uma excelente notícia para a União Europeia (UE), também pelo seu calendário, já que a Comissão Europeia tinha aprovado, no mesmo dia, retaliar aos EUA, embora a aplicar na semana seguinte. Se o presidente tivesse tomado esta decisão alguns dias mais tarde, haveria o sério risco de os europeus serem quase tão mal tratados como os chineses, por termos retaliado.
Ainda assim, aumentou o risco, que já era elevado, de a China invadir a Europa com os seus produtos a preços de saldo, por ter ficado sem o mercado norte-americano. De resto, este adiamento vai também aumentar um dos problemas maiores criados por Trump: a incerteza. Teremos menor investimento, porque ninguém sabe que tarifas teremos nos próximos meses, nem quanto tempo durarão, pelo que não faz sentido construir novas fábricas ou expandir as existentes sem se ter um mínimo de certeza se isso faz sentido.
Ter as duas maiores economias do mundo e as duas maiores potências militares, os EUA e a China, em conflito comercial aberto e descontrolado é muito mau e perigoso, quer para a economia mundial, quer para a paz. Era muito importante haver terceiros a tentar apaziguar os ânimos e a ajudar a conseguir, pelo menos, um cessar-fogo comercial e, de preferência, um recuo das actuais posições extremadas.
Uma primeira hipótese seria o Secretário-Geral da ONU, que deveria estar a tentar abrir vias de diálogo entre as potências desavindas, de forma que haja um recuo sem que nenhum dos lados corra o risco de “perder a face”.
A UE, ou mesmo Portugal (com acordos com os EUA, na base das Lajes, e com a relação especial com a China, através de Macau), também poderiam tentar ajudar à pacificação entre Washington e Beijing, sem procurar protagonismo, mas ao serviço da paz.