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CFP avisa que execução do PRR ficou “muito aquém do antecipado” em 2021

O alerta é deixado pelo Conselho das Finanças Públicas: a execução do PRR ficou “muito aquém” do previsto também na proposta de Orçamento do Estado para 2021, como no Programa de Estabilidade. Calendário da entrega das verbas explica, em parte, esse desvio.
19 Maio 2022, 11h00

A execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) ficou “muito aquém” do que estava previsto para o primeiro ano de aplicação. O aviso é deixado pelo Conselho das Finanças Públicas (CFP), num relatório divulgado esta quinta-feira em que se debruça sobre a evolução orçamental das Administração Públicas em 2021.

“No primeiro ano de aplicação do PRR, a despesa associada a este importante apoio estruturante da União Europeia ficou muito aquém do previsto pelo Governo, traduzindo um valor de execução de 90 milhões de euros face aos 500 milhões de euros considerados na proposta de Orçamento do Estado para 2021, ou seja, menos de 20% do previsto”, é sublinhado no documento agora conhecido.

A explicar esse desvio entre a projeção e o valor efetivamente registado está, pelo menos, em parte o calendário da transferência das verbas. “Parte deste desvio é explicado pelo facto de algumas entidades apenas terem recebido as verbas ao abrigo do PRR na parte final do ano, o que impossibilitou a aplicação das mesmas em despesa prevista no plano”, ressalva o CFP.

De notar que foi no verão do ano passado que o Plano de Recuperação e Resiliência desenhado pelo Governo de António Costa mereceu “luz verde” de Bruxelas, tendo como finalidade a implementação de reformas e investimentos que permitam ao país crescer de forma sustentada e reforçar a sua convergência com a Europa.

O período de aplicação deste instrumento, conforme recorda o CFP, compreende-se entre 2021 e 2026, “envolvendo recursos financeiros sob a forma de subvenções no montante de 13,9 mil milhões de euros e a possibilidade de empréstimos no valor de 2,6 mil milhões de euros”. O primeiro desembolso desse total deu-se no início deste mês, tendo Bruxelas transferido para Portugal, nesse âmbito, 1,16 mil milhões de euros: 553,44 milhões em subvenções e 609 milhões de euros em empréstimos.

O CFP sublinha que, para o primeiro ano de implementação do PRR, estava prevista, na proposta de Orçamento do Estado para 2021, despesa na ordem dos 500 milhões de euros, “a aplicar em formação bruta de capital de fixo” (FBCF), valor que viria a ser revisto, no âmbito do Programa de Estabilidade 2021-25, para 691 milhões de euros.

Ambas projeções acabaram, contudo, por não se confirmar. “Os desenvolvimentos orçamentais em 2021 revelaram uma execução do PRR muito aquém do antecipado naqueles dois documentos de programação orçamental”, alerta o CFP, esta quinta-feira.

E detalha: “A FBCF absorveu os maiores montantes de despesa, seguido em menor escala pela ‘outra despesa de capital’, que traduziu sobretudo ajudas ao investimento às famílias através do Programa Edifícios Mais Sustentáveis. A restante parcela, ligeiramente superior a um quarto da despesa em PRR, incidiu na despesa corrente primária. A ‘outra despesa corrente’ por via de transferências correntes concentrou a maior expressão, refletindo os apoios a entidades de outros sectores da economia, enquanto o consumo intermédio registou o menor montante de execução relativo a este plano”.

Contas feitas, o Conselho das Finanças Públicas observa que a execução da despesa realizada em 2021, no âmbito do PRR, foi inferior a 410 milhões de euros e em 600 milhões de euros ao previsto, respetivamente, a referida proposta de Orçamento do Estado e no mencionado Programa de Estabilidade.

Regressar a uma “situação próxima do equilíbrio orçamental”

No relatório divulgado esta quinta-feira, a entidade liderada por Nazaré Costa Cabral dá conta também que o saldo das Administrações Pública “teria regressado a uma situação próxima do equilíbrio orçamental”, se se descontar o impacto das medidas extraordinárias que o Governo colocou no terreno para dar resposta à crise pandémica.

“Um ano após a eclosão da crise pandémica, o saldo das Administrações Públicas registou uma melhoria, atingindo um défice de 2,8% do Produto Interno Bruto (PIB). Marcado pelo impacto mais elevado das medidas de resposta à pandemia, que em 2021 ascendeu a 2,7% do PIB, mais 0,3 pontos percentuais (p.p.) do que o verificado em 2020, o desequilíbrio orçamental reduziu-se em 3,0 p.p. do PIB. Descontando o impacto daquelas medidas, o saldo das AP teria regressado a uma situação próxima do equilíbrio orçamental”, enfatiza o CFP.

A explicar esta evolução esteve a recuperação da atividade económica (proporcionada pelo levantamento gradual das restrições associadas à pandemia) e o efeito positivo no saldo das medidas one-off (0,4% do PIB), “em particular a devolução da comissão paga antecipadamente ao Fundo Europeu de Estabilização Financeira.

O CFP acrescenta que mais de quatro quintos da recuperação do saldo em 2021 “deveu-se à melhoria verificada no saldo primário”, indicador, que não inclui os encargos com juros e que registou uma melhoria de 2,6 p.p. do PIB, em 2021, atingindo um défice primário de 0,4% do PIB ou de 808 milhões de euros. “A diminuição anual dos encargos com juros (0,4 p.p. do PIB) explica a restante melhoria do
saldo orçamental”, é destacado no relatório divulgado esta sexta-feira.

O Conselho de Finanças Públicas sublinha, além disso, que “excluindo o efeito orçamental transitório provocado por medidas one-off, o saldo orçamental ajustado daquelas medidas melhorou 2 p.p. do PIB em 2021″. Em causa está uma redução de um terço do agravamento que esse indicador registou no primeiro ano da pandemia (2020).

“O impacto favorável gerado pelo ciclo económico (1,6 p.p. do PIB), a par da diminuição anual dos encargos com juros (0,4 p.p. do PIB), a mais elevada das duas últimas décadas, foram determinantes para essa melhoria. A ação governativa discricionária, tal como avaliada pela variação do saldo primário estrutural, não influenciou a recuperação da posição orçamental. Assim, a postura política orçamental pode ser considerada neutra em 2021, o que contrasta, em todo o caso, com a natureza expansionista e contracíclica evidenciada em 2020”, pormenoriza o CFP.

Assim, e com base na informação disponível, a entidade liderada por Nazaré Costa Cabral estima que a convergência para o objetivo de médio prazo foi retomada em 2021.

Receita aumenta 10% e peso da despesa recua

O ano de 2021 foi sinónimo de um crescimento de 10% da receita pública e de um alívio do peso da dívida pública, salienta o Conselho das Finanças Públicas, no relatório divulgado esta sexta-feira.

No que diz respeito à receita, o CFP frisa que o crescimento foi de “cerca do dobro do observado para o PIB nominal (5,6%)”, o que significa que o rácio da receita pública face ao PIB elevou-se para 45,3%, mais 1,8 p.p. do que em 2020. “Em termos nominais, a receita aumentou 8.709 milhões de euros sustentada, em grande medida, pela receita fiscal e contributiva”, detalha a entidade, que avisa que os impostos indiretos (com um acréscimo de 10,6%) foram responsáveis por cerca de 90% do crescimento da receita fiscal das Administrações Públicas.

Já do lado da despesa, o peso em percentagem do PIB caiu 1,2 p.p, passando para 48,1% do PIB. “Esta redução beneficia do efeito do denominador, uma vez que o crescimento do PIB nominal foi superior ao da despesa pública. Em termos nominais, o crescimento da despesa desacelerou de 8,5% em 2020 para 3,0% em 2021”, explica o CFP.

Por fim, e no que diz respeito à dívida pública, o Conselho das Finanças Públicas enfatiza que, após o aumento expressivo em 2020, o rácio da dívida pública retomou, em 2021, a trajetória descendente em que se encontrava desde 2017. “A diminuição em 7,8 p.p. do PIB do rácio da dívida deveu-se aos contributos favoráveis do efeito dinâmico (-4,7 p.p.) e do ajustamento défice-dívida (-3,4 p.p.), este último em resultado de um menor montante de aquisição líquida de ativos financeiros, nomeadamente numerário e depósitos. Estes efeitos mais do que compensaram o contributo desfavorável do saldo primário (0,4 p.p.)”, remata.

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