Foi esta semana tornado público que a rede de balcões da Caixa Geral de Depósitos (CGD) deixou de ser a maior do país, como há cerca de cem anos nos habituámos. E de primeiro lugar, fruto de encerramentos massivos de balcões, a CGD passou a ser apenas a quarta maior rede de balcões.

O que é trágico, dramático. Da Caixa esperar-se-ia uma natureza e um papel muito relevante na coesão nacional. Na presença de proximidade, fornecendo serviços bancários de qualidade a preços módicos, em especial às populações residentes no interior de Portugal; aos menos alfabetizados; aos de menores recursos financeiros. Da Caixa esperar-se-ia que uma parte significativa dos depósitos captados, em cada distrito ou município, fossem mutuados a empresas e particulares desses municípios, funcionando como agente de desenvolvimento e não como mero sugador de poupanças para serem aplicadas em projectos no litoral ou ao serviço de grandes empresas.

Da Caixa esperar-se-ia um papel relevante no microcrédito e na resolução das falhas do mercado que, fruto de informação assimétrica, tende a concentrar o crédito em entidades do litoral e em grandes empresas ou particulares com empregos em grandes empresas ou funcionários públicos.

Da Caixa esperar-se-ia um papel relevante na integração das empresas portuguesas no mercado ibérico. E no apoio às segundas e terceiras gerações de portugueses na diáspora, para quem a CGD poderia representar uma oportunidade de captar os capitais e o talento destes filhos e netos dos emigrantes, em prol de Portugal.

Em menos de 30 anos a quota de mercado da CGD passou da vizinhança de 50% para pouco mais de 20%, aproximando-se perigosamente da irrelevância. A culpa desta ‘privatização’ sub-reptícia, ano após ano confirmada com perda de quota de mercado, encerramento de balcões e redução de trabalhadores, não pode ser assacada a esta administração. Esta limita-se a seguir a carta de missão que lhe foi entregue, depois da falência da República Portuguesa e da assistência externa da troika.

Não se culpe a gestão actual ou a passada, mas sim todos nós, enquanto bancários ou contribuintes, que deixámos que o Estado esteja na iminência de perder um instrumento valioso de coesão social e económica e de colmatar as falhas de mercado. Primeiro foram os serviços do Estado que encerraram no interior: escolas, tribunais, delegações regionais dos ministérios, quartéis… Agora, qual prego no caixão, o balcão de proximidade da CGD.

E eu, que sou insuspeito de simpatias marxistas ou colectivistas, tenho que dizer alto e bom som: privatizar a Caixa, por omissão, tornando-o igual a qualquer banco comercial, não serve os interesses de Portugal.

E digo isto com o desprendimento de quem considera que a denúncia do acordo de empresa de 2016, feita pela administração da Caixa, é inoportuna no tempo e no modo como foi feita e carece de fundamentação. Com o desprendimento de liderar o maior sindicato português, mas o mais pequeno no seio dos trabalhadores da Caixa.

Qual a nossa esperança? Que o nosso sagaz e hábil primeiro-ministro consiga, junto de Bruxelas, que a CGD volte a ter um papel relevante de agente económico estratégico para Portugal. Que os contribuintes se indignem com esta privatização à socapa. Passos Coelho não tinha razão em querer privatizar a CGD. Mas assim, de forma menos explícita, o resultado vai ser o mesmo.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.