Não, não se trata do Professor Porter, cientista ficcional criado por Edgar Rice Burroughs, pai da bela Jane por quem Tarzan se apaixona na selva africana.

Refiro-me a Michael E. Porter, professor de Economia na Harvard Business School. Para quem já não se lembra, Porter estudou a economia portuguesa há 26 anos. Fez um conjunto de recomendações que ficaram conhecidas como o “Relatório Porter”.

Foi Luís Mira Amaral, ministro no governo de Cavaco Silva, que encomendou a Porter um dos estudos que estruturou o debate sobre a estratégia da economia portuguesa. Porter traçou o diagnóstico das fragilidades, e prescreveu as receitas para aumentar a competitividade da economia portuguesa. Muitas foram seguidas, com sucesso, mas muitas outras não, e estão na base do nosso progressivo atraso.

No ano passado, por ocasião dos 25 anos do Relatório, o Professor Mira Amaral disse que “para muita gente não terá sido, mas para mim sim, foi uma abordagem nova, chamando a atenção para uma série de fatores não tão considerados”, como, por exemplo, “as indústrias correlacionadas”.

A partir de 1995 correu mal a aposta no mercado interno. O projeto Porter também apontava uma série de políticas públicas que não tiveram grandes melhorias, como a educação e a gestão da floresta.

A aplicação do projeto Porter permitiu melhorias evidentes nos setores tradicionais como o calçado, têxtil, vestuário e confeções, nos vinhos e no mobiliário, segundo Mira Amaral. Teve um impacto médio nas condições de procura, ou seja, a sofisticação da procura doméstica não aumentou muito.

Teve um efeito baixo nas rivalidades, nas estratégias das empresas e em todos os elementos de cooperação entre as empresas. Não houve praticamente medidas de políticas públicas de apoio às variáveis horizontais.

Mira Amaral relembrou que foi uma ministra do PS, Maria João Rodrigues, que reativou a ideia dos clusters, chamando-lhes polos de competitividade. Continuamos a ter clusters de pequena dimensão, na sua maior parte, e não chegámos a ter clusters verdadeiramente tecnológicos. Há uma grande dificuldade na associação das empresas e a estrutura empresarial é excessivamente atomizada.

Precisamos de Porter, ou de outros como ele, imediatamente, para ajudar o Governo, as instituições do Estado e a iniciativa privada, superando falta de determinação, cooperação, imaginação, competências e tempo para conceber e pôr em prática o que eu chamaria de Plano Estratégico para a Renovação da Economia Portuguesa.

É preciso mobilizar as melhores cabeças para trabalhar a estratégia de recuperação de Portugal, esforço de Estado que tem de começar de imediato. Temos políticos de alta qualidade, como Pedro Passos Coelho e Paulo Rangel, do PSD, Adolfo Mesquita Nunes do CDS, Pedro Siza Vieira ou Ana Mendes Godinho do PS, João Cotrim Figueiredo da Iniciativa Liberal, economistas como Sérgio Rebelo e Sérgio Correia, ambos nos EUA, tantos investigadores da academia portuguesa, e muitos empreendedores, como por exemplo, os chefes destas 56 empresas líderes de mercado (organização da FFMS).

Foi desadequado ao momento o discurso de pobreza que o primeiro-ministro fez há dias numa entrevista sobre o pós-pandemia. É certo que as dificuldades são prementes, para alguns são uma questão de sobrevivência, e vão continuar. Já sabemos.

Muitos políticos continuam sem perceber que os portugueses estão mais à frente do que eles, políticos. Precisamos de um discurso que olhe para a renovação necessária pós-pandemia. Tem de ser um discurso de líder, firme nas convicções, confiando que os portugueses serão capazes, baseado na ideia que o sacrifício de hoje vale a pena porque estaremos mais preparados para superar as dificuldades.

Na realidade, esse discurso já foi feito por um estrangeiro. Chris Sainty, embaixador britânico em Portugal, no texto que publicou neste jornal há dias com o título “Um elogio aos portugueses em momento de crise”, aqui em português e aqui em inglês, exortou os portugueses a lutar. Sainty escreveu que o desafio é enorme, “mas sei que Portugal não só sobreviverá a isto, como também emergirá mais forte.  É um país pequeno mas com um coração muito grande”. Estas são palavras reconfortantes e inspiradoras.

Pode parecer frio e calculista encarar a pandemia como uma oportunidade, mas é inescapável que não pode tudo continuar igual. Algumas coisas serão diferentes, porque entrarão nos hábitos e comportamentos. Outras, pela oportunidade oferecida para corrigir ou eliminar o que está mal, pela absoluta necessidade de renovação em muitos planos – empresas, Estado, instituições. Tudo deverá ser focado no progresso de cada cidadão – nas pessoas, nas suas famílias, na sua iniciativa e energia.

Essa ação tem de começar já. Como escreveu o Editorial Board do “Financial Times” na sexta feira, dia 3 de abril, “os líderes que ganharam a guerra [Segunda Guerra] não esperaram pela vitória para planear o que se seguiria. Franklin D. Rosoosevelt e Winston Churchill publicaram a Atlantic Charter, que determinou o caminho para a criação das Nações Unidas, em 1941. O Reino Unido publicou o Beveridge Report, o seu compromisso para o estado social universal, em 1942. Em 1944, a conferência de Bretton Woods forjou a arquitetura financeira do pós-guerra. Este tipo de visão antecipada é precisa hoje. Para além da guerra de saúde pública, os verdadeiros líderes vão mobilizar-se agora para ganhar a paz.”

Temos de reforçar e ampliar as áreas industriais que são o principal exportador português (não é o turismo), focando em indústrias de ponta. Como fez Isabel II no seu discurso no domingo, invocando o que de melhor fizeram as gerações anteriores, devemos fazer apelo à nossa veia de exploradores e descobridores lançando a sério a exploração oceânica e intensificando o setor espacial.

Muitos, como eu, têm vindo a alertar ao longo dos anos que a economia não pode ter no turismo um dos seus principais pilares. É uma indústria muito dependente de externalidades imprevisíveis. Pensava-se que seria o terrorismo que poderia abalar o turismo, mas foi um fenómeno da natureza que paralisou o setor de serviços de hospitalidade. Era previsível.

As pandemias são recorrentes na história da humanidade, com um currículo recente repleto de ocorrências. Ao contrário do que se diz, só fomos apanhados desprevenidos porque os governos não prestaram atenção aos avisos. A ONU, o Banco Mundial, a tardiamente famosa TED Talk de Bill Gates em 2015, e muitas organizações nacionais avisaram para o perigo de uma iminente pandemia. É preciso que os sistemas de saúde estejam preparados e em prevenção para repentinos enormes afluxos de doentes.

Há apenas uma década, entre a primavera de 2009 e a de 2010, tivemos a gripe suína H1N1. Infetou 1,4 mil milhões de pessoas em todo o mundo e matou entre 151,70 e 575.000 pessoas, de acordo com o Centers for Disease Protection and Control, uma organização do governo dos EUA. Agora temos o novo coronavírus SARS-CoV-2.

Segundo Steffanie Strathdee, Associate Dean de Global Health Sciences na Universidade da California, em San Diego, o H1N1 deveria ter sido um sinal de aviso, mas as autoridades americanas, como de resto as autoridades em quase todo o mundo, não se preveniram. Os efeitos do H1N1 não foram maiores nos EUA porque estavam preparados, o que não aconteceu agora.

A mais antiga pandemia conhecida ocorreu há cerca de cinco mil anos em aldeias pré-históricas… na China. É tempo de a China revelar o verdadeiro número de vítimas da atual pandemia, pedir desculpa ao mundo por ter escondido o surto em Wuhan, acabar com aqueles perigosos mercados de animais vivos, e colaborar ativamente na descoberta de vacinas e antivirais.