Olhando para o silêncio em curso, até parece que o futuro dos portugueses não é matéria relevante para o Governo. Um silêncio que parece deixar transparecer que o bem-estar dos portugueses e a preservação dos seus postos de trabalho não são matérias relevantes.

Ao mesmo tempo que a República Portuguesa consome recursos escassos para atrair investimento estrangeiro, em total contradição, o Estado português nada faz perante a destruição metódica e sistemática de postos de trabalho perpetrada por algumas empresas, altamente lucrativas, nos sectores da banca e das telecomunicações.

Um silêncio da parte do Governo, tanto mais estranho, porque foi precisamente o PS que tanto afirmou no passado, com inteira razão, existir uma alternativa à orientação imposta pela troika. Ora, o Governo tem todas as condições políticas e parlamentares para desfazer o legado pernicioso da troika, alterando algumas matérias no âmbito da legislação do trabalho.

Muitos trabalhadores sentem, por estes dias, uma enorme revolta. Não compreendem. Não compreendem que empresas que beneficiaram da ajuda dos cidadãos e dos contribuintes, através das obrigações convertíveis em capital, as célebres CoCos, agora revelem tamanha insensibilidade social e falta de noção do seu papel na salvaguarda da coesão nacional.

Não compreendem igualmente os trabalhadores que um dos bancos mais eficientes da Europa, e um dos mais eficientes do seu grupo europeu, tenha de proceder a uma brutal sangria da sua força de trabalho num curtíssimo espaço de tempo.

Ironia do destino, o mesmo banco que recusou prescindir no passado dos contratos com os célebres Swaps de tão má memória, Swaps esses que tanto custaram aos contribuintes, não é agora capaz de fazer um esforço para reajustar a sua mão de obra portuguesa de forma faseada no tempo?

Custa-me escrever este artigo. Nada disto é pessoal, e não me quero imiscuir no combate partidário. Aliás, alguns dos administradores destas empresas são meus conhecidos, colegas de universidade e de estrada nas nossas vidas profissionais. Isto dito, o que se está a passar é intolerável.

Compreendo, em parte, que alguns deles estejam entre a espada e a parede. Pressionados pelos acionistas e pelo seu apetite predatório, não têm forma de contrariar a avidez sôfrega pelo lucro imediatista, mesmo que isso colida com os seus valores pessoais de decência e solidariedade.

Por isso, os próprios conselhos de administração destas empresas necessitam do respaldo de uma intervenção dos representantes da República Portuguesa (Presidente, primeiro-ministro, ministra do Trabalho, Parlamento) ao abrigo dos seus magistérios de influência. Só assim poderão justificar um travão à chacina dos trabalhadores portugueses perante o capital estrangeiro.

No momento em que tanto se fala dos fundos da bazuca, temos sectores sustentáveis que estão a atirar para uma situação de necessidade futura os seus trabalhadores. Absolutamente intolerável. Os portugueses podem contar com os seus representantes nas mais altas instituições do Estado, ou os mesmos vão continuar a assobiar para o ar?

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.