O antigo Presidente da República Popular da China, Xi Jinping, é o novo Presidente da República Popular da China. O que mudou?

A China permanece um dos países mais intrigantes do mundo. Apesar da sua dimensão populacional (mais de 1.400 milhões de habitantes) e da sua enorme área (é o 3º maior país do mundo), o nível de compreensão e informação que o resto do globo tem sobre a China nunca parece abrangente. No entanto, é possível observar e acompanhar a evolução de algumas dinâmicas, de modo a ter uma ideia da sua evolução interna e dos seus objetivos internacionais, com foco no presente, mas nunca perdendo o ponto de observação milenar.

Do ponto de vista dum português, sem conhecimento local, existem três dimensões fundamentais sobre a forma como a China se posiciona, com que políticas e qual a respetiva influência no mundo, nomeadamente a dimensão da economia interna, o posicionamento geoestratégico e a definição do modelo de sociedade. Todas estas dimensões parecem aparentemente interligadas.

Nas últimas décadas, a China posicionou-se de um modo mais aberto à atividade económica, oferecendo baixos custos de produção às empresas ocidentais, o que permitiu elevar o PIB per capita do país. Esta evolução permitiu alcançar vários objetivos, como:

1) Salto tecnológico: a China passou a ser percebida como um dos países líderes em novas tecnologias (11º no Global Innovation index 2022);

2) Tornar-se um dos mercados mais importantes para as empresas de todo o mundo, sem que se levantassem muitas críticas ou escrutínio internacional ao seu modelo de sociedade. Este modelo não foi posto em causa durante anos pela generalidade dos stakeholders que pretendiam obter mais vantagens comerciais. Desta forma, foi-lhes permitido o desenvolvimento de tecnologias de controlo populacional, como o sistema de crédito social, o passaporte de saúde, a expansão do sistema de videovigilância e a utilização de inteligência artificial no mesmo, entre outros;

3) Ascensão da posição internacional da China: posicionando-se como parceiro privilegiado, com forte presença em alguns países, especialmente os fornecedores de matérias-primas, através de iniciativas diplomáticas/económicas como a Belt and Road Initiative – Iniciativa Uma Faixa Uma Rota.

Com estas conquistas, nos últimos anos, a China aumentou o grau de agressividade das suas estratégias expansionistas, nomeadamente com o controlo do Tibete, com os conflitos pontuais na fronteira com a Índia, no desvio de recursos hídricos, com as ameaças sobre extensões do mar do Sul da China, no controlo mais apertado sobre Hong Kong e a na renovada pretensão em controlar Taiwan. A política Covid zero também tem vindo a ajudar ao aumento do controlo sobre a população. No entanto, quer na Presidência Trump, quer mais recentemente com a afirmação de não oposição à Rússia, numa altura de conflito com a Ucrânia, a comunidade internacional parece estar mais atenta e participativa na tentativa de refrear a expansão chinesa.

Relativamente à economia interna, apesar dos poucos dados “fidedignos” disponíveis, não é possível ignorar os problemas associados ao mercado imobiliário, desde que a Evergrande, a maior empresa de desenvolvimento na China, anunciou ter dificuldades em pagar a sua dívida, bem como o lançamento de um “ataque” por parte do Estado a algumas das maiores indústrias e empresas no país, especialmente as de maior presença digital. Esta dinâmica já causou uma onda de protestos em algumas províncias da China, bem como a fuga de muitos dos milionários da nova geração.

Neste contexto, a recondução de Xi Jinping parece reforçar a atuação estratégica internacional continuada da China, em especial com o reforço das relações existentes com parceiros privilegiados, o aumento da influência militar na zona do Pacífico e o maior controlo interno sobre a população de modo a sufocar qualquer protesto.

Contudo, este posicionamento da China, associado ao conflito entre a Rússia e a Ucrânia, parece indiciar uma maior retração ao movimento de globalização das últimas décadas, o que também não deverá ser abonatório para a economia interna. Assim, Xi Jinping deverá fazer uma maior aposta na segurança, tal como referido no recente Congresso do Partido Comunista Chinês, apontando um inimigo externo comum de forma a justificar sacrifícios económicos de “curto prazo”.

Havendo uma corrida tecnológica global em várias frentes (microprocessadores, energia, inteligência artificial, tecnologia espacial, tecnologia militar robotizada, entre outras), estima-se que a China volte a concentrar o seu desenvolvimento maioritariamente em projetos de “desígnio nacional”, em vez de incentivar a iniciativa privada.

Como corolário das recentes observações de atividade no âmbito internacional, no controlo sobre a sociedade chinesa no geral e na evolução da atividade económica, não parece existir o enquadramento para uma súbita recuperação económica. A dinâmica poderá mesmo ser negativa, em resultado da saída de grandes multinacionais que queiram diversificar o seu risco geográfico, e dos problemas no setor imobiliário e bancário. Tendo em conta a incerteza quanto à manutenção da trajetória recente de prosperidade, o investimento de capitais naquele país deverá ser agora mais cauteloso, o que não impedirá a China de se manter como uma das nações mais importantes do mundo.