As cidades são o espelho no qual se refletem muitos aspetos e camadas da sociedade. Na sociedade aberta em que vivemos, a expansão da conectividade digital associada aos movimentos de desenho coletivo da cidade, tem potenciado, progressivamente, um ecossistema de inovação cidadã de base comunitária.
Se analisarmos os ecossistemas com atenção, verificamos que assentam numa visão de crescimento resiliente, onde um conjunto de entidades, que se relacionam num determinado território e interagem entre si, geram um sistema estável, uma comunidade. O seu sucesso está em conseguir construir lugares como ativos de futuro abrindo diligências para a criatividade local incremental.
Um novo paradigma que reconhece, nutre e celebra o dinamismo das inter-relações e multidimensões na compreensão dos problemas da vida urbana. Ora, novas leituras requerem novas metodologias de trabalho. A consciência social dos atos leva a práticas colaborativas que direcionem para uma mudança que possa garantir uma maior qualidade de vida urbana e cidadania ativa.
Assim, o momento que atravessamos é a oportunidade para instituições públicas, privadas, academia, sociólogos, economistas, urbanistas, arquitetos e cidadãos, trabalharem em conjunto, mesmo que tenham provas dadas nas respetivas áreas. É basilar envolver a inteligência coletiva, a sabedoria contextual e a empatia emocional no processo de pensar e fazer, criando uma dimensão mais consensual de longo prazo para a(s) solução(ões) obtida(s).
Os laboratórios de inovação cidadã são os espaços ideais, ao se diferenciarem pelo seu ADN de colaboração, partilha de conhecimentos e experimentação. A inovação cidadã não se restringe ao debate sobre tecnologia na inovação de caminhos, metodologias, possibilidades, ainda que a questão tecnológica seja essencial para a ideia de cidadania, de construção cidadã.
António Lafuente descreve-os como uma infraestrutura aberta, versátil, escalável e de baixo custo para a produção de conhecimento e política experimental. Uma abordagem mais holística, multicamada e multiator que emerge para ir mais além da solução única e estática para os problemas concretos dos bairros, da habitação, da vida das pessoas.
Em Portugal, o primeiro laboratório cívico português teve lugar no Bairro de Santiago, Aveiro, inspirado no Experimenta Distrito do MediaLab-Prado implementado em bairros de Madrid. O Lab Cívico de Santiago surge graças à mobilização da energia cívica de uma equipa (académicos, IPSS, voluntários e empresas) no processo de construção colaborativa, analógica e tecnológica, de soluções para problemas do quotidiano.
A inovação cidadã parte de um conjunto de modelos emergentes, que demonstram que a esfera digital pode renovar a capacidade das pessoas para a auto-organização, permitindo a prestação de serviços de maneira distribuída e não fechada ou centralizada. A conectividade digital, em tempo real, entre espaço físico e virtual converte o físico num novo tipo de interface interativa.
O acesso ilimitado a fluxos de informação e conhecimento tem alterado a forma como nos relacionamos, permitindo um ambiente cada vez mais participativo, por natureza, propício para criar soluções por cidadãos ativos. Estes deixam de ser apenas observadores ou consumidores e passam a ser parte integrante da democratização da produção da cidade. Thomas Ermacora resume esta tendência a uma procura global sobre o potencial da organização participativa, um capital local para um maior equilíbrio urbano.
Hoje, é prioritário apostar na inteligência coletiva que alimenta estratégias baseadas na comunidade e, assim, mantém vivo o ecossistema espelho de uma cidade com qualidade para todos.