[weglot_switcher]

Cientista política luso-americana vê “tempestade perfeita” a se formar nas eleições dos Estados Unidos

A docente na Universidade de Boston admitiu que apesar da estabilidade das sondagens nas últimas semanas, “há muitos fatores” e que tudo é possível.
4 Outubro 2020, 09h54

A cientista política luso-americana, Daniela Melo, que leciona na Universidade de Boston, admitiu que apesar da estabilidade das sondagens nas últimas semanas, “há muitos fatores” e que tudo é possível. “Há caminhos para a vitória para os dois lados”. A questão dos votos por correspondência e os diferentes prazos de contabilização nos estados tornam possível que haja uma batalha legal em torno da identificação e certificação do vencedor. “Pessoalmente, vejo aqui uma tempestade perfeita”, disse Melo. “Novembro vai ser um momento crítico para a democracia americana”.

Com as sondagens a darem uma vantagem média de oito pontos ao candidato democrata Joe Biden sobre o Presidente Donald Trump, a cientista política luso-americana Daniela Melo diz que há um equívoco sobre o que se passou em 2016.

“As sondagens não foram uma grande falácia da última vez”, disse à Lusa a cientista política, que leciona na Universidade de Boston. “A nível nacional, as sondagens não falharam minimamente”, afirmou.

Quando o então candidato Donald Trump venceu o colégio eleitoral e derrotou Hillary Clinton, comentadores e analistas apontaram o dedo às sondagens, já que a perspetiva era de que a candidata democrata fosse eleita.

No entanto, explicou Daniela Melo, a vitória de Clinton no voto popular a nível nacional aconteceu como esperado. “O problema foram as sondagens feitas em estados como o Wisconsin e Ohio”, detalhou.

A contabilidade da eleição de 2016 mostra que Donald Trump venceu por uma diferença de apenas 77.744 votos, distribuídos pelo Wisconsin, Michigan e Pensilvânia, e uma análise posterior da plataforma especializada FiveThirtyEight mostrou que a precisão das sondagens nacionais nesse ano foi semelhante à de eleições anteriores.

O problema é que “é muito difícil fazer sondagens nos Estados Unidos”, sublinhou a docente, apontando para a dependência do telefone fixo, um meio de condução de pesquisas que é cada vez menos fiável para obter uma amostra representativa.

Segundo Daniela Melo, as firmas de sondagens fizeram um esforço nos últimos quatro anos para afinar as pesquisas ao nível dos estados e terem uma perceção mais adequada das intenções de voto.

“Há os eleitores prováveis e os eleitores registados. Os prováveis recebem mais peso nas sondagens”, explicou a cientista política. “O modelo diz que os eleitores mais prováveis são os mais velhos: Quanto mais velho o eleitor, maior a probabilidade de votar”, acrescentou. “A idade é o elemento mais fiável na previsão de voto”.

Por outro lado, “falou-se muito sobre o facto de que quando se ligava às pessoas elas não queriam admitir que iam votar em Trump”, lembrou a professora.

“Havia uma certa vergonha, não na classe trabalhadora, mas sobretudo nas camadas sociais mais altas, pessoas brancas com ensino superior”.

Segundo Daniela Melo, houve “uma discrepância muito grande” sobre o que as pessoas admitiam e como votaram. “Isso mudou radicalmente” agora, considerou, dando o exemplo do lusodescendente John Oliveira, membro do comité escolar da cidade de New Bedford, Massachussetts, que colocou uma cerca eletrificada a proteger o sinal pró-Trump que exibe na frente da sua casa.

A um mês do dia das eleições de 03 de novembro, Daniela Melo referiu que as sondagens se têm mantido estáveis e que desta vez não existe o fator de repulsa que levou muita gente a não votar na candidata democrata há quatro anos.

“O Biden pode não ser o melhor candidato, mas não é uma Clinton”, analisou a docente.

“A Hillary era um símbolo de tudo o que para a classe trabalhadora tinha corrido mal, um símbolo do neoliberalismo, da abertura dos mercados, do NAFTA”, exemplificou. “Joe Biden não promete necessariamente uma melhoria nas várias frentes que quem votou em Bernie Sanders quer ver. Mas promete um retorno a uma certa normalidade”.

Para a cientista política, isso poderá ser suficiente neste ciclo eleitoral. “As indicações são de que Biden vai poder atrair muito o voto dos republicanos moderados e dos independentes”, explicou.

“De certa maneira, ser moderado e prometer um retorno à normalidade basta para conseguir apanhar esses votos”, disse. “Esta é que é a verdadeira eleição anti-Trump”.

Após o primeiro debate com o presidente, durante o qual houve insultos e acusações, Joe Biden aumentou ligeiramente a sua vantagem. De acordo com a média contabilizada pela plataforma FiveThirtyEight, o democrata recolhe agora 50,9% das intenções de voto, contra 42,7% do presidente.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.