No próximo dia 14 de outubro, reúne-se em Sharm el-Sheikh uma cimeira internacional sob a co-presidência de Donald Trump e Abdel Fattah al-Sisi, que poderá influenciar decisivamente o futuro do conflito israelo-palestiniano.
O encontro decorre na sequência do cessar-fogo de 10 de outubro e integra o ambicioso plano de 20 pontos apresentado por Trump para a reconstrução de Gaza, avaliada em cinquenta mil milhões de dólares, e que inclui a troca de reféns por prisioneiros, o reforço da ajuda humanitária e a definição da governança após o conflito. Contudo, mais do que uma simples reunião diplomática, o evento espelha um complexo jogo de equilíbrios políticos, alianças ideológicas e exclusões estratégicas.
A lista de participantes combina países tradicionalmente aliados, mediadores regionais e outros atores menos habituais: Estados Unidos, Egito, Qatar, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Jordânia, Turquia, França, Alemanha, Reino Unido, Itália, Paquistão, Indonésia, Espanha, Japão, Azerbaijão, Arménia, Hungria, Índia, El Salvador, Chipre, Grécia, Bahrein, Kuwait, Canadá e a Organização das Nações Unidas, representada por António Guterres. Particular relevância tem o convite e presença da Espanha, França e Reino Unido – países que tiveram um papel destacado no movimento europeu de reconhecimento do Estado Palestiniano e que se opuseram à linha seguida por Trump. Estes Estados enfrentam agora o desafio de se posicionarem num fórum dominado por uma estratégia centrada nos interesses americanos e num apoio inabalável a Israel, que contrasta com as suas tradições diplomáticas no Médio Oriente.
A inclusão de líderes como Viktor Orbán, Nayib Bukele e Narendra Modi suscita dúvidas sobre as motivações por detrás do convite. Estes países, sem ligações diretas significativas a Gaza, parecem reforçar a narrativa de um apoio global ao plano de Trump, especialmente num contexto em que vozes populistas ou pró-Israel ganham destaque. O Irão, cuja participação está ainda por confirmar, representa uma aposta diplomática arriscada, na medida em que Washington procura envolver um crítico ativo do plano que apoia grupos como o Hamas e o Hezbollah, quer para o pressionar a negociações, quer para o expor caso recuse o convite.
Israel opta por não estar presente, evitando assim confrontos diretos num fórum onde coexistem vozes críticas. A sua representação indireta pelos Estados Unidos, que planeiam uma visita de Trump a Jerusalém após a cimeira, sublinha a estratégia de manter o diálogo num formato regional e indireto, consolidando o modelo dos contactos separados que decorreram entre 6 e 9 de outubro, mediados pelo Egito, Qatar e EUA. Esta abordagem remete para o histórico de negociações regionais, como o Roadmap para a Paz de 2003, privilegiando a solidariedade árabe e a participação global.
A ausência estratégica da Rússia e da China é um sinal claro da vontade dos Estados Unidos de limitar a influência destas potências no Médio Oriente. Moscovo, aliado do Irão e crítico do plano por considerar que favorece Israel, e Pequim, que prefere os fóruns das Nações Unidas e critica a desmilitarização total de Gaza, foram excluídos, sinalizando uma clara tentativa de reorganização do equilíbrio geopolítico regional.
O plano proposto por Trump inclui a troca imediata de 20 reféns israelitas por 250 prisioneiros palestinianos e 1.700 detidos, a retirada parcial das tropas israelitas para a “Linha Amarela” e a criação do Centro de Coordenação Civil-Militar liderado pelo CENTCOM, já com cerca de duzentas tropas americanas sob o comando do almirante Brad Cooper.
A reconstrução de Gaza, um território devastado por dois anos de conflito que terão causado cerca de 60 mil mortos, implica compromissos financeiros substanciais, com Estados do Golfo, Japão e Índia na linha da frente. Contudo, a fase seguinte – a desmilitarização completa da região e a governação pela Autoridade Palestiniana – é vista com ceticismo. O Hamas exige garantias contra violações, enquanto Netanyahu, apesar da celebração do acordo, mantém reservas quanto a concessões definitivas.
Esta cimeira é um teste à liderança de Donald Trump. Ao convocar aliados improváveis, como El Salvador e a Hungria, e um adversário declarado como o Irão, os Estados Unidos procuram consolidar uma ampla coligação. No entanto, a exclusão de potências globais e a ausência do principal ator em conflito indicam que o evento poderá ser mais simbólico do que decisivo.
A incógnita permanece: será esta a base para um acordo sustentável ou apenas uma plataforma para a reafirmação da influência americana? No Médio Oriente, a história aconselha prudência e atenção aos equilíbrios que se procuram manter.



