O político e jornalista brasileiro Carlos Lacerda, histórico inimigo de Getúlio Vargas explicou as razões do seu sucesso como orador: “Se o público está olhando para o outro lado você fala uma coisa que faz todo o mundo rir e todos se voltam e riem. E nesse momento você aproveita e diz coisa séria. Ou quando o público é sério de mais você o faz rir. Enfim isso faz parte de uma qualidade histriônica, vamos dizer um pouco circense”.

A ideia da política como circo esteve sempre presente na opinião pública desde os alvores da democracia representativa e acentuou-se com a chegada à política das campanhas eleitorais com recurso intensivo à televisão. Hoje, o tema não abandona o espaço público porque muitas das estratégias de comunicação dos partidos políticos e dos seus dirigentes assentam na exploração do imediatismo emocional que é terreno fértil para os truques circenses.

Em boa verdade, as coisas mudaram pouco desde a data (anos 40 do século passado) em que Lacerda confessou a sua “estratégia”. A pandemia que atravessamos e as exibições públicas do poder político a esse propósito, com confinamentos e desconfinamentos, planaltos e picos, índices de contaminação e factores de risco, testam no essencial a atenção do público.

Quando foi preciso mandar todos para casa, e muitos estavam a olhar para outro lado, foi ‘falar uma coisa assustadora’ e toda a gente se voltou, chorou e refugiou-se em casa. Quando agora se quer tirar as pessoas do sério e fazê-las sair utiliza-se o truque óbvio: “você o faz rir”. Pode ser que a tradicional parelha do palhaço rico e do palhaço pobre consigam encerrar com sucesso a matinée

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.