[weglot_switcher]

Com a queda do império verde teremos um ou mais DDT?

Antes de sair de cena, o Dono Disto Tudo (DDT) quer convencer-nos que somos nós, os portugueses, os verdadeiros DDT. Irrisório ou não, já nos contentávamos com a possibilidade de continuar a saber quem é o senhor, ou os senhores que se seguem na cadeira. E se o novo DDT der lugar a uma DDT? […]
12 Dezembro 2014, 13h23

Antes de sair de cena, o Dono Disto Tudo (DDT) quer convencer-nos que somos nós, os portugueses, os verdadeiros DDT. Irrisório ou não, já nos contentávamos com a possibilidade de continuar a saber quem é o senhor, ou os senhores que se seguem na cadeira. E se o novo DDT der lugar a uma DDT?

 

A queda do império verde não significa que Portugal vá ficar órfão, largado ao seu destino, sem um verdadeiro DDT (Dono Disto Tudo) capaz de o guiar por esse progresso fora. Por enquanto desconhece-se em que tom se erguerá tal poderio mas alegre-se o país: muitos já se perfilam e não tarda nada conheceremos o rosto de quem vai passar a puxar todos os cordelinhos.
Por mais diferenças e mudanças que se adivinhem, o low profile vai seguramente manter-se. Espera-se que pelo menos o título não seja “ingratamente” recusado como acabou de o fazer o ex-DDT.
Na verdade, o antigo presidente do Banco Espírito Santo (BES), Ricardo Salgado, no cenário de uma das mais longas, polémicas e seguidas audições levadas a cabo no parlamento, recusou o título de DDT, afirmando então que quem manda em Portugal são os portugueses.
“Considero-me uma pessoa sóbria e trabalhadora. Esta designação de Dono Disto Tudo é irrisória”, sublinhou ainda Ricardo Salgado. O pano não poderia cair sem que antes se ouvisse o derradeiro queixume: “isto foi uma rotulação que me foi colada, possivelmente para me prejudicar no futuro”.
É precisamente no futuro que nos devemos concentrar para listar e serenamente aguardar pelo emergir do próximo(s) DDT. E a base lógica desta equação pode muito bem ser a eterna relação de sonho “dinheiro/poder”. A qual, de imediato, nos faz apontar baterias para os três mais sonantes nomes da nossa praça: Américo Amorim, Belmiro de Azevedo e Soares dos Santos. Os três empresários portugueses com lugar cativo na lista das pessoas mais ricas do mundo, elaborada periodicamente pela revista Forbes. Sendo que este ano, Américo Amorim e Belmiro de Azevedo aumentaram o valor das respetivas fortunas.
No entanto, há muito que deixámos de ser “um simples jardim à beira mar plantado” e no postal ilustrado passaram a figurar imagens de grandes empresas nacionais, passíveis de processos de privatização ou alienação de fatias apetitosas.
Assim sendo, mudamos o chip e preparamo-nos para ter um DDT que não tenha como língua materna o doce português, e os candidatos ganham vantagem, pelo menos em quantidade. Compra aqui, compra ali, e os empresários chineses estão entre os mais prováveis DDT. Tentemos então obter foto dos CEO da China Three Gorges, State Grid e grupo Fosun porque os seus rostos são, claramente, desconhecidos para a população portuguesa. E que se multipliquem os cursos de mandarim, vão fazer-nos ainda mais falta.
Com a vantagem de estarmos mais à vontade com a língua, também os investidores americanos parecem estar a analisar o tecido empresarial com outros olhos e podem mesmo estar dispostos a aumentar os seus investimentos em terras lusas. Afinal, uma presença que apesar de discreta conta já com alguma tradição, bem mais até que o recente, e súbito, interesse dos investidores asiáticos. Basta que sigamos os passos do fundo Apollo Global Management, do Apax, da Amil e do grupo UnitedHealth, e outros que, trazidos por estes ou não, venham a investir no nosso país.
E poder-se-ia dizer… e por último. Mas não. Para muitos, deveria mesmo ser a primeira das opções. Regressamos à nossa língua e o sotaque que se junta só lhe acrescenta força, garra e determinação. Assim é definida a empresária angolana Isabel dos Santos. Os investimentos proliferam, são diversificados e a “sorte” pode mesmo vir a proteger a audaz.
A concretizar-se qualquer um destes cenários, com qualquer um dos candidatos a assumir o papel de novo DDT, tudo, ou quase tudo, pode mudar. Ou não. Os portugueses vão apenas continuar a desconhecer os meandros dos grandes negócios, os verdadeiros interesses que os sustentam, os critérios de escolha dos protagonistas e seus parceiros, e o quanto os verdadeiros interesses de Portugal estarão salvaguardados nesta nova era.
Ah, mas saberemos como se chama.

Amorim energia
Empresário português, nascido a 21 de julho de 1934, construiu o seu império com base na cortiça, no cenário de uma empresa familiar. Com os irmãos, fundou a Corticeira Amorim e mais tarde cria a holding Amorim – Investimentos e Participações, que lhe permite estender os investimentos aos mais diversos setores. No Alentejo, concentra a aposta na cortiça e no Douro desenvolve atividades turísticas, vitivinícolas e agrícolas. Aliás, agricultura é a mais recente aposta de investimento em Moçambique, na região da Zambézia. Em 1981, iniciou-se na área financeira, como acionista fundador da SPI (hoje BPI) e em 2005, o grupo foi acionista fundador do Banco BIC em Angola. Em Moçambique lançou em 2011, o Banco Único. E tornou-se recentemente acionista do Banco Luso Brasileiro. No setor energético, o grupo detém a maioria do capital social da Amorim Energia, que, por sua vez, detém uma participação de 38,34% na Galp Energia (com investimentos o Brasil, Moçambique e em Angola). Por último, o imobiliário. Existem, em diferentes fases de desenvolvimento, investimentos no Brasil, Angola e em Portugal.

Sonae SGPS
Em 1965, na qualidade de aluno prestigiado na Faculdade de Engenharia, foi convidado a ingressar como diretor de Investigação e Desenvolvimento na Sonae (Sociedade Nacional de Estratificados. Pequena empresa em dificuldades que fabricava laminados decorativos, onde viria a colocar em prática a teoria de Schumpeter (a destruição criativa) e que estaria na base de vários dos seus projetos. E que espelha a ousadia e caráter empreendedor que tão bem o definem. Mais tarde, concluída nova etapa de estudo na Harvard Business School, em Boston, conduz a Sonae numa progressão assinalável. Posteriormente, nasce a Holding Sonae Investimentos, SGPS, e dá-se o lançamento da Sonae no mercado de capitais, tornando-se Belmiro de Azevedo o acionista maioritário. Ainda nos anos 80, aposta forte no retalho (1.º Continente), hotelaria, tecnologias de informação, imobiliário (centros comerciais) e na comunicação social (Rádio Nova e Público). Eleva-se entretanto a fasquia no retalho especializado e na internacionalização, e torna-se o maior grupo empresarial e o maior empregador privado português.

Jerónimo Martins
Sabe-se desde setembro de 2013 que renunciará, por razões pessoais, ao cargo de presidente do Conselho de Administração do grupo Jerónimo Martins. Elísio Alexandre Soares dos Santos prepara-se assim para ir para os bastidores de um império que começou a construir em 1955, altura em que ingressou na Unilever, como gestor estagiário. Seguiram-se funções de diretor de marketing da Unilever Brasil e em 1968 passou a integrar o Conselho de Administração do grupo Jerónimo Martins, como administrador delegado. Viria a assumir a presidência da Comissão Executiva, cargo que acumulou com o de presidente do Conselho de Administração, de 1996 a 2004. Desde sempre, todo o seu investimento, seja ele de que natureza for, gravita em torno do grupo. Só em 2013, Soares dos Santos investiu mais de 539 mil euros em títulos da empresa, apesar de manter uma posição residual, de 0,030% do capital social da cotada. O empresário detém assim 190.976 ações da Jerónimo Martins. De entre as suas apostas destaca-se a parceria com Jardim Gonçalves na criação das lojas Expresso Atlântico.

Terra Peregrin
A empresária angolana rotulada pelos media de poderosa e empreendedora tem vindo a revelar um poder tal, que há muito ultrapassou fronteiras e de entre muitos destinos, já chegou a Portugal. Isabel é filha do Presidente da República de Angola e da sua primeira esposa, de origem russa.     Começou a trabalhar em Luanda, no início de 1990, como engenheira gestora de projeto. Aos 24 anos, abriu o Miami Beach Club 20, um dos primeiros clubes da noite na capital. Os negócios de Isabel dos Santos cresceram rapidamente, participando em várias holdings e adquirindo propriedades e participações. A partir de 2008, expandiu as áreas de negócio para a hotelaria, petróleo, diamantes, bancos e telecomunicações. Em Portugal, detém participações, nomeadamente através da Santoro Finance no Banco Português de Investimento e Banco BIC Português, que adquiriu o Banco Português de Negócios, e a cujo Conselho de Administração pertence. Bem como noutras empresas, nomeadamente a Galp Energia e NOS), através da Unitel International Holdings. A corrida à PT é a sua última grande aposta mas sem bons resultados.

China Three Gorges
Os primeiros investidores chineses a dar nas vistas em Portugal. Chegaram em grande e acordaram a opinião pública para a importância que o nosso país parceria estar a ganhar então para os grandes empresários asiáticos. Já a fechar o ano de 2011, em jeito de presente de Natal, a gigante chinesa foi a escolhida pelo Governo português como comprador dos 21,35% da EDP, num valor anunciado de 2,69 mil milhões de euros. O interesse em Portugal parece não ter fim e a CTG viria a ter também presença na REN precisamente através da EDP que detém 5% da rede energética. O grupo deixou desde logo claro que pretende utilizar a elétrica portuguesa para aceder aos mercados europeus e norte-americano. Em contrapartida, ajudará a EDP a implantar-se na Ásia. Apesar de uma mudança de liderança da empresa em março deste ano, o novo responsável, Lu Chun, prontamente garantiu que a CTG é um investidor em Portugal de longo termo e que em nada estava abalada a confiança que depositam no futuro da EDP. Em outubro último, a EDP e a CTG decidiram avançar em conjunto para África e América Latina, para construir barragens.

State Grid Corporation
A aquisição de 25% da REN – Redes Energéticas Nacionais, tornando-se o maior acionista, não deixou o mercado indiferente à chegada dos chineses da State Grid (considerada uma das 10 maiores empresas do mundo) a Portugal em fevereiro de 2012. E para vencer neste processo de privatização a empresa pagou 387 milhões de euros. Na altura, a State Grid fez questão de partilhar publicamente a sua satisfação com a decisão do Conselho de Ministros. E logo no ano seguinte, começavam a surgir resultados desta aposta, nomeadamente com a criação da primeira parceria para o mercado africano, visando a construção da estrutura principal da ligação elétrica entre Tete e Maputo. Outro dos marcos ao nível do investimento, igualmente conjunto, prende-se com um Centro Tecnológico no nosso país, para o qual a empresa chinesa destinou então 12 milhões de euros. nos últimos meses, a State Grid voltou aos jornais nacionais, desta vez, devido ao seu interesse em entrar no capital da Efacec, que pode servir como rampa de lançamento para o mercado europeu. De salientar que a Efacec é já um dos principais fornecedores da REN.

Fosun International Limited
A área dos seguros trouxe o grupo Fosun a Portugal, já em maio deste ano. Mas ao que tudo indica os seus interesses vão muito além deste ramo. Principiou então vencendo o concurso de privatização dos seguros da Caixa Geral de Depósitos, adquirindo 80% da Fidelidade, Multicare e Cares, por mil milhões de euros. Mais tarde, em junho, entra na REN aproveitando que o Estado abria mão de 11% que detinha. Comprou primeiro 3,9% que aumentaria para 4,7%, numa posição avaliada em cerca de 70 milhões de euros. Recentemente, as suas baterias apontaram para a área da saúde, na qual, através da Fidelidade, avançaram para a aquisição de aproximadamente 96% da Espírito Santo Saúde, passando a deter, desde outubro, os hospitais da Luz e de Loures. Mas o grupo Fosun não se ficará por aqui. As mais recentes demonstrações de interesse destinam-se à banca, perfilando-se como possíveis compradores do Novo Banco. E ainda mais recente foi a manifestação de interesse em investir no futuro Terminal de Contentores do Barreiro que também acordou o interesse dos dinamarqueses da Maersk.

Apollo Global Management
Corria o agitado mês de agosto deste ano quando a notícia foi avançada: a Tranquilidade, seguradora do Grupo Espírito Santo, seria comprada pela gestora norte-americana de ativos Apollo Global Management por, mais coisa menos coisa, 50 milhões de euros. A Tranquilidade seria assim vendida à Apollo por menos de um décimo do valor do crédito de 700 milhões de euros que o BES detinha sobre o ESFG e que estava a ser garantido pela seguradora. A Apollo não assumiria a dívida da Tranquilidade, o que justificava o encaixe final para o Novo Banco. E assim a Apollo concretizou a sua primeira vitória já que na primeira abordagem ao território luso as coisas não correram bem. A Apollo também esteve na corrida à privatização das seguradoras da CGD mas perdeu para os chineses da Fosun. Os americanos, com longa tradição em adquirir especialmente dívida nacional, já haviam dado sinais de interesse noutras direções e antes de concretizar este que seria o grande negócio, circulavam rumores de que estariam interessados em comprar ativos do banco Barclays em Portugal e também em Espanha.

UnitedHealth Group
Em Portugal, o gigante da área da saúde em termos mundiais, o UnitedHealth Group que incorpora a Amil, tem seis hospitais e duas clínicas através da Lusíadas Saúde, incluindo o Hospital de Cascais, uma parceria público-privada, onde emprega mais de quatro mil pessoas, incluindo 1300 médicos, enfermeiros e profissionais da área de saúde. Através da AdvanceCare, serve quase um milhão de pessoas em Portugal. A UnitedHealth ficou com rede de unidades que pertencia a Hospitais Privados de Portugal (HPP) após adquirir a brasileira Amil (que, por sua vez, comprara a HPP à Caixa Geral de Depósitos no início de 2013). Entretanto avançou para a Espírito Santo Saúde com uma oferta que viria a ser considerada pelo regulador como fora da corrida, já que foi feita no decorrer da OPA.  Cotada na New York Stock Exchange, o grupo opera através de duas empresas, a UnitedHealthcare e a Optum. Além dos EUA, está presente em mais de 125 países, emprega 160 mil trabalhadores e serve mais de 85 milhões de pessoas. As receitas anuais superam 95 mil milhões de euros e a capitalização bolsista ronda 67 mil milhões de euros.

Altice
A relação do grupo francês com Portugal já tem alguns anos e, até ao momento, passa-se no competitivo universo das telcos. Ainda que os serviços postais já tenham, apesar de timidamente, conseguido captar a sua atenção. Este fundo de investimento com sede no Luxemburgo dedicado às telecomunicações, foi fundado por Patrick Drahi, Bruno Moineville e Armando Pereira (constam no top five dos milionários ligados à internet em França) e o seu primeiro grande negócio em Portugal foi a aquisição da Cabovisão aos canadianos da Cogeco Cable por 45 milhões de euros, em 2012. Em junho de 2013, adquiriu a Oni ao grupo de Manuel Champallimaud por cerca de 80 milhões de euros. Com a aquisição da Oni, a Altice tinha como objetivo aproveitar a licença de acesso de banda larga e convertê-la em licença de quarta geração móvel, integrando-a na oferta de comunicações da Cabovisão. Nas últimas semanas, o grupo virou os holofotes nacionais para si e para a sua intenção de comprar a Portugal Telecom à brasileira Oi, por 7,4 mil milhões de euros. E ao que tudo indica… nesta corrida os franceses já ganharam.

 

Sónia Bexiga

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.