Não restam dúvidas sobre o impacto severo que a atual crise sanitária já está a gerar na economia à escala global. Ao mesmo ritmo que se contabilizam os infetados com o novo coronavírus, e as mortes a lamentar decorrentes da sua doença, surgem as projeções sobre os efeitos que todo este fenómeno gerará ao nível económico, social e político.

O “day after” será duro. Resta saber com que intensidade, mas é certo que estamos perante um desafio nunca antes experimentado e, portanto, para o qual não existe antídoto. Este é dos fortes, que ficará nos compêndios da História.

Por mais que tente desenvolver um modelo concetual sobre a cadeia de contágio na economia, sou surpreendido, ao virar de cada esquina, com o imprevisível. Comecei pelo óbvio: travagem de transmissão do vírus implica restrições severas à circulação de pessoas, pelo que os transportes são os primeiros afetados.

A deslocação de pessoas tem impactos imediatos no setor terciário, com o Turismo à cabeça. No campo das hipóteses, e num cenário otimista, uma quebra de receitas de 90% em três meses do ano, ceteris paribus, traduz-se num potencial de impacto negativo no PIB português de mais de 4% num só ano.

Só por este efeito. Isto, claro, no pressuposto de tudo a correr bem a partir do segundo semestre, e sem um belisco nas empresas, que manteriam a sua capacidade instalada, as suas cadeias de fornecimento e a sua confiança junto dos operadores turísticos internacionais e clientes. (A propósito, quando é que os clientes internacionais voltarão a viajar? Só quando retomarem a confiança).

O setor primário, na agricultura, mantém uma dependência grande de mão-de-obra sazonal importada. Com restrições severas à circulação de pessoas, as colheitas de 2020 poderão estar severamente comprometidas. O setor secundário, da indústria da transformação, de produção de bens transacionáveis tem parte dos seus fornecimentos interrompidos e encomendas canceladas.

Sem transações, não há receita de IVA. Com quebras abruptas no preço dos combustíveis, a receita de imposto cai na mesma proporção. Sem salários, não há IRS. Sem lucros nas empresas, não há IRC. Sem rendimentos, não há capacidade para honrar compromissos. Sem liquidez, os Prazos Médios de Pagamento entre empresas vão degradar-se. Em agonia. Tornando empresas economicamente viáveis em organizações financeiramente asfixiadas. Numa “pandeconomia”. De contágio universal.

Reputados analistas internacionais teorizaram o comportamento das crises. Em “V”, em “W”, em “L” curto, em “L” prolongado, etc. etc. O melhor que nos pode acontecer neste cenário é de que possamos estar no tal “V”. E que seja de Vitória. De uma recuperação acelerada depois de uma acentuada queda.

A última crise económica foi endógena. Isto é, foi provocada no seio da economia mundial com epicentro num comportamento especulativo que se propagou à escala global. Agora, estamos perante o espoletar de uma crise económica de natureza exógena ao sistema económico-financeiro global. Vem de fora do sistema, e por isso não há mecanismos criados para gerar as necessárias defesas no seu corpo.

Por prioridades: primeiro, recorrer a soluções que possam manter os agentes económicos vivos, em atividade. Tirar a febre e manter sinais vitais. Depois desse ânimo, renascerá a esperança.