Segundo dados do Eurostat, a União Europeia é um dos maiores mercados de comércio eletrónico do mundo, registando um crescimento constante nos últimos quinze anos. Hoje em dia, mais de metade dos cidadãos europeus encomenda bens ou serviços pela Internet, aumentando essa percentagem todos os anos. Tal expansão não é estranha dadas as vantagens associadas ao comércio digital. Para além da comodidade de realizar compras sem sair de casa ou num contexto de mobilidade, o mundo online trouxe também uma maior transparência e facilidade de comparação de produtos e preços. Além disso, os pequenos retalhistas passaram ainda a ter acesso a um universo maior de clientes colocando os seus produtos em mercados online, como a Amazon ou o eBay, proporcionando igualmente mais e melhor escolha aos consumidores.
Nos últimos anos, o contexto geral de entusiasmo com o digital tornou as restrições às vendas online verdadeiros sacrilégios, olhando-se para as regras de defesa da concorrência como ferramentas para as travar. As empresas que pretendessem adotar políticas de distribuição que passassem por limitar em certa medida vendas online teriam que assumir algum nível de risco de infração às normas de concorrência. Dos reguladores de concorrência na UE esperava-se também determinação a respeito desta matéria, sendo que em alguns Estados-membros, em especial na Alemanha, a abordagem relativa a este tema tem sido bastante restritiva.
Todavia, num acórdão do final de 2017, o Tribunal de Justiça da UE trouxe uma importante clarificação (e bom senso) quanto a este assunto, esclarecendo que determinadas restrições a vendas online não são necessariamente proibidas. O caso envolveu um fabricante de produtos de luxo que impediu os seus distribuidores de utilizarem mercados online para a revenda dos produtos, receando que a imagem de luxo da marca fosse prejudicada. Chamado a responder se tal comportamento é ou não legítimo na perspetiva das normas de concorrência, o Tribunal disse não apenas que tal proibição é lícita (em certas circunstâncias), mas foi ainda mais longe ao abrir a porta para que se defenda que existe uma presunção de legalidade para fabricantes de quaisquer outros produtos desde que abaixo de determinada dimensão de quota de mercado.
A clarificação do Tribunal de Justiça é bem-vinda. Por um lado, transpõe para o mundo online regras que já eram válidas no mundo offline quanto a produtos de luxo. Por outro lado, permite à maior parte (os que não excedem uma dada dimensão) dos fabricantes de outros produtos ter uma palavra a dizer quanto à venda dos seus produtos em mercados online, o que se afigura razoável e é provavelmente desejado pelos próprios em função das suas estratégias para estes canais. Por fim, aumenta a segurança jurídica das empresas, sendo esta, porventura, a melhor ajuda que a política de concorrência pode dar para estimular o comércio eletrónico.