Há décadas que não está na moda, mas não deixou de ter razão. Milton Friedman ficava com comichões só de ouvir falar em subsídios. Na época, falava-se sobretudo da necessidade de subsidiar a agricultura, para beneficiar os lavradores, as pequenas e médias empresas e, naturalmente, os consumidores. Com uma análise contraintuitiva, mas laminar, Friedman demonstrou que esses ditos benefícios apenas iriam resultar, a prazo, na ruína dos supostos beneficiados.

Apesar das eventuais boas intenções de quem os defende, os subsídios introduzem uma distorção no mercado. Na medida em que incentivam artificialmente determinado setor, podem gerar excesso de produção, baixando ilusória e temporariamente os preços.

Para manter os preços baixos, os Estados (ou Superestados, no caso da União Europeia) têm de continuar a intervir, fomentando a subsidiodependência. Uma vez criado um setor subsídio-dependente, logo se instala um sistema burocrático e regulatório, permeável a lóbis. Quem beneficia desse sistema são os grandes produtores, naturalmente, pois têm mais facilidade em cumprir as normas vigentes e influenciar, por meio do lobbying, políticas a seu favor.

Este processo costuma ter várias consequências. Por um lado, tende a reduzir a eficiência e a inovação. Quem tem apoios garantidos e domina o mercado, até que ponto precisa de ser eficiente e inovador? Por outro, aumenta os preços, tanto a curto como a longo prazo. A curto prazo porque o subsídio é, em si mesmo, um preço que o consumidor paga à partida, enquanto contribuinte. A longo prazo porque a ausência de competitividade, eficiência e inovação tende, mais cedo ou mais tarde, a refletir-se no preço.

Milton Friedman deu todos estes argumentos, na década de 80, relativamente ao setor agrícola. Coincidência ou não, quase tudo o que predisse veio a acontecer. Hoje, penso que o mesmo se pode aplicar ao setor dos Carros Elétricos (EV) – incluindo os híbridos. Trata-se de um dos setores mais subsidiados na atualidade. Quanto às consequências, parecem-me visíveis. A China já tem de conviver com autênticos cemitérios de carros elétricos (EV), dado ao excesso de produção. E agora, o que fazer com esse desperdício? Temos noção de que as baterias dos EV são uma dor de cabeça para reciclar?

Uma coisa é certa, os EV estão a dar cabo da restante indústria automóvel. E o problema é que tudo isto sucede de forma artificial, por meio de distorções do mercado. Reparemos: temos a isenção de tributação autónoma até ao valor de aquisição de 62.500 euros; a dedução total do IVA referente à aquisição e a consumos energéticos, entre outros incentivos que rebentam com qualquer concorrência.

Claro está que alguns ficarão delirantes com esta distorção, enquanto se pavoneiam no seu novo Tesla, adquirido ao preço de um Megane (ou coisa que o valha). Para os moralistas, apenas tenho uma pergunta: quantas dessas baterias são provenientes da exploração de trabalho infantil no Congo?

Quanto aos não moralistas, com quem sinceramente prefiro falar, aqui lhes deixo outras interrogações. Como tem evoluído e evoluirá a relação entre pontos de carregamento e o aumento de condutores de EV? Qual será o custo da eletricidade de um carregador rápido nos postos de abastecimento, ou até em casa, a médio e longo prazo? Por fim, relembro-vos que metade do preço de um litro de gasolina é imposto. E também disto vive o Estado. Quando a vasta maioria dos veículos forem EV, acham mesmo que os incentivos continuarão a existir?

Os pavões de hoje exibem os seus Teslas como se fossem os patos-bravos de ontem. Mas, ao contrário destes, são escravos do crédito e não têm dinheiro para mandar cantar um cego. Apenas têm um EV de topo, altamente subsidiado, para disfarçar a sua indigência. Que farão com ele, quando a realidade lhes cair em cima?

Enfim, nada tenho contra a inovação. Menos ainda contra a renovação energética que o mundo evidentemente precisa. Só não suporto distorções do mercado. Numa palavra: ‘comichões’. Não consigo evitar as comichões de Friedman sempre que me falam em subsídios.