Mal foi decretado o estado de emergência e as pessoas tiveram de se recolher em casa houve alertas de que a pobreza e as desigualdades iriam aumentar, e muito.

Agora já começam a surgir dados que dão conta do impacto social da crise pandémica, como a infografia do Observatório da Luta contra a pobreza na cidade de Lisboa. De acordo com os dados, os desempregados inscritos nos centros de emprego da capital aumentaram 17,3% e em Portugal 14,9%, entre 31 de março e 30 de abril de 2020.

Se compararmos os dados de março de 2019 com os de um ano antes descobrimos que o número de desempregados inscritos nos centros de emprego em Lisboa aumentou 46,6% e que o número de ofertas de emprego caiu 60,5%. Já os despedimentos coletivos na capital aumentaram 116,8% comparando o mesmo trimestre de 2019 com o de 2020, e 8,4% das empresas do distrito de Lisboa pediram lay-off.

A crise social criada pela pandemia é muito diferente das outras pela velocidade e pelo modo desigual como afectou as pessoas.

A crise financeira de 2008 tornou-se uma crise económica e depois social com o nível de desemprego a atingir o máximo histórico de 17,8%. A crise da Covid-19 é diferente, pois de crise sanitária tornou-se imediatamente económica e social, com milhares de pessoas a entrarem a em lay-off, a serem despedidas ou a perderem toda a sua atividade de uma semana para a outra. Os efeitos da crise podem durar meses ou anos e poderão dar lugar a uma crise financeira se a União Europeia falhar na sua ação.

Já sobre a desigualdade desta crise há dois fatores a ter em conta. Em primeiro lugar, e muito mais do que na crise da troika, os trabalhadores informais foram os que sentiram primeiro e com mais intensidade esta crise. Durante o período da troika, muitas pessoas perderam o emprego mas refugiaram-se em trabalhos informais, em ‘biscates’. Com a crise da Covid-19 não houve escapatória e quanto mais reduzida for a relação com o trabalho formal, mais afetada é a pessoa.

Isso traz ao de cima um segundo fator de desigualdade. Portugal foi dividido em três grandes grupos: as pessoas que mantiveram o trabalho e foram enviadas para teletrabalho durante umas semanas/meses; as pessoas que entraram em lay-off, perderam parte do seu rendimento e temem pelo seu emprego; e as pessoas que estavam a recibos verdes ou no trabalho informal. Estes três grupos sofreram o impacto de crise de maneira diferente e vão beneficiar da recuperação a velocidades diferentes. Quem estava mal pode ficar ainda pior.

Por isso é que foi tão importante que, na passada semana, o Parlamento tenha aprovado uma prestação social inédita que é o subsídio extraordinário de desemprego e de cessação de atividade, aplicável a trabalhadores por conta de outrem, trabalhadores independentes e trabalhadores informais excluídos de outros apoios.

É um novo apoio extraordinário que abrange pessoas que não têm descontos suficientes para aceder ao subsídio de desemprego, para os trabalhadores independentes, para as trabalhadoras do serviço doméstico, para advogados que tenham perdido a atividade e mesmo para os trabalhadores informais (link para explicação do deputado José Soeiro).

Esta nova prestação foi aprovada sem os votos do Partido Socialista, o que levou Paulo Pedroso, ex-ministro do Trabalho e da Solidariedade, a escrever no Facebook: “Fico surpreendido por o PS, que criou o Rendimento Mínimo Garantido, ter estado contra tal medida até ao fim, aparentemente convencido de que a desproteção social de alguns setores em situação de pandemia não carece de novas respostas ou de que o «buraco» que esta medida pode tapar não existe, não é relevante ou não merece atenção. Mas existe e os desempregados são o grupo mais pobre em Portugal.”

Finalmente, se esta crise social é diferente é preciso termos novos mecanismos para a enfrentar, por isso, o Orçamento Suplementar apresentado pelo Governo na passada semana precisa de ir ao encontro do que têm defendido os especialistas em pobreza e desigualdades, com a facilitação do acesso aos apoios sociais. Não podemos deixar que a pandemia agrave a pobreza e as desigualdades em Portugal.