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Como é que as mulheres ganham menos do que os homens? Os salários não são iguais?

Entre a espuma dos dias, a enunciação de princípios de igualdade entre mulheres e homens e uma análise aprofundada das causas da desigualdade e da discriminação, há um campo de trabalho técnico-científico que é fundamental mobilizar na construção e implementação da legislação e na informação da opinião pública em matérias de (des)igualdade em razão do sexo.
1 Agosto 2018, 09h10

Da mesma forma que a persistente desigualdade esbarra no argumento de um quadro legal que garante o direito à igualdade, também frequentemente a evidência estatística de as mulheres ganharem em média menos 15,75% do que os homens e quase menos 30% nos quadros superiores esbarra com este primado do senso comum – mas como é que é possível, “se não é permitido por lei existirem salários diferentes em razão do sexo”?

Entre a espuma dos dias, a enunciação de princípios de igualdade entre mulheres e homens e uma análise aprofundada das causas da desigualdade e da discriminação, há um campo de trabalho técnico-científico que é fundamental mobilizar na construção e implementação da legislação e na informação da opinião pública em matérias de (des)igualdade em razão do sexo.

No caso das discriminações salariais, o exemplo do trabalho feito pelos parceiros sociais é de importância vital. Por isso, no processo de elaboração da Proposta de Lei n.º 106/XIII que o Governo apresentou à Assembleia da República e esta aprovou no passado dia 18 de julho, tivemos várias reuniões com a equipa da FESETE de forma a conhecer o estudo que realizaram e que esteve na base do contrato coletivo de trabalho (CCT) concluído em abril de 2017. Este CCT foi considerado histórico porque conducente à “eliminação das desigualdades salariais no setor” entre trabalhadoras e trabalhadores que exercem o mesmo tipo de funções, reestruturando a grelha salarial respetiva e aumentando as remunerações em média 3,45%.

 

Entre a espuma dos dias, a enunciação de princípios de igualdade entre mulheres e homens e uma análise aprofundada das causas da desigualdade e da discriminação, há um campo de trabalho técnico-científico que é fundamental mobilizar na construção e implementação da legislação e na informação da opinião pública em matérias de (des)igualdade em razão do sexo.

 

Sabemos que as disparidades salariais radicam frequentemente na forma como as funções são valorizadas e classificadas, ocultando o que é afinal trabalho de valor igual (aquele que, sendo diferente no seu conteúdo, tem o mesmo valor) mas classificado e remunerado de forma diferente. Lembremos o conhecido caso do Acordo Coletivo de Trabalho do Setor da Cortiça de 2008 que reconheceu a existência de categorias profissionais para homens e para mulheres, com conteúdos funcionais iguais mas remunerações diferentes, as quais deveriam ser eliminadas progressivamente.

Neste contexto, o estudo do setor do calçado, que referi anteriormente, fez uma avaliação aprofundada dos conteúdos funcionais das categorias profissionais, concluindo que muitas categorias com o mesmo valor se posicionavam em níveis diferentes da grelha salarial, estando as categorias predominantemente femininas na base dessa grelha. Este conhecimento foi fundamental para valorizar a representação social das profissões e garantir maior objetividade dos processos de gestão de recursos humanos e da organização do trabalho.

Reconhecendo a importância deste exercício, a lei agora aprovada estabelece a obrigação de as empresas basearem as suas políticas remuneratórias na avaliação das componentes das funções, com base em critérios objetivos, comuns a mulheres e homens. Esta obrigação alicerça os demais mecanismos definidos no diploma, quer em termos do plano de avaliação das diferenças remuneratórias que pode ser exigido às empresas, quer em termos da informação que estas devem prestar à Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), quando notificadas para esse efeito.

Importa ainda referir que fomos beber também à lei alemã a consagração do direito dos/as trabalhadores/as solicitarem que sejam analisadas, neste caso pela CITE, potenciais situações de discriminação salarial em relação a trabalhadores/as do outro sexo, devendo a entidade empregadora demonstrar a sua política remuneratória e os critérios usados para o cálculo das remunerações em causa.

 

Esta lei atua diretamente ao nível da efetivação do princípio do salário igual para trabalho igual e de valor igual. Com o mesmo empenho, estamos a trabalhar em respostas integradas na definição de medidas articuladas quer ao nível da segregação sexual das profissões, da representação equilibrada de mulheres e de homens na tomada de decisão, bem como ao nível da parentalidade e da conciliação da vida profissional, familiar e pessoal.

 

A nossa lei é assim mais avançada do que os regimes que existem em outros países, quer porque não se fica por exigir às empresas relatórios, quer porque permite identificar as causas menos visíveis associadas à diferente classificação de funções só por se considerarem que são de mulheres ou de homens.

Não esquecemos, contudo, que são várias as dimensões associadas ao fenómeno da desigualdade salarial, que merece, por isso, uma resposta igualmente multifacetada, mas sempre direcionada. Esta lei atua diretamente ao nível da efetivação do princípio do salário igual para trabalho igual e de valor igual. Com o mesmo empenho, estamos a trabalhar em respostas integradas na definição de medidas articuladas quer ao nível da segregação sexual das profissões, da representação equilibrada de mulheres e de homens na tomada de decisão, bem como ao nível da parentalidade e da conciliação da vida profissional, familiar e pessoal.

Esta lei é um passo histórico e transformativo na correção de uma situação de desvantagem que afeta as mulheres de forma estrutural, com repercussões gravosas ao longo das suas vidas e com impactos sociais e económicos evidentes. É, por isso, com grande satisfação e expetativa que a vejo agora aprovada, criando mecanismos que tornam a proibição de discriminação salarial efetiva e concretizando, dessa forma, direitos fundamentais que são condição de realização da dignidade de cada pessoa, de cada mulher e de cada homem.

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