As obras de artes plásticas produzidas em Luanda procuram capturar o espírito do seu tempo e reflectir sobre o estado de alma e do real, através de múltiplos sentidos e diversas sensibilidades, partindo de uma homenagem do livro Como Se o Mundo Não Tivesse Leste de Ruy Duarte de Carvalho.
Hoje não se pode reduzir uma análise social e política sobre a realidade angolana apenas ao discurso radiofónico ou televisivo, excluindo desta equação as artes plásticas. Porque é através das artes plásticas onde se encontra, talvez, a melhor forma de mostrar como uma juventude expressa a sua perspectiva sobre os valores essenciais de uma vida colectiva, através da singularidade.
Por exemplo, os dois quadros de Denise Luís expressam a necessidade de exaltação da e clamor pela liberdade, visto que a autora sobrepõe na sua obra “Vulcão” a estátua da liberdade com uma figura africana, sendo uma clara ascensão do grito de liberdade. No segundo quadro, o trompete faz ressoar a “song of freedom” (título da obra), fazendo recordar a clássica música Stimela do trompetista Hugh Masekela (1939-2018), que ecoou como um grito de liberdade contra o regime do Apartheid.
Eliane Lima, por sua vez, traz na sua arte a inquietação da condição do corpo negro e feminino na sociedade angolana, machista, onde muitas mulheres são, ainda, vítimas das imposturas violentas masculinas. A autora retrata dois corpos negros femininos em duas situações distintas. No primeiro quadro retrata o corpo despido de uma mulher de costas que reclama pela “Descolonização da mente” (título escolhido) e já no segundo, de título “Espíritos raivosos”, duas mãos abrem a boca de uma figura humana, permitindo que esta grite ou expresse a sua raiva.
Estes jovens não se ficam apenas por abordagens realistas, tendo como pano de fundo a vida em Luanda, surgindo, também, concepções artísticas novas e arrojadas, como as propostas de Ainid Clélia, com o seu quadro abstracto intitulado de “Transição Escondida”, através da mistura de cores e tons suspende-se a percepção da realidade, o que nos obriga a uma interpretação para além do real. Por outro lado, Imanni da Silva construiu um quadro enigmático constituído por objectos que visam dar corpo a um rosto fragmentado por segmentos, mas, ao mesmo tempo, desfragmentando o rosto e deixando ao critério de quem vê os limites e configurações reais do rosto representado.
Mais arrojado e fazendo uso de uma técnica de reutilização de material, precisamente grelhas de frigoríficos, é o trabalho de Muamby Wassaky, composto por três peças (Máscaras Tecnológicas I, II e III). O autor coloca-nos perante a questão ambiental numa cidade com mais de nove milhões de habitantes, onde o saneamento básico é inexistente. Obrigando-nos, igualmente, a encarar o resultado do nosso consumismo desenfreado na era moderna. Wassaky revela uma veia artística mais conceptual e insere-se na concepção dos Readymades (impulsionada pelo génio criativo Marcel Duchamp).
Não entrando num campo conceptual inovador ou de elevação da estética como um território de afirmação artística, Uófole reafirma a sua marca africana ao utilizar como nome artístico a língua Wolof (falada no Senegal, Gâmbia, Guiné-Bissau, Mali, Mauritânia e Maurícia). Talvez por isso retrate dois rostos negros em tons escuros e pontos negros, o que impede a precisão nítida das imagens. Evocando, assim, a estética do belo negro, através das “O ahatu aloloka I e II”. Benigno Tengo traz-nos o sorriso alegre, feliz e leve das multiplicidades de cores quentes nas suas inevitáveis telas “Fervilhem os desertos…” e os “Nadadores do Sol”, transmitindo-nos esperança deste eterno amanhã que tarda em surgir em África.