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Eleições à vista: Confiança ao Governo com chumbo pré-anunciado

Nem Luís Montenegro retirará a moção de confiança, nem Pedro Nuno Santos alterará o voto de rejeição. Debate desta terça-feira não trará qualquer milagre que impeça o Governo de cair, um ano depois das eleições legislativas que permitiram à Aliança Democrática chegar ao poder.
O primeiro-ministro, Luis Montenegro, à chegada para a sessão plenária de discussão do programa de Governo, na Assembleia da República, em Lisboa, 11 de abril de 2024. JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA
11 Março 2025, 07h00

Ninguém cede. Apesar dos apelos para o arrefecer dos ânimos depois de semanas vertiginosas na política nacional na sequência da polémica que envolve a empresa familiar do primeiro-ministro, não haverá surpresas esta terça-feira: a moção de confiança apresentada pelo Governo vai ser rejeitada no Parlamento, ditando a queda do executivo da Aliança Democrática (PSD/CDS) e a consequente convocação de eleições antecipadas que deverão ser marcadas entre 11 e 18 de maio, segundo cálculos do Presidente da República.

O Partido Socialista (PS), que não desiste da comissão parlamentar de inquérito (CPI), não muda de posição e vai votar contra a moção de confiança apresentada pelo Governo, a que se soma o chumbo da parte do Chega. Se havia esperança de que o PS reconsiderasse, Pedro Nuno Santos matou-as na entrevista à SIC na véspera da votação. “Não podemos voltar atrás”, disse, acrescentando que “seria impensável” agir de forma diferente daquilo que tem vindo a dizer. Pedro Nuno Santos acusa o primeiro-ministro de avançar para a moção de confiança sabendo de antemão que seria rejeitada, concluindo que a moção de confiança é, na realidade, um “pedido cobarde de demissão do primeiro-ministro”.

Luís Montenegro, a quem o secretário-geral do PS apelou a que retirasse a moção, também não mexe uma vírgula e acentua que a votação desta terça-feira é “a última oportunidade” dos socialistas assumirem a sua responsabilidade. Em entrevista à TVI/CNN, o chefe do Governo disse não se demitir por não ver razões para isso, atestou que será candidato a primeiro-ministro, mesmo que venha a ser arguido, e rematou que “não faz sentido” retirar a moção de confiança. Ora, se nenhum dos dois protagonistas recua, o cenário de eleições antecipadas é inevitável.

O único partido, além dos que formam a AD, a dar a mão ao Governo será a Iniciativa Liberal. Fá-lo não por ter confiança no executivo mas por entender que este é o momento de colocar os interesses partidários e pessoais à frente dos interesses do país. “Esta era a altura de dizer ‘que se lixem as eleições’ e governar”, posicionaram-se os liberais. O voto ficará para a história mas não alterará o destino já traçado.

Depois de chumbada no Parlamento, o Presidente da República deverá ouvir os partidos em Belém na quarta-feira, seguindo-se depois o Conselho de Estado, devendo dissolver o Parlamento e convocar eleições antecipadas pela terceira vez em três anos.

Nos últimos dias, várias foram as vozes a apelar no sentido de um recuo nas posições. Do lado do Governo, o ministro Castro Almeida deu o mote, ao admitir que a moção de confiança poderia ser retirada, mas se cumpridos alguns passos: “Acho que se o PS vier declarar que reconhece ao Governo condições para executar o seu programa, se declarar que se considera satisfeito com os esclarecimentos dados e que retira a Comissão Parlamentar de Inquérito, acho que há condições para a moção de confiança poder ser retirada”, disse o ministro da Coesão Territorial ao Observador, acentuando que o PSD irá a eleições “a contragosto”.

Responsabilizar a oposição, em particular o PS, pela crise e pelas eleições antecipadas tem sido, aliás, a estratégia adotada pelo Governo. Miguel Pinto Luz, ministro das Infraestruturas, seguiu o mesmo guião nas declarações que fez no fim de semana. “A estabilidade necessária à governação responsável está, nesta altura, nas mãos única e exclusivamente do PS. Terça-feira há uma votação de uma moção de confiança ao Governo na Assembleia da República. O único responsável pela necessidade de o país ser chamado mais uma vez a eleições é e será única e exclusivamente do PS e do seu líder. Deixem-nos governar, é o apelo que hoje o PSD faz”, acentuou o governante.

Apelos ao bom senso

Fora do Governo, outras vozes se levantaram para pressionar o PS. António Capucho, fundador do PSD e antigo conselheiro de Estado, manifestou, em declarações ao Jornal Económico (JE) na véspera da votação da confiança ao Governo, ter “esperança” que o principal partido da oposição se abstenha e segure o Executivo chefiado por Luís Montenegro a bem do “interesse do país”. Era, no entender do antigo governante social-democrata, a postura “lógica” e mais “inteligente” que Pedro Nuno Santos tomaria neste contexto. Se inviabilizar a moção de confiança, o PS será “penalizado” nas urnas, prevê o antigo autarca de Cascais. Assumindo que o Governo também poderia retirar a moção de confiança – “não vejo problema nenhum nisso”-, António Capucho coloca a tónica no PS.

Carlos Moedas, presidente da Câmara de Lisboa, pediu responsabilidade a toda a classe política mas dirigiu um apelo em particular ao PS: “Não façam cair o Governo, ninguém no país quer eleições”. Antes destas declarações, o autarca tinha manifestado ainda ter esperança que Marcelo pudesse ter uma intervenção na crise de modo a evitar que o país fosse a eleições um ano depois do último sufrágio.

Esperançoso também se revelou Luís Marques Mendes, candidato presidencial. O antigo comentador da SIC sugeriu até um guia com “três diligências” para solucionar a crise. A primeira das quais passaria por assegurar que o primeiro-ministro se compromete a “responder por escrito e à comunicação social a dúvidas que alguns ainda têm relativamente às questões que têm vindo a ser discutidas” sobre a empresa da sua família. “Segundo, um compromisso do PS que, na sequência disso, retiraria a sua proposta de criação de uma comissão de inquérito. E, finalmente, o compromisso do Governo de que, na sequência de tudo isso, retiraria também a sua moção de confiança”. Ora, nada disso foi possível até agora e, avizinha-se cada vez menos provável que possa acontecer.

Fora do campo político do PSD, António José Seguro, antigo secretário-geral do PS e potencial candidato a Belém, assinalou que havia “condições” até ao dia de hoje para se evitar o cenário das eleições. “O dia 11 de março poderá ficar na história do nosso país como um momento triste ou como um momento em que os partidos foram capazes de pôr acima dos seus interesses o interesse nacional”, disse Seguro em declarações aos jornalistas na última sexta-feira.

António Vitorino, outro dos possíveis candidatos da ala socialista às Presidenciais do próximo ano, pediu bom senso, dizendo preocupar-se mais com “o dia a seguir às eleições”. “As eleições são formas legítimas de resolver situações de impasse. Cabe aos protagonistas políticos definirem quais são as regras do jogo”, limitou-se a dizer.

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