Os termos que fazem o título deste artigo negam-se mutuamente. Os conservadores são, por princípio, avessos às revoluções, às mudanças bruscas e radicais.

Como a própria expressão que os define indica, os conservadores preferem a conservação à mudança, embora, ao contrário da direita reaccionária, não sejam impermeáveis às alterações que as circunstâncias imponham. Porém, preferem fazê-lo de forma gradual e selectiva, mudando apenas o necessário quando necessário.

O governo de Boris Johnson, pelo contrário, tem posto reiteradamente em causa este desígnio de conservação. No seu primeiro exercício como primeiro-ministro, na sequência da eleição como líder do Partido Conservador, Johnson entrou em conflito aberto com o Parlamento, que ilegalmente mandou encerrar, persuadindo a rainha a promulgar esta decisão. De uma assentada, desrespeitou dois órgãos de soberania, silenciando um e induzindo o outro a sancionar uma violação da constituição não escrita do Reino Unido.

Desta forma, traiu o respeito quase reverencial que os conservadores britânicos devotam às suas instituições e práticas políticas, secularmente consensualizadas e das quais se orgulham de ser os mais fiéis mantenedores. Desde a sua tomada de posse, após a vitória eleitoral de Dezembro passado, o executivo conservador manteve a conduta de ruptura com a forma tradicional de fazer política em terras de Sua Majestade.

Revelando uma obsessão concentracionista, desrespeitadora da autonomia dos ministros, o gabinete do primeiro-ministro precipitou a demissão do ministro das Finanças, instado a prescindir de todos os assessores por si nomeados e a substituí-los por gente da confiança do chefe do Governo, o que para Sajid David, terá sido a gota de água, pois, meses antes, uma sua assessora, Sonia Khan, fora expulsa do nº 10 de Downing Street acompanhada pela polícia, por ordem do guru de Johnson, o sinistro Dominic Cummings.

No melhor estilo de Donald Trump, certos briefings do gabinete do primeiro-ministro passaram a ser feitos apenas com a presença de jornalistas criteriosamente seleccionados, o que motivou o boicote pelos convidados a tais sessões de pretensos esclarecimentos, por constituir tal decisão uma violação ao livre acesso à informação sem precedentes num país que justificadamente se orgulha da sua imprensa livre.

Depois do ataque à dignidade da soberana e da Câmara dos Comuns, o governo de Johnson aponta agora as baterias a outra instituição nacional: os funcionários públicos. Sir Philip Rutnam, um alto funcionário público com mais de três décadas de serviço, demitiu-se em conflito com a ministra do Interior, Priti Patel, que acusa de assédio moral e de destrato dos funcionários do ministério. Aliás, parece ser intenção do governo prescindir da colaboração deste escol de funcionários, substituindo-os por personagens bizarras, como Andrew Sabisky, um jovem da predilecção de Cummings, que se demitiu depois de denunciadas as suas opiniões eugénicas, social e etnicamente racistas.

Desfiado este rol de proezas, uma coisa parece certa: o governo de Boris Johnson não é conservador. Será outra coisa qualquer, ainda não definida, que os cientistas políticos, a seu tempo, se encarregarão de categorizar.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.