Dois catalisadores específicos explicam o recente pico de violência no longo confronto israelo-árabe: o ataque israelita de 7 de maio ao complexo da mesquita Al-Aqsa e a expulsão de famílias palestinianas do bairro de Sheikh Jarrah, em Jerusalém Oriental.

A ação provocatória no pátio das mesquitas insere-se na reivindicação (por enquanto simbólica) daquele espaço como território de Israel, em vez de um local religioso universal. A colonização de território palestiniano insere-se na mesma lógica do primeiro. O Hamas respondeu a estes atos hostis atacando as principais cidades de Israel com mísseis.

Numa situação política periclitante, estes acontecimentos foram extremamente úteis para o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. Ocorreram exatamente no momento em que estava em curso a constituição de uma coligação parlamentar para o destituir. A eclosão das hostilidades torpedeou o acordo da coligação, salvando-o por uma unha negra. Os acontecimentos de maio vieram pôr a nu algumas realidades difíceis de escamotear.

Em primeiro lugar, a falta de esperança do povo palestiniano e as condições humilhantes em que vive em Gaza, Cisjordânia, Jerusalém Oriental e até mesmo em Israel. Em segundo lugar, a completa irrelevância política e militar da Fatah, deixando ao Hamas a liderança da resistência palestiniana, que utilizou estes acontecimentos para se afirmar como a vanguarda política dos palestinianos.

A Fatah foi completamente ignorada nos esforços de mediação internacional e regional que passados 11 dias levaram a uma trégua. Pairam nuvens negras sobre o seu futuro, dadas as lutas intestinas que a dilaceram. A concretizar-se a liderança do movimento palestiniano nas mãos de um movimento radical, será muito difícil congregar apoios internacionais para a sua causa.

Em terceiro lugar, a precariedade da solução dos dois estados com um número de aderentes, dos dois lados da barricada, cada vez menor. Pouco a pouco, os israelitas foram colonizando os territórios palestinianos, e expulsando os habitantes árabes das suas terras e das suas casas, impossibilitando a criação de um Estado palestiniano viável. Sheikh Jarrah foi apenas mais um episódio.

Muitos palestinianos descrentes na fracassada solução dos dois estados questionam-se sobre novas soluções a abraçar. Aumenta o número dos que defendem, em alternativa aos dois estados, a solução de um estado, que inclua israelitas e os palestinianos dos territórios ocupados. Há ainda um longo caminho a percorrer para que esta solução possa vir a prevalecer.

Em quarto lugar, reconhecer que a causa palestiniana não está morta. Tinha perdido muita importância com o acordo de Abraão, assinado em agosto de 2020, ao aproximar Telavive de capitais árabes sunitas, numa aliança contra o Irão.

A oposição generalizada da “rua árabe” ao abandono da causa palestina, não inibiu os Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Marrocos e Sudão de assinarem acordos de normalização de relações com Israel. Para aquele reconhecimento muito terá contribuído o uso excessivo e desproporcional da força por parte de Israel, que ao provocar um elevado número de baixas entre civis na faixa de Gaza desencadeou uma condenação internacional generalizada.

Ao contrário do que alguns esperavam, ainda não foi desta vez que a causa palestiniana será varrida para debaixo dos tapetes da história.