Um dos problemas em atribuir um valor às medidas de prevenção das mudanças climáticas é a dificuldade em quem responsabilizar pelos investimentos necessários. As emissões de carbono por unidade de PIB são o que traduz os resultados, mas, infelizmente, ainda é apenas em euros do PIB que se mede o efeito.
Hoje, em Portugal, como na maioria dos países, a exigência de soluções estratégicas para o problema das mudanças climáticas e a responsabilidade de reporte nacional de emissões, recai sobre o Ministério do Ambiente. Um pormenor que dificulta bastante estas tarefas é a unidade de contagem utilizada, que se faz usualmente por “toneladas de carbono equivalente”, três palavrões quase só reconhecidos pelos entendidos na área. A título de exemplo, Portugal tem como meta para 2020/2030 cerca de 18% a 23% de redução das emissões de gases com efeito de estufa, face a 2005, ou… de 68-72 Mt CO2e, isto é, megatoneladas de dióxido de carbono equivalente(!).
As áreas responsáveis por estas toneladas de emissões constituem outra dificuldade. Num país típico estão distribuídas pela ‘energia’, que em Portugal corresponde a 69% do total das emissões, e inclui a geração de eletricidade e o uso dos transportes; pelas florestas, que tanto emitem como absorvem emissões; pela agricultura e pecuária (9% em Portugal); por alguns processos industriais (como a produção de cimento, de ferro e aço, com 11% em Portugal); e ainda pela gestão de resíduos (últimos 11% em Portugal). São, como se vê, setores que cobrem toda a atividade económica, e não só.
De facto, a dificuldade surge quando tentamos ligar estes valores às contas nacionais, medidas em Euros e em percentagem do Produto Interno Bruto, e apenas para os 4 ou 10 anos seguintes. É um dilema no qual não só os economistas das áreas do ambiente e da energia se deviam rever, mas sim toda a área da economia, gestão e direito, para não dizer mais. Veja-se, por exemplo, que a produção de eletricidade tem tempos de vida muito elevados (25 anos para um parque eólico ou 50 para uma barragem). A gestão florestal tem um contributo para o PIB comparativamente diminuto. E, por fim, o PIB associado aos transportes não tem relação com as emissões da utilização do automóvel. Parece-me assim sempre muito árduo justificar os investimentos em tecnologias, processos ou programas, quando o Sistema Europeu de Contas, que rege a organização do nosso Orçamento do Estado, ainda de verde pouco ou nada tem.
A última faceta do problema que, na minha opinião, agrava a capacidade de gestão climática de um país tem a ver com as tutelas governamentais que lidam com as referidas toneladas de emissões. Em Portugal existe a Comissão Interministerial para o Ar e Alterações Climáticas, transversal aos vários ministérios, mas não é claro o papel dos demais participantes na gestão do “super” Fundo Ambiental, centralizado no Ministério do Ambiente, que disponibilizará 154 milhões de euros em 2017: 32 milhões de euros para projetos como o Plano Piloto da Peneda Gerês (florestas) ou o novo sistema do Andante (transportes), e 15 milhões de euros para a aquisição de veículos elétricos pelos municípios (transportes e governo local), apoio a uma economia circular (economia), sensibilização ambiental (ambiente), entre outras medidas.
Perante uma tal mistura de áreas, unidades, sistemas de controlo, e resultados económicos e ambientais, seria deveras curioso ver os resultados de um Índice Kafka, como há anos houve referências em França, que medisse o esforço necessário para se desenvolver projetos de mitigação e adaptação às mudanças climáticas em áreas adjacentes. Num sentido inverso ao de Portugal, um excelente exemplo é o caso da Colômbia, que conseguiu distribuir as suas medidas de crescimento de baixo carbono pelo vários ministérios, responsabilizando cada um em concreto por determinadas megatoneladas de carbono a reduzir. Eis um país com questões sociais complexas que utiliza o desenvolvimento sustentável em prol da estabilidade e da paz. Às vezes é de onde menos esperamos que surgem as melhores ideias. Poderíamos, em Portugal, começar a trazer estas responsabilidades climáticas, pelo menos, para uma esfera mais transversal como a pasta da Economia. Como já alguém disse: “É fazer as contas.” E, neste caso, contas cruzadas.