«De todos os cantos do mundo

Amo com um amor mais forte e mais profundo

Aquela praia extasiada e nua

Onde me uni ao mar, ao vento e à lua»

(Sophia).

Troca na sucessão de normalidade da animalidade: a maioria dos animais racionais ficaram enjaulados em casa, enquanto os irracionais – com naturalidade e sem brutalidade – puderam “sair à rua”.

Movimentar-se, mais livremente, numa terra que também é sua. E sem a intrusão nos seus habitats; sem a massificação – concentrada e exagerada – de pessoas nos mesmos locais e ao mesmo tempo; sem a confusão geral do ruído humano, vezes sem conta de muita tensão; sem a destruição ambiental causada pela diversa poluição, etc.. Quase tudo mais límpido (mesmo que insuficiente).

É a realidade desta causalidade: nem sempre sobressai nas notícias diárias – oficiais e oficiosas. Para Carl Jung, “a Natureza nunca colocou na boca da maioria das pessoas a questão fatal relativa ao significado das suas vidas”.

Nestes meses, fechámos os olhos – em nós mesmos e dos outros –, num silêncio abrupto. Em 1998, Richard Dawkins escreveu: “depois de dormirmos durante centenas de milhões de séculos abrimos finalmente os olhos num planeta sumptuoso, reluzente de cores, favorável à vida. Dentro de décadas teremos de fechar os olhos outra vez. Não será uma forma nobre e iluminada de passar o nosso breve tempo ao Sol, tentar compreender o universo e como acordámos nele?”.

Eis o início dessa década ‘profetizada’… Abramos os olhos do coração e as janelas da mente à Criação, ao Universo, que espera uma nova Civilização! Já que, “se a Natureza não fosse bela, não valia a pena conhecê-la e não valia a pena viver a vida” (H. Poincaré).

Duas mensagens – por aí disseminadas – (re)marcam esta época: “num instante, o planeta convoca o ser humano a ser humano” e “não estás em casa sem fazer nada. Estás a ajudar a salvar o Mundo!”. Tenhamos a noção disso e a profícua reflexão de não repetir erros do (recente) passado, deitando por terra este modo ecológico de redenção. Em parte já conseguida, através da nossa global contenção e moderação.

Mesmo que inesperada, passiva ou forçada, esta paragem convida à consciencialização na necessária transição para um planeta melhor: mais habitável e mais respirável. Para TODOS os seres vivos! E para nosso bem; que, ao ser nosso, é de todos! Pois a Natureza tanto é “a nossa capela” (Björk), como “uma nuvem mutável” (Ralph W. Emerson). Ou seja, algo “fora do nosso corpo” (B. Adulyadej).

“Somos recebidos pelo suspiro pungente e perfumado da terra estival” (A. Camus), onde os humanos “vivem no reino da alma” – “um território do espírito” (N. Humphrey). Será?

Ora, “por toda a parte e em toda a cúpula do firmamento há uma azul maravilhoso, o Sol irradia um brilho de enxofre pálido e tudo é tão suave e encantador como a associação de amarelos e azuis celestiais num Vermeer de Delft. (…) Sinto-me deslumbrado com o que vejo” (Van Gogh). Ora, “nunca apreciais devidamente o mundo até o próprio Mar vos correr nos veias, até estardes vestidos com o firmamento e coroados com as estrelas: e até perceberdes que sois o único herdeiro de todo o mundo, e mais do que isso, porque nele existem homens, todos eles herdeiros únicos tal como vós” (Traherne).

Gradualmente, a vida das pessoas tenta reerguer-se. Já se veem muitos mais carros na estrada e enchentes nas praias!… Há quem fale “no voltar à normalidade” – mas se aprendemos algo com esta não aleatoriedade –, afinal, o que é isso?! Voltar à anormalidade acima descrita, estragando e estagnando tudo o que a fauna e a flora, os céus e os mares, se encarregaram de (re)fazer durante o choque?

Oh, não! Se for para isso, sintam-se saudades de voltar a ver ruas desaparecidas de carros. A despoluir e poder os pássaros ouvir, sem mais concluir! Com mais pessoas a circular, mesmo distanciadas, a correr, a sorrir e a andar – a pé ou de bicicleta. Sem mais matança na «Casa comum». Não sejamos vítimas nem as façamos mais, nesta andança, porque “o grito da Terra e o grito dos Pobres não aguentam mais!” (Papa Francisco). Sejamos, sim, atuadores de mudança!