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Costa Pinto critica atual administração do Novo Banco e venda da Tranquilidade

João Costa Pinto defende que o relatório, que faz a autópsia da atuação do Banco de Portugal no BES até à resolução, devia ter sido tornado público “há muito tempo”, porque se evitava a “mistificação” do documento. Fernando Negrão anunciou o envio de um recurso ao Supremo para pedir o levantamento do sigilo do relatório Costa Pinto.
Rafael Marchante/Reuters
10 Março 2021, 14h38

João Costa Pinto situou no contexto de uma mudança da gestão centrada na preocupação em tirar partido do melhor valor do ativo (típica de uma gestão continuada), para uma ótica de liquidação, que privilegia o fire sale (venda rápida), quer a venda da seguradora Tranquilidade em 2014/2015 à Apollo Global Management, quer a venda de ativos problemáticos pelo Novo Banco, já depois da venda ao Lone Star.

O ex-presidente do Conselho de Auditoria do Banco de Portugal falava na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução.

“É a tal passagem de uma ótica de gestão contínua e de tirar partido de um valor do ativo o máximo possível para uma ótica de liquidação, que explica grande parte das perdas e das chamadas de capital”, disse. Numa ótica fire sale, “tudo muda de figura, as perdas de valor são imediatas. E quando se decide juntar em pacotes carteiras onde se misturam alhos com bugalhos, coisas boas e más, é receita para o desastre”. Deixa assim críticas à venda acelerada de ativos tóxicos realizada pela gestão de António Ramalho.

“Quando se recorre a fundos [Lone Star] que querem recuperar em três anos, isso implica a desvalorização dos ativos que adquirem de pelo menos 50%. Quando tudo isto acontece não podia haver outra coisa se não perdas substanciais”. E quando se decide misturar créditos garantidos com créditos não garantidos, como é que é possível?”, disse.

Costa Pinto cita os casos dos intervencionados Lloyds Banking Group e do Royal Bank of Scotland que acabaram por dar até ganhos ao Estado, “mas levaram dez anos a limpar o balanço”.

“É evidente que se diz que tinha de ser rapidamente porque havia compromissos para com a Comissão, com a Direção-Geral da Concorrência Europeia e o BCE. Primeiro, esses compromissos não deviam ter sido aceites como foram. Mas, depois de terem sido, a gestão do Novo Banco não precisou do tempo todo dado, que foram cinco anos. Por isso é que digo que há perdas que podiam ter sido evitadas. Por isso digo, mesmo depois de ter sido vendido como foi, as coisas podiam ter corrido de maneira distinta”.

“Os créditos garantidos pelo Fundo de Resolução deviam ser tratados com enorme cuidado, mantidos à parte para avaliações posteriores porque estão em causa dinheiros públicos”, defendeu.

O relatório Costa Pinto defende que Banco de Portugal tinha mecanismos legais para afastar Ricardo Salgado mais cedo, “desmentindo” Carlos Costa, numa anterior audição sobre a resolução do BES. Para colocar a pergunta, a deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, cita uma parte do relatório secreto de autoavaliação do Banco de Portugal, na qual se defende que o quadro legal da altura não impedia uma atuação no sentido de mudar a administração do BES, então liderado por Ricardo Salgado, ao abrigo das exigências de idoneidade.

Costa Pinto cita dois artigos do Regime Geral das Instituições de Crédito (artigos 141 e 33) que já na altura eram dispositivos que teriam permitido uma intervenção mais robusta. “Não tinham a potencia dos instrumentos que hoje existem, mas teriam permitido uma intervenção mais robusta, quer ao nível da substituição de administradores, quer da nomeação compulsiva de administradores”, disse o ex-presidente do Conselho de Auditoria do Banco de Portugal, na audição na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução.

João Costa Pinto defendeu que o relatório que faz a autópsia da atuação do Banco de Portugal no BES até à aplicação de uma medida de resolução, devia ter sido tornado público “há muito tempo”, porque se evitava a “mistificação” desse relatório, que leva até a imaginar coisas que nem lá estão.

“Devia ter sido submetido ao contraditório no BdP”, disse ainda.

Fernando Negrão anunciou que esta comissão parlamentar vai enviar um recurso ao Supremo Tribunal de Justiça, para poder tornar público o relatório Costa Pinto.

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