Quando, em novembro de 2015, o governo liderado por António Costa e suportado por Jerónimo de Sousa e Catarina Martins tomou posse, os portugueses acreditavam que muita coisa iria mudar nas suas vidas.

A “geringonça”, como ficou conhecida a nova troika, defendia o fim da austeridade, a eliminação dos cortes, a reposição dos direitos, a reversão das privatizações, o controlo da instabilidade social, a melhoria dos serviços públicos, o reforço do investimento público, a aposta na ciência, a revitalização dos cuidados de saúde.

Depois de quatro anos de imensos sacrifícios, os portugueses tinham conseguido virar a página, saindo de uma profunda recessão económica e começando a apresentar sinais de crescimento. Com o financiamento externo a ser assegurado a taxas historicamente baixas, o desemprego a regredir, o défice em valores muito próximos das metas estabelecidas a nível europeu, a economia a crescer acima de 1,5%, Costa viu cair-lhe no regaço um país em trajetória ascendente.

Passos e Portas tinham cumprido a sua missão, ficando para sempre rotulados como os arautos da desgraça, incapazes de transmitir boas notícias aos seus concidadãos, responsáveis por nos irem ao bolso a cada semana que passava, reféns de Berlim, que os guiava, como se de marionetas se tratassem. Portas, politicamente mais sagaz, atirou a toalha ao chão, afastando-se da cena política, até que melhores dias possam apresentar-se no horizonte. Passos, mais ingénuo, acreditou (e continua a acreditar) ser possível explicar aos portugueses que devem ser “pobrezinhos e honrados”, cavando, a cada dia que passa, a sua sepultura.

Perante este cenário, António Costa tem governado com recurso a alguns ensinamentos que bebeu de José Sócrates. Na política, muitas vezes, mais vale parecê-lo do que sê-lo. Uma máquina de comunicação bem oleada e um demagogismo fácil fazem milagres, especialmente quando a oposição parece ter tirado umas férias bem prolongadas.

Costa cumpriu algumas das promessas: a austeridade parece ter chegado ao fim, os cortes foram sendo revertidos, muitos direitos repostos, algumas privatizações/concessões revertidas, os sindicatos estão amordaçados por Jerónimo de Sousa, Catarina Martins passou, em pouco tempo, de leoa a cordeirinho, conseguindo hoje ler pela cartilha socialista, a economia cresce acima das expectativas mais otimistas, Centeno, um perigoso esquerdista, merece hoje o elogio do fascistoide Wolfgang Schäuble, que o apelida de Cristiano Ronaldo, o desemprego baixa de mês para mês, o partido do governo sobe nas sondagens, imune ao desastre de Pedrógão Grande ou ao furto de Tancos, sabendo, com o auxílio de focus group, gerir com maestria o seu desempenho.

Com as autárquicas à porta, os socialistas parecem apostados em exilar sociais-democratas e centristas numa colónia de leprosos, arrebatando os principais municípios em disputa. De repente, Portugal parece ter voltado ao tempo do partido único.

Mas será que tudo vai bem no nosso burgo? Na verdade, não. Sem pretendemos cair no exagero de ignorar alguns dos sucessos apresentados pelo governo socialista, embora se possa sempre questionar a paternidade dos êxitos alcançados, é importante não esquecermos o estado calamitoso em que se encontram alguns serviços públicos, carentes, como de pão para a boca, de um investimento que o governo parece ter metido na gaveta, a contínua degradação dos transportes, das escolas e dos hospitais, afetando, diariamente, a vida a milhares de portugueses, a profunda crise em que se encontra a, outrora endeusada, política de ciência no nosso país, a falta de médicos e enfermeiros, a ausência de meios por parte da administração interna e da defesa, em parte responsáveis pela recente tragédia de Pedrógão Grande e pela tragicomédia de Tancos, a situação de crescente descredibilização da educação portuguesa, pilar fundamental do aumento da competitividade no médio/longo prazo, que, por radicalismo ideológico, tem feito tábua rasa dos resultados alcançados nos últimos anos, fruto de uma política de rigor e de seriedade que agora se teima em pôr em causa.

Por muitos considerado uma superestrela, António Costa dificilmente conseguirá manter intacta a aura de que tem vindo a beneficiar, sendo, no final, julgado pelos portugueses não por aquilo que pareceu ter feito, mas, sim, por aquilo que efetivamente fez. O sonho cor-de-rosa tenderá a desvanecer-se e Costa enfrentará o declínio que obrigatoriamente afeta todos os “comandantes”, em especial aqueles que lideram para os tabloides e que tomam decisões ancorados em resultados de focus group.