No mundo que nos rodeia, e nas suas intrínsecas contradições, ao dia de hoje, penso que mais do que nunca é importante falar de esperança. Talvez por ser nestes momentos, de tantas contradições, em que para se ter força se impõe ter esperança.

Aí reside a essência, aí reside a dificuldade. De certa forma, a história da(s) democracia(s) também é um conto assente em esperança. Nada mais anda de mão dada com a ideia de esperança do que os valores democráticos. Pelo menos é essa a minha perspectiva. A esperança constrói-se no passado para se projectar no futuro.

Ainda em 2019, surgiu um livro (mais um) sobre a Democracia e merece ser referido por várias razões, entre as quais porque se alicerça no passado. Estou a falar de “Democracy and Prosperity: Reinventing Capitalism through a Turbulent Century” dos conhecidos académicos Torben Iversen e David Soskice. Este livro é sobre esperança e, independentemente do posicionamento ideológico de cada um de nós, a sua argumentação é, no mínimo, relevante.

Resumindo de forma muito simplista, os autores argumentam que a resistência das democracias se baseia no capitalismo, como se o capitalismo fosse o alimento para a Democracia como a conhecemos. Este argumento é ainda mais interessante quando vemos tanta literatura produzida sobre as reacções “não democráticas” daqueles que, sendo prejudicados pela globalização e logo pelo capitalismo, começam por apoiar líderes e movimentos não democráticos.

Concordemos ou não com a abordagem dos autores, não deixa de ser bastante elucidativa a análise histórica feita pelos mesmos, como se a democracia direccionasse o capitalismo desenvolvido no último século, e vice-versa.

As mudanças sociais dos últimos tempos, porém, possibilitam outras interpretações do que está a ocorrer no mundo. Talvez devêssemos falar numa deterioração do capitalismo. Mas quer seja verdade futura ou não, a ideia que os autores assinalam como particularmente relevante em Democracia não deixa de ser importante: a distribuição igualitária de recursos dentro dos Estados não é o que verdadeiramente importa, mas sim um reforço da posição da classe média dentro da sociedade.

Hoje em dia tudo me parece um teste à democracia como tem sido idealizada no mundo ocidental, desde a presidência de Trump nos EUA ao Brexit, até à forma como alguns países têm lidado com a propagação do coronavírus. Esperança, há, mas não sei bem se baseada numa certa interpelação entre um “bom”(?) capitalismo e a Democracia, ou em acasos que vamos acabar por perder de vista.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.