A campanha para as europeias terminou e cada um dos 17 partidos que concorreu aos 21 lugares no Parlamento Europeu terá tirado as suas próprias ilações, tanto à direita como à esquerda.
A elevada abstenção refletiu um misto de desinteresse e falta de informação que torna a nossa democracia mais pobre. Mas a responsabilidade pela abstenção não pode ser colocada apenas à porta dos eleitores; é também dos partidos no Parlamento que têm o poder de legislar soluções para pôr fim ao flagelo da abstenção, mas preferem continuar a fingir que o assunto não passa por eles. Impõe-se tanto uma limpeza dos cadernos eleitorais como uma reforma do próprio sistema eleitoral, não havendo nenhuma força política no parlamento realmente a manifestar interesse em contribuir para essa mudança.
O tipo de campanha realizado nas europeias provou também que muitos visionam ainda as instituições europeias, acima de tudo, como uma fonte de obtenção de fundos comunitários e não como um instrumento político capaz de mudar as vidas dos cidadãos. Recordo-me de ouvir a ex-eurodeputada Ana Gomes afirmar, num dos debates realizados durante a campanha, que a maioria dos nossos politólogos tem uma ideia datada do Parlamento Europeu e desconhece que, desde o Tratado de Lisboa, o PE tem um maior poder legislativo.
O fato de praticamente todos os partidos (à exceção de um) terem optado por discutir temas nacionais nas suas campanhas, já em preparação para a campanha legislativa, ajudou também a minar as europeias. Desta eleição emergiu um claro desaire da direita, castigada pelas suas opções populistas ou confusas, e um crescimento generalizado da esquerda que permitiu uma maior definição das suas várias tendências políticas.
Curioso notar como as formas tradicionais de fazer campanha de rua — arruadas, outdoors, megacomícios — têm vindo a perder cada vez mais força e já não garantem necessariamente melhores resultados. Basta notar nos orçamentos altíssimos de várias campanhas e contrastar com os seus resultados obtidos, claramente inferiores às expetativas de eleição.
Já para não falar de que 21,8% dos eleitores votou em outros partidos além das cinco principais forças políticas. É inevitável que essa percentagem continue a crescer, no sentido de pôr fim ao velho bipartidarismo que tanto tem dominado nos últimos 30 anos.
Nos próximos quatro meses, até às eleições legislativas, veremos um ambiente politicamente tenso marcado por bluffs e campanhas mais duras, desleais, populistas e desonestas. Não sendo tão dramáticas quanto a série “House of Cards”, as legislativas são um campeonato em que, pese embora a maior probabilidade de eleger um deputado em vários círculos, o sistema partidário, com a cumplicidade de parte da comunicação social, organiza-se de forma ainda mais agressiva para barrar a entrada de novos protagonistas. Verdade seja dita, o fenómeno do PAN veio contrariar essa tendência e o partido continua a subir sem depender de cobertura mediática e sem grande escrutínio.
Estará realmente o velho sistema a começar a dar sinais de mudança? As próximas legislativas serão decisivas para percebermos se caminhamos nesse sentido ou se os portugueses irão votar para manter tudo na mesma.