A auditoria da Deloitte aos atos de gestão dos últimos 18 anos do BES/Novo Banco e que revela perdas de 4.042 milhões de euros, entregue pela consultora ao Governo e que seguiu para o Parlamento, já está também com a Procuradoria-Geral da República (PGR). Fonte oficial da PGR confirmou ao Jornal Económico a receção do relatório que foi enviado pelo Executivo e dá conta de que o relatório, com perto de 400 páginas, seguiu para o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), que investiga os crimes económicos e financeiros de elevada complexidade.
“Confirma-se a receção na Procuradoria-Geral da República do relatório da auditoria em referência”, revelou ao JE fonte oficial da PGR, após questionada se a entidade liderada por Lucília Gago já tinha recebido a auditoria especial ao Novo Banco e qual o seguimento a dar a este documento. Segundo a mesma fonte, “esse relatório será alvo de análise e sequência no âmbito das competências do Departamento Central de Contencioso do Estado e Interesses Coletivos e Difusos e do Departamento Central de Investigação e Ação Penal”.
O Executivo tinha avançado nesta terça-feira, 1 de setembro, que a auditoria seria remetida pelo Governo à Procuradoria-Geral da República devido às matérias em causa) e à necessidade de salvaguardar os interesses financeiros do Estado. Além da PGR e do Parlamento, o relatório foi ainda enviado para o Banco Central Europeu, Banco de Portugal, Fundo de Resolução, Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões e Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.
O Ministério das Finanças justificou, em comunicado, o envio do relatório final para a PGR dado que auditoria “incide sobre um período muito alargado da atividade do Banco Espírito Santo até 2014”, período relativamente ao qual “estão em curso processos criminais”. Por esse motivo, e também devido “à necessidade de salvaguarda dos interesses financeiros do Estado.
Segundo as Finanças, o documento evidencia que as perdas do Novo Banco se deveram “fundamentalmente” à exposição a ativos “que tiveram origem no período de atividade do Banco Espírito Santo” — tal como o Jornal Económico noticiou na semana passada — e que foram transferidos para o balanço do Novo Banco após a resolução do BES.
O relatório, resultante da auditoria da Deloitte, analisou actos de gestão praticados entre 1 de janeiro de 2000 e 31 de dezembro de 2018, tendo sido objeto de análise 283 operações que originaram perdas de 4.042 milhões de euros para o Novo Banco entre 4 de Agosto de 2014 (um dia após a resolução do BES) e 31 de Dezembro de 2018.
A amostra total da auditoria da Deloitte ao Novo Banco abrange 283 ativos, entre créditos, imóveis, títulos e operações com subsidiárias que tenham gerado perdas cobertas pelo Mecanismo de Capital Contingente (CCA). A amostra terá abrangido 100 devedores e outros que o Fundo de Resolução tenha decidido adicionar ao escrutínio da Deloitte.
Foram analisados três blocos de atos de gestão do Novo Banco praticados naquele período. Foram auditadas 201 operações de crédito que geraram perdas de 2.320 milhões de euros, 26 operações com subsidiárias e associadas, que causaram perdas de 488 milhões de euros e ainda 56 operações com outros ativos, que geraram perdas no valor de 1.234 milhões de euros.
Trata-se de um relatório “extenso” e que “descreve um conjunto de insuficiências e deficiências graves de controlo interno no período de atividade até 2014 do Banco Espírito Santo no processo de concessão e acompanhamento do crédito, bem como relativamente ao investimento noutros ativos financeiros e imobiliários”, frisam as Finanças.
Venda de imóveis na mira do Ministério Público
O Ministério Público vai investigar a operação de alienação de imóveis do portfólio “Viriato”, realizada em 2018, em que o Novo Banco foi o vendedor e também o financiador de um fundo de investidores anónimos nas ilhas Caimão. O Ministério Público revelou ao Jornal Económico, a 18 de agosto, que a carta do primeiro-ministro seguiu para “análise e sequência” do Departamento Central de Contencioso do Estado e Interesses Coletivos e Difusos e para o DCIAP.
António Costa enviou em julho uma carta à procuradora-geral da República, Lucília Gago, em que pedia a suspensão da venda de ativos do Novo Banco até que fosse concluída a auditoria que está a ser feita pela Deloitte, tendo a PGR confirmado a 18 de agosto estar a analisar o pedido.
O Jornal Económico perguntou ao MP a 29 de julho se iria investigar a operação de alienação de 5.355 imóveis compostos por 8.486 frações do portfólio “Viriato”, realizada em 2018, como foi noticiado pelo jornal “Público”. Fonte oficial da PGR revelou agora ao Jornal Económico que “a carta do primeiro-ministro foi encaminhada para o Departamento Central de Contencioso do Estado e Interesses Coletivos e Difusos e para o Departamento Central de Investigação e Ação Penal para análise e sequência, no âmbito das competências dos referidos Departamentos”.
A análise ocorre depois da instituição liderada por António Ramalho ter enviado a 27 de julho para a PGR documentação relativa à venda de carteiras de ativos imobiliários. Tal como avançado pelo Jornal Económico, foram entregues um “conjunto de informação exaustiva” sobre a venda de duas carteiras de ativos imobiliários, denominados por projeto “Viriato” e projeto “Sertorius”.
No centro da polémica está ainda a alienação de 8.719 frações do portfólio “Viriato”, realizada em 2018, em que o Novo Banco foi o vendedor, mas também foi financiador de um fundo de investidores anónimos nas ilhas Caimão. Segundo o jornal o Público, o banco alienou a carteira, com perdas, mas foi compensado por esses prejuízos por parte do Fundo de Resolução, criado em 2012, que compromete-se a injetar dinheiro sempre que as contas do Novo Banco fiquem ameaçadas. Os imóveis estavam avaliados nas contas do banco em 631 milhões de euros, mas foram vendidos por 364 milhões. Mas o Novo Banco reagiu à notícia, garantindo que a venda da carteira de imóveis em 2018, denominada projeto “Viriato” não implicou custos para o Fundo de Resolução porque a maioria dos ativos não estavam cobertos pelo CCA. O banco liderado por António Ramalho garantiu ainda que “esta operação não foi feita a preços de saldo, mas sim a preços de mercado“.
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