Passados 17 anos, o “Mad, Mad World” de Shaggy guarda toda a atualidade, no politics, polytricks, econometricks de que ele se queixa, bem como nas suas rimas: “Death toll rising, sex commercializing/Barely surviving, future jeopardizing/No compromising, hope paralyzing/Rules need revising, why is it surprising?” e “Nuclear warfare, satellites every where/Mothers on welfare, what about medicare?/Ethnic cleansing, freedom pending/Government spending, who are they defending?”

Trump na Casa Branca vai acelerar este estado de coisas se cumprir alguma coisa do que diz. Se deportar os cerca de 20 milhões de imigrantes indocumentados, a taxa de inflação terá um aumento épico – por exemplo, o Labor Department estima que metade dos trabalhadores agrícolas nos EUA estejam nesta categoria. Se não bastasse, a criação de emprego em dezembro (265 mil novos postos) excedeu em muito a expectativa, e a taxa de desemprego diminuiu para 4,1%. Estão, portanto, em causa novas descidas da taxa de juro, que poderão não ocorrer em 2025 (a FedWatch Tool admite uma, no segundo semestre).

Como resposta, o yield da dívida pública (bonds a dez anos) está a aumentar para máximos de mais de um ano: estamos a 4,8%, contra 3,6% em setembro e 0,5% em julho de 2020. Isto implica que é cada vez mais caro financiar o défice orçamental americano, que aumenta 10 mil milhões de dólares por dia e cujo limite está acima do céu com as promessas de Trump de reduzir impostos, quando não é opção cortar no orçamento da defesa (que já é menor que o serviço da dívida). Cereja no topo do bolo, Trump quer aumentar as tarifas, o que levará necessariamente a retaliações – tudo terminará em mais inflação. Ou seja, a Fed não terá uma missão fácil, e está para já remetida à atitude britânica do wait and see.

Ou seja, cumprir os devaneios de Trump vai obrigá-lo a contratar não Musk, mas Tom Cruise. Depois das suas notáveis divagações sobre o Canal do Panamá, a Groenlândia e o Canadá (que pensa ele que aconteceria em Taiwan logo de seguida?), falta ver como acaba com a guerra da Ucrânia num dia – será certamente ou o dia mais longo ou o dia mais triste. A ordem mundial está a mudar para a lei do mais forte, como argumenta Eric Le Boucher no “Les Echos”, que fala do fim da paz Westefaliana. Estamos no primado da força bruta sobre a inteligência, mas Trump descobrirá que só a força não basta. O poeta fazia o impossível com engenho e arte. Trump já nos mostrou que não tem nada de poeta.