Três figuras importantes da democracia portuguesa têm demonstrado como se faz marketing na política e como tudo pode correr ao contrário do esperado.

A recente vista do Presidente do Brasil a Portugal, Lula da Silva, foi o pretexto para se promover em definitivo o Chega e o seu líder, André Ventura, aos píncaros da política nacional. O presidente Marcelo Rebelo de Sousa quis fazer de Portugal o melhor anfitrião. É ainda certo que o Brasil tem multinacionais de forte interesse para Portugal, nomeadamente no cluster da aeronáutica, mas há sempre um limite.

Ainda poucas pessoas terão percebido a razão da atribuição da Grande Cruz da Ordem do Infante D. Henrique à primeira dama do Brasil, quando não foi explicada a decisão com base no expectável percurso artístico, cultural, académico, político ou militar da galardoada em questão.

Mais grave foram as opções a quente do presidente da Assembleia da República (AR), Augusto Santos Silva, número dois da hierarquia do Estado, que nesta semana do 25 de Abril e da visita de Lula da Silva fez uma promoção sem precedentes à ideologia, prática política e protagonismo do Chega e do seu líder. Isto tudo ao promover uma patética cena na AR, que entrará para os anais da história como o bilhete que André Ventura precisava para chegar em breve ao Governo de Portugal.

Em vez de promover a sua exclusão do regime e do sistema político português, o presidente da AR esteve, e está, a fazer exatamente o contrário, lembrando o que François Miterrand faz há muitos anos em França com a Frente Nacional de Jean-Marie Le Pen, e que só contribuiu para o seu enorme crescimento e esvaziamento do RPR (atuais Republicanos), e para a ascensão da filha Marine Le Pen, como provável Chefe de Estado e líder do próximo Governo de França na era pós-Macron.

Santos Silva demonstrou ser de uma inabilidade política total, o que já não é novidade, visto ao longo dos anos ter proferido declarações absolutamente patéticas, como aquela em que dizia gostar de malhar na direita. Agora, parece gostar de malhar no Chega. No entanto, malhar no Chega nesta fase é promovê-lo e alavancar Ventura a uma posição com que este nunca poderia ter sonhado.

A verdade é que muito dificilmente haverá um governo de centro-direita sem o Chega, pois os restantes partidos, PSD, IL e CDS, não são suficientes para uma maioria. Aqui, o líder do PS, António Costa, foi arguto ao ponto de diabolizar o Chega e obrigar o PSD a ostracizá-lo, para, desta forma, a direita não chegar ao poder.

Para já, o objetivo de transformar Ventura no satanás do regime está a fazer dele exatamente o contrário, o salvador do sistema. Os analistas estão cada vez mais convencidos de que não haverá governo pós-Costa sem que Ventura esteja no executivo diretamente ou via acordo parlamentar. E aspirando a ser maior do que o PSD, tal como aconteceu em Itália, com o esvaziamento do Forza Italia e o crescimento de Giorgia Meloni.

Mais. A queda do PSD é particularmente desastrosa. O PS foi avisado de que esta será uma estratégia perigosa de aniquilação de outro partido do arco constitucional, e que tem sido necessário para fazer maioria em matérias críticas, como a alteração da Constituição.

Lembremos ainda que, no passado, a esquerda, PCP e Bloco arrastaram o PS e acusaram PSD e CDS em plena AR de serem partidos fascistas, e várias vezes, sobretudo no período da Troika, usaram expedientes semelhantes aos que agora Ventura usou contra Lula.