Como sabemos, «desde há muitos anos que a União Europeia alerta para a necessidade de os Estados Membros identificarem e eliminarem entraves no acesso a profissões reguladas, de forma a criar oportunidades de emprego e aumentar o potencial de crescimento económico na Europa

Começo este artigo com esta que é a citação apresentada nas exposições de motivos dos diplomas que no Parlamento pretendem alterar o Regime das Associações Profissionais, e que seria a justificação e o pretexto para todos os atropelos que se querem fazer à sua ‘boleia’.

É verdade que esta discussão não é, em si, nova mas as preocupações que tenho manifestado publicamente sobre este tema mantêm-se pertinentes e atuais. Como o espaço de um artigo de opinião é sempre limitado, quais são os aspetos que não posso mesmo relevar sobre este assunto?

Na minha perspetiva, as alterações agora propostas e introduzidas ultrapassam os objetivos destes diplomas, e constituem, em última linha, um ataque ao Estado de Direito e aos Direitos dos Cidadãos. Uma ingerência frontal na forma como nós, Advogados, exercemos a nossa profissão. Vejamos porquê:

(i) Como compatibilizar a consagração dos estágios profissionais como exceção à regra, apenas sendo permitidos quando as matérias ministradas não sejam parte integrante dos cursos superiores que concedem a devida habilitação académica, e a redução do estágio para 12 meses quando pretendemos habilitar o candidato à profissão com todos os conhecimentos necessários para o exercício eficaz e capaz duma atividade que exige, no caso da Advocacia, uma convivência ativa com a prática judiciária?

(ii) Como conciliar o envolvimento de entidades públicas nos procedimentos de implementação ou de execução dos estágios profissionais com a autonomia das associações públicas profissionais?

(iii) Ou que a avaliação seja feita por um júri independente, com personalidades de reconhecido mérito e que não sejam membros da associação profissional em causa, em detrimento do saber, usos da profissão e conhecimento dos colegas de profissão?

(iv) Como pode a obrigatoriedade da remuneração dos estágios profissionais – relegada para as Ordens a definição estatutária de tais situações – não ser, na maioria dos casos, uma nítida restrição do acesso à profissão?

(v) Como pode ser sustentável a criação de sociedades multidisciplinares com respeito pelos deveres deontológicos do Advogado ou das obrigações de cada um dos membros das profissões liberais quando existem múltiplas incompatibilidades e conflitos de interesses?

(vi) Como impedir que esta multidisciplinaridade não seja o abrir de portas ao abuso e à perda de segurança no acompanhamento jurídico, com os variados efeitos nefastos que implicará no Estado de Direito Democrático, na paz social e na manutenção dos pilares de integridade da sociedade?

(vii) Como ficará a Advocacia em prática individual?

(viii) E que viabilidade têm outras alterações propostas nestes Projetos de Lei como, por exemplo, o futuro Órgão de Supervisão, a figura do Provedor dos Destinatários dos Serviços ou a extinção de mais de metade das ordens existentes (Projeto de Lei n.º 178/XV/1)?

Cabe-nos a nós, Classe, refletir sobre estas temáticas e tomar decisões antes que seja o Estado a tutelar e a decidir sobre a nossa vida profissional.

É chegado o momento e não estamos sós.

As críticas por parte de representantes de várias ordens profissionais são agora mais audíveis.

Unidos teremos mais força!