Sempre fui contra a regionalização. Num país da dimensão de Portugal, parece carecer de sentido a ideia da criação de cinco (ou mais) regiões autónomas que iriam tornar um país, já de si pequeno e periférico ainda mais pequeno. Se no caso das regiões autónomas da Madeira e dos Açores, dada a sua ultraperiferia e características singulares, se percebe, no que toca ao Continente, parece um exercício forçado e até disparatado.

Efetivamente, a regionalização iria servir para aumentar custos – nomeadamente pela desmultiplicação de poderes com parlamentos e governos regionais – e desresponsabilizar o Estado (em sentido lato). Quando corresse bem, o mérito seria de todos, quando corresse mal a culpa morreria solteira, enquanto Governo Regional e Governo da República se travavam de razões e se escudavam de responsabilidades. Um jogo do empurra tão mais esdrúxulo quanto o número de partidos distintos em lugar de poder (nacional e regional).

Deste modo, a questão que se coloca é como e o que descentralizar?

A ideia de Santana Lopes de deslocalizar gabinetes ministeriais para a periferia, apesar de bonita não passou de um romantismo. Na prática não funciona. A descentralização terá de passar necessariamente pela deslocalização de institutos e de organismos do Estado (por exemplo secretarias gerais) para a periferia, pois é nestas entidades que se materializa o poder da máquina do Estado, com uma grande massa humana de suporte capaz de impactar a economia local.

Embora a ideia faça sentido, como se viu no caso da Agência Europeia do Medicamento e do Infarmed sem representantes atentos e que se preocupem verdadeiramente com o círculo que representam, as intenções tardam em passar disso mesmo, da mera intenção.

Assim, as diferentes soluções parecem desaguar num beco sem saída. Será?

Há umas semanas atrás tive a sorte de participar num debate sobre o tema com o Dr. Manuel Monteiro. A inteligência que lhe é reconhecida, aliada ao distanciamento de que hoje goza face aos partidos políticos, permite-lhe uma visão desempoeirada e isenta de enviesamentos provocada por interesses pessoais.

Muito antes da publicação do número de deputados a eleger por cada círculo eleitoral, alertou para o problema da perda de mandatos nos distritos do interior e para a macrocefalia de Lisboa e do Porto, que canibalizam uma fatia demasiado grande do número de deputados a eleger.

No dia 12 de agosto, confirmou-se a profecia: Guarda e Viseu perdiam um deputado cada, passando a três e oito deputados respetivamente, enquanto Lisboa e Porto aumentavam o seu número de deputados para 48 e 40, respetivamente.

Tal significa que os dois maiores distritos do país concentram 38% dos deputados eleitos. Se considerarmos apenas os deputados eleitos pelos distritos de Portugal Continental a percentagem aumenta para cerca de 41%, enquanto um distrito com a extensão territorial de Portalegre tem apenas dois deputados, menos de 1% do total de deputados eleitos.

Não é, portanto, de estranhar por um lado, a perda de peso institucional das regiões do interior no quadro geopolítico nacional; por outro, a perda de interesse dos eleitores que cada vez menos se sentem representados pelos partidos, especialistas em ocupar osregi poucos lugares elegíveis com deputados “paraquedistas” sem qualquer ligação aos distritos, ou à vontade dos eleitores locais.

Assim sendo, qual a solução milagrosa? Espantosamente nenhuma!

Manuel Monteiro descobriu um “ovo de Colombo. A sua proposta passa por um modelo que nada tem de inovador e que até já se aplica no panorama político nacional: o modelo implementado na Região Autónoma dos Açores.

A ideia assenta em dividir os deputados eleitos em duas categorias. Uma categoria com um número fixo de deputados, por exemplo cinco por distrito (i.e. 100 deputados, cinco por cada um dos 20 círculos eleitorais, incluindo as regiões autónomas); e outra categoria com os restantes 130, que continuariam a ser eleitos de acordo com o número de eleitores em cada distrito.

Tal modelo garante não só a representatividade territorial de todos os distritos e regiões autónomas, como impede que os partidos centralizem – nas sedes de Lisboa – as escolhas em deputados de dita “dimensão nacional”, aproximando os eleitos das respetivas bases eleitorais. Seria também o primeiro passo de uma necessária e aguardada descentralização. A título de mero exemplo, a representatividade dos oito distritos do interior – Bragança, Vila Real, Guarda, Viseu, Castelo Branco, Portalegre, Évora e Beja – passaria dos cerca de 13% atuais para quase 20% dos deputados eleitos.

Haja coragem e vontade política de trabalhar a solução.