O reforço de competências locais padece, efectivamente, de divergências de base quanto à opinião geral sobre a organização administrativa nacional, parecendo resistir na sombra um sentimento de desconfiança quanto ao papel que deve ser exercido, em particular, pelos municípios.

No âmbito do quadro constitucional atual, permanecem imaculados os princípios da subsidiariedade, da descentralização administrativa e da autonomia do poder local, com base nos quais assentará a necessidade de “maior eficiência e eficácia na atuação da administração pública perante o cidadão, em especial face à proximidade e, por essa via, à inerente celeridade na resposta às legítimas pretensões formuladas pelos cidadãos”. É neste contexto que surge um complexo campo de discussão, prevendo-se que passe a ser da competência dos órgãos municipais “Proceder à avaliação e reavaliação de imóveis (…). Neste sentido, (…) fica o Governo autorizado a introduzir, no prazo de 180 dias, alterações no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, (…) no sentido de transferir as competências em matéria de avaliação e reavaliação de imóveis dos serviços de finanças para os órgãos municipais, nomeadamente no que concerne à iniciativa para avaliação, designação de peritos avaliadores e decisão de reclamações”. Para muitos, a presente alteração vem simplesmente abrir portas ao “descalabro”, promovendo-se o aumento de IMI. Ora, vejamos o que está em causa. Diz o Código do IMI que este imposto visa “proceder a uma compensação pela ação pública autárquica (em especial, municipal) no domínio urbanístico, bem como das infraestruturas que os compõem”. Para o efeito, estabelece-se um conjunto de variáveis para cálculo do VPT, cuja concretização afasta muitas vezes o montante de imposto, dos verdadeiros pressupostos que subjazem ao respetivo racional. De igual modo, não se entenda a permissão de reavaliações como algo desconectado de quaisquer limites legais. Não será certamente essa a intenção do legislador. As alterações suscitadas encaixam numa necessidade crescente quanto à promoção de uma verdadeira política de desenvolvimento regional, assente na responsabilização dos decisores locais. É este o caminho de políticas de desenvolvimento como a estratégia para receção de fundos comunitários à própria política de solos municipal, tendo em vista um adequado planeamento urbanístico e infraestruturas. Sendo certo que o caminho da coesão nacional não poderá passar sem ter em conta o contributo local, para o qual é imperioso dotar os municípios da competência necessária a uma gestão efetiva e eficiente, incluindo ao nível fiscal, deverá discutir-se sim uma responsabilização efetiva do decisor político local, com base em transparência e accountability, em troca de um serviço público eficiente e de proximidade ao cidadão.