Decorre esta semana a Cimeira Anual do World Economic Forum, Davos 2021. O evento, online, está a ser dominado pelos efeitos da pandemia Covid-19 à escala planetária. Parece um paradoxo, mas não é. A colaboração global da comunidade científica contrasta com um novo desafio: a desglobalização.

Não é um dado novo. A crise financeira, iniciada em 2007-2008, fez soar as campainhas dos líderes mundiais quanto à globalização dos mercados financeiros. Uma reflexão livre sobre o que se passou há uma década é tentadora para se estabelecer analogia: o mercado de créditos hipotecários norte-americano fora uma espécie de “Wuhan” dos mercados financeiros.

A desconfiança que se instalou, que levou a uma crise de dívidas soberanas, a “vacina” das políticas de quantitative easing dos principais bancos centrais, foram episódios recentes que alertaram para uma interdependência global imperfeita. A tudo isto, somou-se a cereja no topo do bolo do ideário Trump de uma América Primeiro, que vira nas medidas protecionistas a via para a economia norte-americana não perder a corrida para a China.

Hoje, os desafios tendem a assumir proporções de outra magnitude. Desta vez, a vacina para o vírus real resulta da cooperação internacional da comunidade científica. Mas, até à estabilização da crise, assistiremos a fenómenos de retração do comércio internacional. Ainda que, com diferenças setoriais importantes. Está a acontecer uma redução significativa do comércio de bens. No caso dos serviços relacionados com o transporte de passageiros e turismo, a queda é vertiginosa. No entanto, a aceleração da digitalização abre boas perspetivas para o desenvolvimento de serviços online.

Num interessante debate sobre a desglobalização, que reuniu a Chief Economist do BERD, Beata Javorcik, o Professor de Comércio Internacional da Universidade de St.Gallen, Simon Evenett, e o Presidente da Federação Americana do Trabalho, Richard L. Trumka, moderado pelo jornalista do “Wall Street Journal”, Gerard Baker, as vozes foram unânimes quanto aos riscos do fecho das economias. As longas cadeias de fornecimento de bens intermédios passaram a ser menos seguras, mais caras, devolvendo às economias tendências de produção local que poderão levar a custos de produção mais elevados, com perdas de competitividade acentuadas. Esse efeito recairá no consumidor.

A nível mundial, as ajudas estatais que decorrerão desta crise, poderão traduzir-se em significativos efeitos de distorção do funcionamento dos mercados e, com isso, conducentes a afastar o investimento privado. Em maior perda estarão as economias de países não filiados em zonas económicas comuns. Também o acentuar de desigualdades será uma realidade se a tendência para a desglobalização se mantiver. A Covid-19 veio pôr em crise os modelos de crescimento de países mais pobres, fortemente dependentes do comércio internacional.

Desse debate sobre os riscos da desglobalização saiu um sentimento unânime. Estamos à beira de enfrentar um período prolongado de estagnação económica a nível mundial. Economias menos abertas, com os respetivos Estados a encetarem forte participação pública na atividade económica sem acautelarem como e quando se entra e como e quando se sai, tenderão a distorcer a concorrência, aumentar o risco de corrupção e manter artificialmente empresas menos eficientes.

Por ilusão, poderemos ser tentados a anuir a um modelo de intervenção sob a bandeira da proteção do emprego. Mas, a prazo, tal produz o efeito exatamente contrário por inibir o desenvolvimento de novas empresas e, com estas, maior número de oportunidades. Não duvidemos que o fecho de economias é prejudicial para todos. O futuro dependerá da forma como se constrói uma globalização mais justa.