A proposta de Orçamento do Estado para 2021 dá o pontapé à execução do Plano de Recuperação Económica apresentado por António Costa Silva, marcado por uma forte componente ideológica, que tem o Estado como centro e motor da economia nesta década.

O documento dá o mote a esta nova ideologia quando, na página 28, afirma que o principal apoio às empresas está em “os impostos não vão ser aumentados”!

Ou seja, as empresas, que foram o motor da recuperação económica dos últimos anos, e que dinamizaram a procura externa de produtos e serviços, têm muita sorte. Aos defensores de melhores condições de competitividade através de uma redução de IRC nos próximos anos, esse plano ficou completamente posto de parte.

As empresas encontram nesta proposta de OE poucos incentivos ao desenvolvimento da sua actividade a não ser medidas para manter a dívida em cumprimento, seja através da facilidade de contrair mais empréstimos, seja nas moratórias, com impacto imprevisível quando terminarem.

Não é abordada qualquer redução das mais de 4.600 taxas cobradas, nem a pressão regulatória sectorial, o cumprimento normativo ou a burocracia que asfixia a capacidade de reacção das empresas.

O investimento público, que cresce mais de 20% em 2020 e 2021, afirma-se como o motor da recuperação económica, facilitada pelos fundos europeus. Por outro lado, os custos fixos do Estado continuam a subir, em salários (+822M€), em gastos intermédios (+471 M€), em prestações sociais (+1.341 M€), sem falar no buraco dos próximos anos que será a TAP, tornando muito complicado qualquer ajuste futuro na despesa.

Verifica-se igualmente uma sobrestimação das receitas, quer por via da recuperação económica, porventura mais lenta, tendo em conta que o investimento apenas ganhará ímpeto na segunda metade de 2021, quer pelos dividendos a receber da CGD, na ordem de 159,6 mil milhões de euros.

Ora, numa altura em que é pedido à banca que não distribua dividendos para fortalecer o seu balanço, dado o previsível aumento dos incumprimentos e a fragilidade da recuperação económica, a verdade é que assistimos ao mesmo modus operandi utilizado do passado – o banco publico distribui dividendos e, quando necessitar, pede aumento de capital ao Estado. Esta é outra forma de distorcer da concorrência, visto que os bancos privados não só não podem distribuir dividendos, como não têm um accionista (contribuintes) disponível para aumentos de capital sucessivos.

Por último, não existe qualquer medida de incentivo à poupança, o que se percebe pelo objectivo deste orçamento – pôr as famílias a consumir, arrecadar mais impostos e reduzir o défice para um nível inferior a 3% em 2023.

O Orçamento do Estado para 2021 é o prenúncio de uma década perdida, sem objectivos concretos a não ser o da navegação à vista, com benefícios inequívocos para a função pública. A desigualdade começa neste Orçamento.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.