Este título não é da minha autoria. Aliás, uma colega inspirou-me ao referir-se a parte desta expressão quando falávamos sobre o funcionamento de vários serviços em Portugal (obrigada A.).
Claro que não é simples abordar a desistência nacional, que é mais ou menos aquilo em que nós enquanto país, nação ou pátria, se preferirem, muitas vezes sentimos como a última verdade. E isto é evidente nos vários níveis da administração do Estado, dos níveis de organização territorial, do regional, ao municipal e até ao local. Ora, é exactamente sobre isso que vos quero falar hoje.
A distribuição de poder dentro do espaço que delimita um país tem sido central no estudo da organização humana e política do Homem. As instituições políticas partem dessas disposições locais (desde os conselhos de sábios nas aldeias, até às chefias das vilas ou aos prestadores de serviços localmente), seguindo para o meso e o macro nos arranjos mais modernos dos países. Mas, o principal aspecto destas instituições, quer se trate da sua organização ascendente (centralizando-se), quer descendente (descentralizando-se), tem a ver com quem tem o poder legítimo, de entre eles e se todos eles.
Esta é, na verdade, uma das mais relevantes discussões sobre a regionalização que se fará (algum dia, talvez) em Portugal, mas sobre a qual não falarei hoje. Ligada a estes níveis de governo, ou mais correctamente, de governança, encontramos a necessária ligação a esse poder de fazer, os recursos a que se tem acesso para providenciar aquilo que é o Bem Comum ou, em linguagem mais específica, os bens públicos (realmente para todos).
Há uma variação entre estes níveis de governação, por exemplo, que unidades territoriais têm capacidade de satisfazer que necessidades e como é que isto é efectivado. Esta capacidade é essencial para percebermos o maior ou menor sucesso de um Estado enquanto tal. Aliás, a pandemia mostrar essa relevância, sendo que muitos países de cariz federal tiveram mais problemas em aplicar medidas mais gerais, embora fossem, também, dos que mais meios tinham à sua disponibilidade.
Talvez o aspecto que não nos lembremos é mesmo como a geografia influencia os resultados. Até podemos ter presente que a geografia eleitoral faz esta ponte entre latitudes e longitudes e sentido de voto, mas esquecemo-nos, com muita frequência, que a geografia implica ajustes muitas vezes “custosos”, mas que também podem revelar-se oportunidades reais.
Podemos olhar para a nossa vida de forma bastante semelhante: só sabemos se as nossas circunstâncias são vantajosas, ou não, quando estamos no meio da agitação. Se temos um barco ou se temos uma cabana em si não diz nada, a não ser que saibamos inicialmente qual o tipo de afronta com que nos iremos deparar. Ou seja, a queda depende sempre do chão à nossa frente e dos sapatos que calçamos.
E por que razão é que isto pode ser importante para a desistência ou insistência nacionais? Porque, dependendo das nossas perspectivas de sobrevivência, o facto de se ter tido um tipo ou outro de governança do Estado pode revelar-se uma vantagem ou uma desvantagem. Mais isso pode mudar quando o cenário, leia-se a realidade, mude. Ou seja, ter uma grande autonomia local pode ser benéfico hoje e não o ser amanhã, e vice-versa.
Quiçá por essa razão, a desistência nacional é precisamente aquilo com que mais nos confrontamos nos serviços públicos, nas empresas, nas redes sociais, nos podcasts, nas comédias semi-políticas. Mas, ainda assim, tal e qual meia dúzia de funcionários mais bem informados, um golpe de asa numa mudança abrupta de circunstâncias num acaso que ninguém percebe muito bem, a insistência nacional em sobreviver lá se vai dando.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.