Nas democracias, o fenómeno da tomada do poder por personagens populistas com perfis autoritários e antidemocráticos não é novo. Sabemos bem a história do séc. XX e como ditadores lá chegaram através do voto popular.

Depois da tragédia das duas guerras mundiais, parecia que os países mais desenvolvidos tinham aprendido a lição. A verdade é que foi muito a prosperidade económica e social do pós-guerra que fez com que o demónio do populismo e das ditaduras ficasse adormecido. Depois, todos os progressos educacionais e civilizacionais então obtidos davam a esperança de que a história trágica do séc. XX não se repetisse no séc. XXI.

Porém, temos todos que ter consciência da vantagem dos populistas: trabalhar em cima de discursos fáceis e demagógicos, gritados a plenos pulmões com a convicção de um chefe de batalha e que funcionam como caixas de ressonância dos pensamentos mais imediatos das populações, apresentando soluções miríficas para os problemas do dia-a-dia é muito mais apelativo do que descrever um mundo complexo, em que as soluções para os problemas não são fáceis e nem sempre estão no nosso domínio de controlo.

Isto é, um líder político que precisa de empolgar as massas para vencer as eleições vai ter muita dificuldade em fazê-lo através de um discurso elaborado e racional (por mais verdadeiro que seja). O nosso funcionamento emocional não é tão sensível a essa complexidade como é ao som dos discursos simples e empolgantes, que prometem soluções para tudo através do abatimento de alvos facilmente identificáveis (os estrangeiros, os refugiados, os homossexuais, os criminosos, as minorias étnicas, etc.).

Com Trump e Bolsonaro já se viu que não adianta uma “caça ao homem” feita pelos humoristas ou pela opinião publicada mais sofisticada. Bem pelo contrário, parece até que em muitos nasce a vontade de ser do contra e votar nessas personagens (que se assumem anti-sistema) precisamente porque anda todo o “sistema” a criticá-los.

A única arma de que dispõem aqueles que querem combater estes populismos é demonstrar, cabalmente, e também através de discursos simples, assertivos e com provas irrefutáveis, que as políticas populistas têm sempre um mesmo fim: a falência, a guerra ou a ineficácia.

Dêmos exemplos: em Portugal, que é um dos países mais pacíficos do mundo e sem grandes tensões fundamentalistas, não seria por se exterminarem os ciganos, se castrarem os pedófilos, se emprisionarem perpetuamente os violadores ou os assassinos, ou se proibir o casamento gay ou a eutanásia que ficaríamos melhor.

Bem pelo contrário: proibir o casamento gay só iria trazer infelicidade a muitas famílias; impedir a eutanásia só iria alargar o sofrimento de muitos, interferindo com as suas liberdades individuais mais básicas; castrar pedófilos não iria acabar com a pedofilia, pois a parafilia não está nos testículos ou na testosterona;  emprisionar perpetuamente certos criminosos poderia ter um efeito punitivo mais poderoso mas não baixa as taxas de criminalidade, como está amplamente demonstrado pelas estatísticas mundiais (ex: há muitos mais crimes per capita nos EUA do que em Portugal, apesar de as leis lá serem mais punitivas).

Sucessivamente, demonstra-se que as políticas populistas parece que funcionam, mas não funcionam. Por vezes, funcionam no curto prazo, mas têm efeitos contrários no médio e longo prazo. Enfim, perante o bombardeamento populista há que fazer um bombardeamento com a verdade, assertiva e sonoramente, demonstrando que essas políticas são ineficazes, contraproducentes e, tantas vezes, perigosas.

Costuma-se dizer que o barato sai caro. Aqui, pode dizer-se que o intuitivo sai mortal.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.