Muito se tem falado sobre a localização do novo aeroporto, os problemas do Montijo, a falta de estudo de impacto ambiental e o preço que se está a pagar pela privatização da ANA. Mas porque é que não se fala do plano para expandir o aeroporto da Portela?

Apesar de o Governo querer manter o segredo, permitam-me identificar dez erros sobre aquilo que já sabemos que vai afetar o ambiente e a saúde de quem vive em Lisboa.

1) Não se conhecem os impactos na saúde pública dos lisboetas do atual aeroporto de Lisboa. Sabe-se que o ruído dos aviões e as micropartículas emitidas pelos aviões são altamente prejudiciais à saúde, mas nunca foi feito um estudo em como isso afeta os lisboetas.

2) Entre 2010 e 2019, o número de passageiros do aeroporto da Portela duplicou de 15 milhões para 30 milhões. Isso significou um aumento dos voos para cerca de 214 mil, ou seja um voo a cada 2 minutos e meio – em 2018. Não foram estudados os efeitos desse aumento na saúde nem no ambiente. Em 2016, Londres fez um estudo do impacto do aeroporto de Heathrow na saúde da população londrina e os custos estimados rondavam os 500 milhões de euros/ano. Em Lisboa nunca se fez estudo algum.

3) O aeroporto de Lisboa não é como os outros aeroportos da Europa, porque está mesmo no meio da cidade. Hospitais, escolas, universidades, escritórios e mesmo as casas das pessoas são afetadas pelo aeroporto. Fora o risco de queda de um avião, os estudos científicos sobre ruído e poluição atmosférica na saúde indicam que o impacto na qualidade do sono e no sistema cardiovascular podem causar lesões vasculares, hipertensão arterial, comprometer o desempenho cognitivo das crianças, o sistema reprodutivo e aumentar doenças respiratórias como a asma.

4) O aeroporto de Lisboa usa uma exceção na lei para permitir mais 26 voos diários. A associação ambientalista Zero monitorizou o nível de ruído destes aviões e o cumprimento desta exceção e descobriu que os limites de ruído foram ultrapassados (ver aqui). Tal como está, o aeroporto tem regras inventadas só para si e não as cumpre.

5) A expansão prevista vai tornar o problema muito maior. O Governo quer aumentar em 33% a área do aeroporto de Lisboa de 500 para 700 hectares, e transportar mais 12 milhões de passageiros para um total de 42 milhões por ano. Ou seja, em vez de 40 aviões por hora, teremos 50 aviões. Só em ruído, as contas do ex-bastonário da Ordem dos Engenheiros indicam que vão ser ultrapassados os limites máximos definidos pela Organização Mundial de Saúde e afetar mais de 300 mil pessoas de Lisboa e Loures.

6) O Governo não quer fazer um estudo de impacto ambiental à expansão do aeroporto de Lisboa e apesar do plano ser secreto as obras começam já este ano. Muito embora esteja provado que a Agência Portuguesa do Ambiente nunca chumba nenhum projeto, tal como no caso do Montijo, o Governo está a tentar tudo para não fazer os necessários estudos previstos na lei. Tudo feito às escuras.

7) A expansão do aeroporto de Lisboa significa sempre maior tráfego rodoviário, ou seja, mais carros na Segunda Circular e zona circundante. A Segunda Circular e a cidade de Lisboa suportam mais trânsito?

8) A Câmara Municipal de Lisboa aprovou este mês uma proposta que exige ao Governo a divulgação dos planos de expansão do aeroporto de Lisboa e que compromete a Câmara a fazer os estudos necessários para avaliar os impactos da poluição e do ruído na saúde e ambiente da cidade. A primeira proposta partiu do Bloco de Esquerda, mas foi aprovada por todos os partidos, o que é um sinal de que Lisboa não deixará que o Governo prejudique a vida de quem aí vive.

9) Em 2020 Lisboa vai ser a Capital Verde da Europa. Alguém acredita neste galardão se os níveis de poluição e de ruído vão aumentar significativamente com a expansão do aeroporto? Para além disso, o aumento dos voos põe em causa o cumprimento das metas de emissões de gases com efeito de estufa (ver aqui). Com este plano, o Governo vira as costas ao combate à crise climática.

10) O ar de Lisboa já é considerado um dos piores da Europa. A Av. da Liberdade, que era uma das artérias mais poluídas da Europa, perdeu o pódio para o Parque das Nações, a Segunda Circular na zona de Telheiras e a Avenida Ribeira das Naus, no Cais do Sodré (ver aqui). Lisboa já é a sexta cidade europeia mais poluída pelos navios de cruzeiro (ver aqui). E a expansão do aeroporto da Portela só pode agravar ainda mais o problema.

Assim, e sendo verdade que o aeroporto de Lisboa atingiu o seu limite, não se resolve um erro com outro erro ainda maior. A sua expansão significa que o aeroporto se vai manter no centro da cidade nos próximos 50 anos, afetando o bem-estar e a saúde desta e das próximas duas gerações. É tempo de parar e pensar sobre o que se está a fazer aos lisboetas.