Permitam-me partilhar o meu orgulho enquanto cidadão e trabalhador por dois actos de civismo e amor à pólis e à República.

O primeiro para salientar os muitos cidadãos eleitores que deixaram o conforto das praias e dos convívios com familiares e amigos para votarem nas eleições autárquicas. Umas eleições que contrariaram o senso comum de que os incumbentes não são derrotáveis, pois que muitos dos autarcas em exercício foram copiosamente derrotados.

Foram derrotados o caciquismo, a arrogância e o senso de serem donos disto tudo, a tentação de personalizarem os recursos do Estado (nisso incluindo o dinheiro, mas também a dívida a ser contraída pelo PRR – Plano de Recuperação e Resiliência).

Estiveram bem, muito bem, os cidadãos que rejeitaram, nas vilas e cidades, uma após outra, o modelo mexicano de simbiose entre líderes partidários/partidos e o Estado. Os mesmos cidadãos que não são tolos e que revelaram no segredo da urna o que não tinham querido dizer às empresas de sondagens.

O segundo momento de orgulho, pela greve dos trabalhadores bancários do Banco Comercial Português e do Banco Santander Totta.

Um e outro com processos de despedimento colectivo que revelam uma forma impositiva de ver as relações sociais e de trabalho. Onde trabalhadores parecem ser apenas uma fonte de rendibilidade para o factor capital. Processos cuja intencionalidade, celeridade e modelo impositivo, perante o silêncio do primeiro-ministro, correm o risco de caucionar, se não contrariados, um modelo de empobrecimento e destruição da classe média.

Por isso, pela primeira vez em 33 anos, todos os sindicatos bancários decretaram greve. Porque a nenhum português serve a chacina das famílias e da classe média portuguesa.

Porque os cidadãos e os contribuintes portugueses estão fartos de uma sociedade que venera os vistos meramente especulativos para estrangeiros adquirirem uma residência fiscal, e que nada fazem pelo bem-estar dos seus congéneres.

Porque é toda uma classe que está ameaçada de extinção. Não apenas a dos bancários, mas a de todos os trabalhadores por conta de outrem em grandes empresas. Empresas estas que deveriam ter uma preocupação social genuína, e não mera propaganda, comprada com umas bolsas de estudo, umas iniciativas junto da sociedade civil e, pasme-se, prémios atrás de prémios de melhor empresa para trabalhar.

Sobre estes prémios, tudo percebemos pelo que fazia o alegado mago das telecomunicações (que supervisionou a destruição da empresa líder em Portugal e a sua entrega aos predadores sem rosto).

Porque uma empresa que despede, sem qualquer necessidade económica, financeira ou de mercado, não limpa sua reputação com iniciativas avulsas.

Por tudo isto, saudamos a classe trabalhadora bancária pela sua coragem e atitude. Pela recusa do unilateralismo. E pela promessa de prolongar pelo tempo, por muito tempo, o seu protesto.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.