E, de repente, o país acordou para o mesmo assunto de sempre como se fosse a primeira vez. Fascinante esta capacidade que recorrentemente revelamos de tornear um assunto com a mesma mestria com que um experimentado toureiro rodeia o touro mas sem, contudo e ao contrário do toureiro, enfrentarmos de frente o problema e o resolvermos.

Vem isto a propósito do estudo promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos sobre a sustentabilidade do sistema de pensões português e que, desde a primeira hora da sua mediatização, provocou reações em todos os quadrantes da política nacional. Isto apesar do seu coordenador, Amílcar Oliveira, ter tentado esclarecer que o estudo não se tratava de uma recomendação, mas sim de um exercício académico.

Do lado do CDS-PP, partido a que pertenço, a reação foi simples e coerente. Bastou-nos recordar as propostas chumbadas quando foram apresentadas na Assembleia da República em 2016, e que preconizavam a necessidade de um trabalho conjunto dos diferentes partidos no sentido de caminhar para um sistema similar ao inglês: o qual permitiria a cada um de nós saber, todos os anos, quais os descontos e quantias a receber, ao mesmo tempo que seria possível aderir a um complemento de reforma, com um sistema de capitalização das poupanças adicionais. Em linha, portanto, com as observações incluídas no estudo agora divulgado.

Entre as múltiplas reações, umas mais a quente do que outras, foi mais uma vez preocupante observar a forma como o ministro da Segurança Social logo surgiu, menorizando o que está em causa e descrevendo como inexistente um problema que é conhecido de todos e há anos alvo de debate. Insultar o resultado do trabalho dos investigadores do ICS, como ele o fez, classificando como “ideias ingénuas” cujo único objetivo é “abrir o mercado aos privados” – um cenário que resulta de um estudo aprofundado – é tentar tapar não o sol mas o buraco com uma peneira. Lamentavelmente, Vieira da Silva não foi o único a pautar o discurso com esta tónica do papão do setor privado e logo outras vozes à dele se juntaram. Ainda bem para o país que temos entidades, como esta Fundação, que se dedica a estudar e a dar eco a ensaios científicos com enorme credibilidade técnica.

No entanto, o cenário é claro. Assustador, mas evidente. A fragilidade da nossa economia demasiado dependente das condições externas, aliada à implosão demográfica e ao consequente envelhecimento da população portuguesa, obriga-nos a repensar todo o modelo de sustentabilidade da Segurança Social que nos habituámos a dar como adquirido. Ou melhor dizendo, mais do que a repensar, obriga-nos a (re)agir.

Com efeito, é agora, a curto prazo, que é indispensável efetuar e concluir o debate do qual dependem as gerações futuras. O modelo atual não é sustentável e este mais recente estudo não é senão mais uma entre as várias componentes de um mesmo diagnóstico. Saibamos pois, para bem de todos, parar de rodear os problemas cruciais que enfrentamos como país e começar a resolvê-los sem medo do diálogo e também do inevitável confronto de ideias e perspetivas. Antes de conseguirmos definir qual será no futuro próximo a idade da reforma, urge que façamos a reforma maior, a do sistema. Porque de uma dependem as outras. E do que fizermos ou não fizermos hoje, depende o amanhã.

Para todos os leitores, os meus votos de uma Santa Páscoa.

 

Muito recentemente, este jornal noticiou a classificação dada pela prestigiada agência Bloomberg ao pastel de nata português: um caso de sucesso internacional de marketing. A esse propósito, é sempre bom lembrar a forma como tantos dos que agora se regozijam escarneceram, na altura, a visão de Álvaro Santos Pereira. Para ele vão os meus cumprimentos pela previsão agora confirmada e elogiada.